Nicole Kidman: Ousada como nunca

Uma mulher de desafios assume uma das personagens mais audazes da sua longa carreira. Não se inibe de ultrapassar todos os limites. E destila sedução.

Nicole Kidman: Ousada como nunca
04 de março de 2013 às 07:25 Máxima

“Nicole Kidman como nunca vimos” soa a tirada vulgar e não expressa bem a dimensão da viagem trilhada em The Paperboy – Um Rapaz do Sul, ao lado do jovem Zac Efron, mas também de John Cusack e de Matthew McConaughey. No entanto, a expressão é bem mais verdadeira do que parece. É que no filme dirigido por Lee Daniels, o realizador do tão aclamado quanto doloroso Precious, a partir do romance de Pete Dexter, editado em 1995, Kidman rompe com todos os estereótipos para a mais desconcertante cena de insinuação sexual que já vimos no cinema, diante de um John Cusack atrás das grades e sem manifestar qualquer contacto físico. Mas há mais, pois no papel da algo vulgar Charlotte, na Florida de 1969, salvará ainda o pobre Zac Efron de um mal pior quando urina literalmente no seu rosto para o livrar das infeções de alforrecas...

Em Cannes, falámos com Nicole também a propósito do papel de Martha Gellhorn, a musa de Hemingway para a obra Por Quem os Sinos Dobram, adaptada para televisão por Philip Kaufman, em Hemingway & Gellhorn. Nicole Kidman é tudo isso. Uma força da natureza que garante uma predisposição total para abraçar a viagem até ao fim de uma personagem.

PUB

Bem diferente é o papel de mãe, que cumpre em Nashville ao lado do músico Keith Urban – isto quando se conjugam as agendas, é claro –, das meninas Sunday, de quatro anos, e Faith, de dois, bem como de Isabella, de 19, e Connor, de 17, estes dois últimos adotados durante o anterior casamento com Tom Cruise.

A verdade é que ao fim de 30 anos a fazer filmes, Nicole não deixou de abraçar os projetos mais arrojados. Aos 45 anos, continua a ser a mesma loira elegante, do alto do seu metro e 80. Bem mais pálida naquele início de tarde, em Cannes, do que no bronzeado carregado de Paperboy. Vencedora de um Óscar por As Horas (2002), receberia ainda outras duas nomeações. Nascida no Havai, cresceu em Sidney, na Austrália, mantendo, por isso mesmo, ambas as nacionalidades: americana e australiana. Filha de um psicólogo e de uma enfermeira, Nicole encontrou desde cedo a vontade de representar. Trabalhou em televisão e em cinema até que Tom Cruise reparou nela em Calma de Morte (1989), acabando por contracenar com ela no ano seguinte, em Dias de Tempestade, e pouco depois dariam início a um casamento de 10 anos.

"Quando interpreto uma personagem vou para um lugar muito secreto e íntimo."

Está muito mais pálida do que no filme...

PUB

[Risos] Sim, muito mais.

Tenho a certeza de que não foi apenas o sol de Nova Orleães que lhe deu o impressionante bronzeado que vemos no filme The Paperboy – Um Rapaz do Sul...

Não, houve também alguma maquilhagem. A minha pele é demasiado branca e eu jamais me exporia ao sol para ter uma cor assim. Nunca!

Concorda que este é o seu papel mais ousado de sempre? Pelo menos, faz aqui coisas que nunca vimos...

PUB

Bom, eu ainda não vi o filme.

Sabe ao que me refiro...

Quer dizer, provavelmente ficarei em choque quando vir o filme, não?

Talvez surpreendida com a sua ousadia. Isso significa que quando leu o guião não se apercebeu desses limites?

PUB

A questão é esta: quando interpreto uma personagem vou para um lugar muito secreto e íntimo. Aí existo de uma forma diferente, aí o medo não entra, apenas o desejo de contar a verdade da personagem. Encontrei-me com mulheres que têm ou tiveram os maridos na prisão e o que se vê neste filme se calhar não se aproxima sequer da realidade.

MAIS >>


O facto de ser um filme realizado por Lee Daniels preparou-a para uma disponibilidade maior?

PUB

Quando vi Precious (do mesmo realizador) fiquei impressionadíssima, pois o filme leva-nos a um lugar muito perturbador. Quando saí do filme não conseguia parar de chorar. Por isso, quando o Lee me ofereceu o papel em The Paperboy, eu sabia que não iria ser um passeio no parque.

Estava preparada para lhe dar tudo?

Estava preparada para lhe dar a verdade. Isso é uma parte importante deste filme. Nunca vi o monitor, nunca assisti aos planos filmados, não vi o filme. Apenas acredito no que fiz e confio no realizador.

Sentiu que este era o momento e o papel certo para a sua carreira?

PUB

Não penso em função da minha carreira – se calhar deveria fazê-lo, mas isso não tem a ver comigo. Não tenho um plano. Não faz parte da minha natureza.

Acha-se uma pessoa impulsiva?

Não sei, mas com ambos os maridos que tive casei-me logo dois meses depois de os conhecer.

Por instinto?

PUB

Sim. É assim que escolho os papéis que interpreto. Não penso demasiado nas consequências. Às vezes funciona, às vezes não, mas está de acordo com a minha natureza espontânea.

Disse que queria proteger a personagem. Como é que vê a Charlotte de The Paperboy?

É obviamente uma mulher magoada e frágil. Mas para proteger a sua fragilidade torna-se uma mulher muito forte. Tem um instinto maternal, combinado com humor de rua e com um espírito sexy inato. Pode ser algo muito próprio do final dos anos 60, que é quando se passa o filme, mas acho que também se passa hoje em dia.

"Com ambos os maridos que tive casei-me logo dois meses depois de os conhecer."

PUB

Porque acha que mulheres assim são atraídas por um certo tipo de homens?

Eu conheci cinco mulheres assim. Contaram-me histórias, algumas delas arrepiantes. Mas como sou uma pessoa que não faz juízos de valor, isso não me afeta.

A Nicole tem as cenas mais ousadas que já vi com o John Cusak quando o visita na prisão...

Oh meu Deus, lá vem o que estava à espera...

PUB

Como foi exibir-se para ele se satisfazer sexualmente?

Nós nunca nos encontrámos enquanto John e Nicole. Apenas o conheci na rodagem. Foi aí que decidi que apenas o iria conhecer enquanto personagem. Nunca falei com ele enquanto John.

A sério?

Sim. Para fazer este papel eu não poderia ter qualquer relacionamento social. Apenas nos conhecemos enquanto Charlotte e Hillary (a personagem de John Cusack). E rodámos esta cena de sexo logo no primeiro dia.

PUB

Porquê? O Lee Daniels não acredita em ensaios? Sentiu-se confortável a iniciar o filme assim?

Há alturas em que apenas pensamos em ir em frente. Eu pensei que seriam apenas três takes, mas pareceu que foram uns 100...

Com o Zac Efron acaba por ter uma cena igualmente explícita e sensual. Também foi assim?

Procurei manter o Zac sempre à distância e mantive-me sempre um pouco dentro da personagem. Mas foi diferente. O John é muito mais experiente...

PUB

O Zac tem uma aura de miúdo...

Olhe que não é assim tão miúdo... Felizmente, o Lee ensinou-me a ser esta mulher forte.

Segundo nos contou o Zac Efron, em entrevista, a Nicole era muito destemida. Dá-lhe razão?

Não. Na verdade, tive imenso medo. Mas acho que consegui vencê-lo.

PUB

MAIS >>


Como?

Por vezes, são outras pessoas que me incentivam, outras vezes sou eu própria. Nem sei como descrever. Quando me sinto aterrorizada imagino o pior que poderão pensar de mim. E se as pessoas não gostarem do que veem? O que posso fazer para me apaixonar? Penso então: “Farei tudo para me apaixonar.” Porque não? É assim que gosto dos meus filhos! É assim que gosto do meu marido! Se calhar, vai ser doloroso, mas o melhor é aceitar essa dor.

PUB

Não teve qualquer dúvida em avançar mesmo consciente das cenas explícitas...

Um pouco talvez, depois de me encontrar com as cinco mulheres. Não sabia se tinha aquilo que era necessário para tornar a cena real. Porque essa não é a minha vida. É verdade que tenho uma imaginação muito fértil e um poder enorme de me transformar noutra pessoa. Sempre o consegui fazer deste que era muito jovem.

O que a fez aceitar este papel de uma mulher um pouco vulgar e bizarra?

Procurava uma personagem crua. Também queria trabalhar com um realizador que conseguisse algo diferente de mim.

PUB

Teve de aumentar de peso para fazer o filme?

Um pouco, apenas para tornar o meu corpo mais voluptuoso.

O que achou do guarda-roupa do filme, dos anos 60?

Devo dizer que o meu gosto é um pouco diferente deste estilo do filme. Mas gosto do lado arrojado de como ela se veste.

PUB

Um dos seus projetos é para encarnar a Princesa Grace do Mónaco. Como se prepara para um papel assim?

Ainda não comecei. Mas estou muito interessada. Desde logo porque tem um guião maravilhoso. Não será um filme biográfico, pois apenas trata uma parte da vida dela.

Que parte?

Quando ela já está com o Rainier. É um conteúdo bastante político, devo dizer. Vai ser muito interessante fazer Grace of Monaco e estou com vontade de trabalhar com o Olivier [Dahan, o realizador].

PUB

"Quero ter uma vida apaixonada e monógama. É isso que procuro na minha vida. Quero criar crianças. Adoro-as."

O que acha desta mulher e atriz e da vida que teve?

Gosto muito dela. Quero honrar o trabalho e a vida de Grace Kelly.

Dizia-se que a Nicole Kidman iria incendiar Cannes. Não só por The Paperboy mas também pelo telefilme Hemingway & Gellhorn. Como reage a tudo isto?

PUB

Eu sabia que The Paperboy seria controverso. Mas pensei que a diversidade destes projetos interessasse às pessoas. Até porque para mim é importante poder experimentar coisas novas, algo que continuarei a fazer enquanto puder.

O que a distingue da sua personagem de Hemingway & Gellhorn?

Pelo menos, eu quero ter uma vida apaixonada e monógama. É isso que procuro na minha vida. Quero criar crianças. Adoro-as. 

Ainda tem tempo para seguir a carreira do seu marido?

PUB

Claro que sim. Depois de Grace of Monaco irei para a Austrália e estarei com ele.

Vive atualmente mais na Austrália?

Não, vivemos em Nashville, devido à sua carreira de músico country. É a sua paixão, por isso temos de estar em Nashville. Por mim, é ótimo, sinto-me feliz por poder estar perto dele.

1 de 6 / Nicole Kidman: Ousada como nunca
PUB
2 de 6 / 1999
3 de 6 / 2001
4 de 6 / 2002
PUB
5 de 6 / 2003
6 de 6 / 2008
PUB
PUB