José Pimentão, ator: "Não acredito em fórmulas ou receitas para a nossa profissão"
Reconhecido pelo seu talento e versatilidade, o ator retorna à Netflix com a série "Eric", de Abi Morgan. Em entrevista com a Máxima, revela os desafios de interpretar Sebastian, uma personagem complexa na Nova Iorque dos anos 80, e reflete sobre a sua carreira diversificada e crescimento artístico.
Foto: DR09 de julho de 2024 às 14:59 Safiya Ayoob / Com Rita Silva Avelar
José Pimentão continua a trilhar um caminho notável na indústria do entretenimento internacional. Depois de uma participação marcante na série 1899 - do realizador Baran bo Odar, o artista retorna à Netflix com a nova série Eric, criada por Abi Morgan. Nesta entrevista exclusiva à Máxima, o ator fala-nos sobre a sua experiência neste projeto inovador que mistura thriller e drama psicológico, revelando os desafios e aprendizagens ao interpretar Sebastian, uma personagem complexa inserida nas profundezas da Nova Iorque dos anos 80. Além de discutir o seu novo papel, José Pimentão reflete sobre a sua carreira diversificada, desde o teatro até à televisão, e como cada experiência contribuiu para o seu desenvolvimento como ator. Partilha também reflexões sobre a sua trajetória pessoal, as dificuldades enfrentadas e as suas aspirações futuras no mundo da representação, oferecendo uma visão intimista e inspiradora do seu percurso artístico.
Como foi a experiência de trabalhar em Eric, uma série que mistura o thriller com elementos de drama psicológico?Foi uma experiência particularmente enriquecedora porque nunca tinha integrado um projeto cujo guião tivesse estas características. A Abi Morgan é uma guionista ímpar - já no-lo tinha provado, por exemplo, no magnífico Shame, de Steve McQueen - e em Eric conseguiu introduzir muitos elementos que tornam a narrativa um pouco mais fresca e fora do comum, dando à série uma roupagem diferente da que estamos habituados em thrillers policiais. Por outro lado, a história aborda bastantes temas que me parecem francamente pertinentes e atuais, isto sem deslaçar a narrativa ou sobrecarregar o espectador.
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Podes falar-nos mais sobre o teu personagem, Sebastian, e o seu papel na história?O Sebastian é filho de imigrantes portugueses nos Estados Unidos, estuda espanhol - é aluno de Cassie - e trabalha numa organização de apoio aos sem-abrigo financiada pelo programa de marionetas de Vincent, Good Day Sunshine.Qual foi o maior desafio que encontraste ao interpretar Sebastian, especialmente considerando a complexidade emocional da série?O maior desafio consistiu na preparação da personagem, mais concretamente na questão do trabalho de apoio aos sem-abrigo. Nova Iorque tem há muitas décadas um problema particularmente sério de pessoas nesta situação, problema este que se agravou muito desde a pandemia da covid-19.Ao longo do processo estive em contacto com uma ONG que presta apoio a estas pessoas on-site, e apercebi-me que o que acontece na série acontece também, ainda hoje, na vida real. Foi particularmente chocante para mim perceber como, numa das cidades mais ricas e "desenvolvidas" do mundo, a vida humana pode valer tão pouco. É impossível não ficar revoltado com tanta hipocrisia e falta de dignidade, e julgo que isso está também muito presente na série.Como foi trabalhar ao lado de atores como Benedict Cumberbatch e Gaby Hoffmann?Apesar de serem duas pessoas com feitios e formas de trabalhar bastante diferentes, tratam-se de dois intérpretes extraordinários. É muito fácil trabalhar com alguém quando está tudo lá, até nas coisas mais simples. Não é preciso fazer muito, é só confiar e ir com eles.
Tens uma carreira diversificada, passando pelo teatro, cinema e televisão. Como é que essas diferentes formas de arte contribuíram para o teu desenvolvimento como atorOs processos de trabalho são muito distintos nessas três áreas, o que nos obriga a abordar os guiões e as personagens de formas também distintas, bem como a utilizar outro tipo de ferramentas no que diz respeito ao trabalho de ator. Acredito que quanto mais destreza e familiaridade formos ganhando com estes processos e ferramentas, maior a plasticidade que vamos conquistando enquanto intérpretes. Ficamos menos cristalizados, e conseguimos criar mais coisas diferentes.Em entrevistas anteriores, afirmaste que em 2013 decidiste focar-te na representação. Podes partilhar um pouco mais sobre o que te levou a essa decisão e como foi essa transição?Eu tinha tirado um curso de Gestão, trabalhava numa multinacional e era profundamente infeliz. Sabia que tinha que fazer alguma coisa em relação a isso, ou o preço a pagar mais tarde seria demasiado alto, e como para mim não havia alternativa acabou por ser como que uma não-decisão. A transição foi complicada porque comecei a estudar à noite, e durante o dia tinha que acumular dois part-times sem folgas para poder pagar as contas. Mas à medida que as coisas foram avançando apercebi-me que, quanto mais queremos uma coisa, mais os sacrifícios que fazemos por ela, ainda que custem, acabam por valer a pena.
A tua participação em 1899 foi uma grande oportunidade internacional. Como foi essa experiência e de que forma te preparou para futuros projetos como "Eric"?Integrar 1899 foi dos projetos que mais me desenvolveu como intérprete porque a personagem me permitiu ir a sítios onde nunca tinha ido. O Ramiro era uma personagem bastante rica de um ponto de vista de percurso emocional, e a componente de ação que a série tinha permitiu-me ver e fazer coisas que nunca tinha visto ou feito. Também o facto de ter sido uma rodagem longa contribuiu para a aquisição de mais experiência, e também de uma certa resistência, tanto física quanto emocional. Preparou-me bem para Eric mas não só, julgo que a experiência que adquirimos em cada projeto é absolutamente transversal e contribui para todos os projetos futuros que venhamos a fazer.
Participaste em várias curtas-metragens e séries de televisão portuguesas. Há algum projeto que consideres particularmente marcante ou transformador na tua carreira?Al Berto, de Vicente Alves do Ó, a primeira longa-metragem em que participei, foi um projeto especialmente marcante e transformador pela personagem que interpretei e pela história que contámos naquele momento particular da minha vida. Destaco ainda dois projetos que filmei mais recentemente - encontram-se de momento na sala de montagem - mas que conquistaram imediatamente um lugar especial em mim: Projecto Global, do realizador Ivo M. Ferreira, talvez o mais desafiante da minha carreira; e Amanhã Já Não Chove, a primeira longa de Bernardo Lopes, cujo próximo filme será uma obra particularmente bonita e tocante.Tens algum conselho para atores portugueses que ambicionam seguir uma carreira internacional?Não me sinto no direito de dar conselhos a ninguém, porque aquilo que é importante para alguém ou que leva alguém a seguir determinado caminho é, necessariamente, diferente de pessoa para pessoa. As coisas comigo aconteceram de uma determinada forma, posso partilhar o meu caminho, mas sinceramente não acredito em fórmulas ou receitas para a nossa profissão.
Sentiste que a transição do mundo artístico português para o internacional fosse algo difícil de atingir?Construir uma carreira internacional não era o meu objetivo principal, não era aí que concentrava os meus esforços. As coisas comigo aconteceram até um pouco por acaso. Acho que o mais difícil é ter acesso aos castings para os projetos que se fazem lá fora, e eu tive a sorte de a equipa de casting de 1899 ter vindo a Portugal procurar um actor português. O nosso país e os seus intérpretes estão cada vez mais no mapa da indústria cinematográfica e audiovisual internacional. É cada vez mais comum procurarem-se atores ou atrizes portugueses para integrar projetos noutros países. Julgo que este tipo de situações tenderá a acontecer com mais frequência e que, por isso, esta transição será um pouco mais fácil e natural no futuro.
Não é de mentira afirmar que o mundo de representação em Portugal é muito desvalorizado, tendo vários atores saído para fora para conseguirem ter mais oportunidades, foi sempre algo que ambicionaste? O "sair para fora"?Como referi anteriormente, não era aí que o meu foco se encontrava. Acho que a maioria dos intérpretes e criadores ambiciona abrir o seu trabalho a outros horizontes, mas os meus esforços sempre se concentraram mais em trabalhar em projetos com os quais me identifico do que propriamente em trabalhar aqui ou ali. Se me identificar com as oportunidades que surgirem tudo farei para as abraçar, seja onde ou com quem for.
Podes partilhar conosco alguns dos teus próximos projetos ou ambições futuras na área da representação?De momento ambiciono apenas ter a sorte de poder trabalhar com pessoas que me inspirem, integrando projectos com os quais me identifique. Quem sabe pisar outros terrenos como a realização ou a encenação, a escrita, a direção de atores… Mas cada coisa a seu tempo e sem forçar nada que não surja de um impulso criativo natural e verdadeiro.
O que te motiva diariamente a continuar na indústria do entretenimento, especialmente enfrentando os desafios que ela apresenta?Poder trabalhar na criação de obras significativas que tenham um impacto real nas pessoas, que de alguma forma as toque, emocione, faça refletir e ajude a atravessar a vida de uma forma mais bonita e tranquila.
Dona de uma beleza reforçada pela autoconfiança e de um talento que cresce com a força do trabalho, Maria João Bastos está de volta à produção nacional com a novela Na Corda Bamba, que estreou no passado mês de setembro, e a série A Espia, ainda em data a definir. Encontrámos uma atriz, que conta já com quase três décadas de carreira, assumidamente realizada mas numa constante descoberta do mundo e de si própria.