Chef Nuno Mendes regressa a Lisboa para cozinhar dentro de um convento

O Santa Joana é um dos nove formatos gastronómicos inseridos no antigo convento na rua de de Santa Marta. Fomos conhecer os pratos imaginados pelo chef português que passou alguns anos em Londres.

Foto: Francisco Nogueira
12 de dezembro de 2024 às 13:18 Rita Silva Avelar

Há poucos edifícios tão imponentes como o do renovado Locke de Santa Joana, erguido das ruínas de um antigo convento do século XVII, entre as ruas Camilo Castelo Branco e Santa Marta, ali junto ao Marquês de Pombal e a Avenida da Liberdade. Ao todo, a ambiciosa renovação consiste agora em nove pisos inseridos em quatro blocos distintos, com 370 unidades de alojamento, espaços públicos interiores e exteriores para reuniões e eventos, uma sala de cowork, um ginásio e uma galeria arqueológica, e ainda um pateo e uma piscina exterior. Tudo isto comunica e se complementa, pensado ao detalhe.

Foto: Hugo Nogueira
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Precisamente na restauração, o hotel estabeleceu desde início uma parceria com a White Rabbit Projects (especialista em hospitalidade e restauração fundada pelo antigo diretor comercial da Soho House, Chris Miller). Ao todo são nove espaços de restauração, do Pool Bar aos bares de cocktails e vinil, distribuidos pelos vários cantos do Locke Santa Joana. Entramos pela rua de Santa Marta, dá acesso direto ao restaurante Santa Joana, o principal, onde o chef Nuno Mendes está há umas boas horas a coordenar a cozinha, aberta deste o verão.

Foto: Luís Moreira

Com ele, estão Mauricio Varela (que passou pelos Wines by Heart, Matte e Dahlia) como head chef e Maria Ramos (que vem do Bairro Alto Hotel) como chef de pastelaria. A tradição respeita-se dentro destas paredes históricas. A cargo do conceituado estúdio de design Lázaro Rosa-Violán, o projeto de interiores salvaguarda a imponência do sítio, tornando-o tanto clássico como algo exótico. A luz é baixa, está estrategicamente distribuida, somos levados para um cenário algo misterioso e empolgante. Há tanto encontros românticos como jantares de Natal, mas o ruído é suave e quase imperceptível.

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Foto: Hugo Nogueira

A privacidade é respeitada. Vale a pena subir ao piso de cima, onde também ficam as casas de banho, só para contemplar a vista que se tem de cima: ao fundo, o The Raw Bar, de onde saem grande parte das propostas de marisco e frescos da carta (o trio de ostras da Ria de Aveiro, da Ria Formosa e do Sado!), mas também a arte têxtil de Carolina Vaz (que desenvolveu duas tapeçarias), do estúdio Grauº Cerâmica (que criou diversas peças inspiradas pela história do edifício e nas descobertas arqueológicas), e de Tatiana Ferreira, do estúdio Pareidólia, com peças baseadas na mesma inspiração: clássico e contemporâneo em coexistência.

Foto: Francisco Nogueira
Foto: Charlie Mckay

Da carta, cuidadosamente pensada pelo chef para "nos divertirmos", como nos conta, saem propostas muito inspiradas naquilo que é o core da cozinha tradicional portuguesa. Melhores exemplos são os audazes corações de galinha grelhados com molho de pica-pau ou a panisse de grão-de-bico, chouriço de porco fumado e pickles - ambos na secção dos acepipes - ou ainda os mexilhões de Sagres fumados com batata nova assada e molho de alho verde e a açorda de cogumelos selvagens e abóbora assada, nas entradas (entre os €11 e os €15). Vale a pena provar o couvert só para provar a manteiga e o azeite que acompanham o estaladiço pão feito nas cozinhas.

Foto: Francisco Nogueira
Foto: Charlie Mckay

Como o chef confirma, os produtos são o mais locais possíveis e frescos, baseando-se numa lógica de sazonalidade que cada vez mais as cozinhas adotam. Nos pratos principais, a presa de porco alentejano com pasta de nozes estufadas, nabos e grelos marinados e assados está a par do entrecôte maturado, couve toscana ao vapor e caramelo de alho negro e cogumelos, nas carnes, e no peixe há pescada escalfada, molho de manteiga fumada, funcho assado e pregado na chapa, emulsão de algas frescas e batata esmagada (entre os €17 e os €36).

Foto: Charlie Mckay
Foto: Charlie Mckay

Há várias propostas de partilha - como robalo grelhado, servido com caldo à bulhão pato, alliums tostados ou arroz de marisco caldoso, caranguejo e lavagante nacional - na carta, se a lógica é provar o maior número de pratos possível. Nuno Mendes, que em 2022, após a pandemia, abriu o Lisboeta, uma homenagem à sua cidade natal e, em 2023, o Cozinha das Flores, no Porto, sempre foi exemplo daquilo que é a melhor fusão entre a tradição e a cozinha moderna, e aqui continua a mostrar os seus trunfos, desta feita na capital. Nas sobremesas, provámos uma deliciosa mousse com flor de sal e gelado de leite e chantilly, mas também há papos de anjo, pão de ló de matcha, arroz doce ou ananás dos Açores (entre os €9 e os €16 à unidade).

Onde? Rua de Santa Marta, 61. Quando? Todos os dias das 12:00 às 23:00, exceto segunda e terça, apenas ao jantar. Reservas +351 211 555 582

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