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Rita Nabeiro: “É preciso ter humildade, rodearmo-nos de pessoas que sabem mais do que nós”

A Diretora-Geral da Adega Mayor e responsável pelas áreas de sustentabilidade e recursos humanos do Grupo Nabeiro acaba de ser distinguida com o prémio da ANJE: Prémio Mulher Empreendedora. Conversámos com ela em Lisboa sobre liderança, valores de família e ambições para o futuro.

Foto: Bruno Colaço / Cofina Media
18 de novembro de 2022 Rita Silva Avelar

Todos os anos a Associação Nacional de Jovens Empresários (ANJE) distingue as personalidades que mais se destacaram em matéria de empreendedorismo. Este ano, e inaugurando uma nova categoria, Rita Nabeiro recebe o Prémio Mulher Empreendedora, uma estreia absoluta. Neta de Rui Nabeiro, CEO do Grupo Nabeiro, onde se incluem a Delta Cafés e a Adega Mayor, Rita está à frente de pelouros que exigem responsabilidade maior dentro do negócio e faz parte do painel da administração da empresa.

À Máxima, fala com assertividade sobre as mudanças que estão em curso dentro do grupo, sem esconder entusiasmo nem que tenciona manter um dos príncípios do avô: a humanização. Formada em Design de Comunicação, rapidamente percebeu que tinha o pulso de Rui Nabeiro para a liderença. Encontramo-nos com ela em Lisboa, num dos centros de operação do Grupo Nabeiro, para uma conversa de balanços, heranças e visões do que aí vem. 

Rita Nabeiro, administradora do Grupo Nabeiro.
Rita Nabeiro, administradora do Grupo Nabeiro. Foto: Bruno Colaço / Cofina Media

A Rita ocupa um cargo de liderança nesta empresa. Como é um dia na sua vida?

Mantenho a minha posição de CEO, e dentro do grupo Nabeiro estou com toda a área dos vinhos, mas este ano houve uma reestruturação e cada um ficou com áreas de responsabilidade dentro dos vários pelouros da administração. Eu fiquei com a área dos vinhos, mas também com as áreas de sustentabilidade e de recursos humanos. A minha vida mudou um pouco, mas posso dizer que nunca tenho dois dias iguais. Tento manter algumas rotinas, gosto de começar o dia com exercício físico, é o meu momento. Dependendo dos dias, tenho reuniões agendadas, mas cada vez mais o meu trabalho passa por criar pontes com o exterior. Estou numa procura de conhecimento constante. Estou numa fase de reinvenção, importantíssima para cada um de nós. Não há um dia igual ao outro, gosto da diversidade. Há pelo menos um ou dois dias no ano em que estou em Campo Maior, onde está o coração da empresa. Sendo uma empresa familiar, há um dois em um, é preciso estabelecer bem as pontes.

Que valores importam, quando se tem um património como o da família Nabeiro? A humanização da gestão, como lhe chama, está muito presente no vosso léxico.

As pessoas são o coração de uma empresa, mas também estamos a viver um período transformacional, a pandemia submeteu-nos a desafios, acelerou a transformação digital, e o contexto social e económico também contribuiu para desafios acrescidos. Não nos preocupamos apenas com a progressão de carreira, como também com o bem-estar físico e emocional das pessoas, obviamente financeiro, também. Gostamos de pensar que as pessoas estão a trabalhar numa empresa em que se revêem, que as trata bem, e que conseguimos extrair o melhor de parte a parte. Fala-se muito do quiet quitting, da grande resignação, sobretudo depois da pandemia, por isso mais do que nunca precisamos de estar atentos e integrar um conjunto de ferramentas para a liderança (...), queremos reter talento, potenciar ainda mais o crescimento das pessoas profissional e pessoalmente. Temos uma diversidade de profissões e geografias dentro do grupo, hoje em dia são mais de 3500 pessoas. 

Rita estudou Design de Comunicação, e sempre gostou de Arquitetura.
Rita estudou Design de Comunicação, e sempre gostou de Arquitetura. Foto: Bruno Colaço / Cofina Media

Falemos de vinhos, já que um dos pelouros da Rita é a sustentabilidade, e a grande novidade são dois biológicos. Que direção quer tomar a Adega Mayor? Querem posicionar-se num segmento mais premium?

Para termos um vinho biológico, ou começamos do zero ou a reconversão de uma vinha leva pelo menos quatro anos. Já temos uma parte da vinha reconvertida, que deu origem a este vinho que estamos a lançar, mas a nossa abordagem sustentável está presente na empresa de uma maneira muito holística, nunca esquecendo, por isso,  sustentabilidade económica. Para tal, as componentes social e ambiental têm de estar sólidas. Das funções no campo, agrícolas, até aos escritórios. Em 2015, integrámos o projeto de sustentabilidade dos vinhos do Alentejo, fomos uma das primeiras marcas a fazê-lo e tem sido uma jornada. Culminou este ano com uma certificação deste programa. Começamos com coisas simples, como a transformação energética, depois  redução da pegada hídrica, passámos para a restauração dos ecossistemas… Sentimos um impacto direto das alterações climáticas, também. Temos de trabalhar com e para a natureza e, claro, não se fazem bons vinhos com más uvas. É um setor mais tradicional, mas estamos em constante reinvenção há 15 anos. A nossa adega acrescenta valor à região, tornou-se um ícone por ser desenhada por Siza Vieira, por exemplo. 

Do avô herdou o espírito empreendedora, o sentido de responsabilidade para com as pessoas e a capacidade de inovar.
Do avô herdou o espírito empreendedora, o sentido de responsabilidade para com as pessoas e a capacidade de inovar. Foto: Bruno Colaço / Cofina Media

É curioso que se tenha formado em Design de Comunicação, tendo acabado por ir dar à área dos vinhos dentro da empresa. Como se deu esse acaso?

Ao início nao estava a trabalhar com a minha família, mas o trigger foi que, quando decidi o que estudar, quis estudar Arquitetura, mas não se concretizou. Gostei de Design de Comunicação… E quando este projeto surgiu (o dos vinhos) atraiu-me logo saber que Siza Vieira tinha tido mão na adega. Acabei por propor uma identidade visual à marca Adega Mayor. Tudo começa por aí, como uma externa à empresa (risos). Acabei por entrar no negócio, primeiro no departamento de Marketing da Delta. Fui criando, aprendendo, adicionando equipa…nada se faz sozinho. Tive a sorte - mas a sorte também a fazemos nós - de me conseguir fazer rodear de excelentes profissionais. Devo tudo isso à equipa. 

Que referências de liderança absorveu do seu avô? O que mais admira nele?

Há uma ou duas palavras que o definem. A atitude é uma palavra que ele emprega muito, sobre sermos empreendedores, sobre não nos resignarmos, sobre o impacto que temos na sociedade. Não deixar por fazer, não arrastar, mesmo que nada tenha a ver com o negócio. Depois, escolheria a palavra humildade: é muito difícil, quando se trilha um caminho de sucesso, quando se tem tantas distinções, se tem tanto reconhecimento, quando se passa de uma situação de poucos recursos para um império (eu não gosto de usar a palavra), conseguir manter os pés bem assentes na terra. É preciso humildade para entender que não sabemos tudo, precisamos de nos rodear de pessoas que sabem mais do que nós, e sobretudo para escutar com os outros. Não podemos deixar que o ego nos transforme em algo que de algum modo nos tolda o juízo, que nos pode desviar do caminho que nos fez dar os primeiros passos. Temos uma frase no grupo que é "na origem encontramos o futuro". Uma outra palavra é disponibilidade: é incrível, é uma qualidade dos grandes líderes. Mesmo com muitos afazeres e solicitações, conseguir ter tempo para escutar, estar e aconselhar. É isso que um líder deve fazer. Ao fim do dia, também é isso que nos inspira. 

Receber um prémio de liderança fe

Rita divide-se entre a sustentabilidade, os recursos humanos e o projeto Adega Mayor.
Rita divide-se entre a sustentabilidade, os recursos humanos e o projeto Adega Mayor. Foto: Bruno Colaço / Cofina Media

minina está em linha com outra coisa maior: mais mulheres em cargos de liderança. Por se mover num mundo tão masculino, alguma vez sentiu que isso limitasse o seu crescimento profissional?

Nos últimos 15 anos, senti que houve uma grande evolução. Passou, de facto, a ser um universo menos masculino, hoje em dia há mais mulheres em diversas funções, da comunicação à enologia, até à componente agrícola e às áreas comerciais. Nunca impus uma barreira na minha cabeça pelo facto de ser mulher: acho que as barreiras somos nós que as auto-impomos. Podemos mover-nos em ambientes mais masculinos… Quando ainda nem tinha 30 anos, e vinha de uma indústria criativa e passo para uma indústria que ainda tem um peso histórico, um lado mais clássico, e sendo eu mulher, aproveitei esses dois fatores mais disruptivos [ser nova, mulher, entrar num mundo novo]. Sempre fui tentando aprender com quem já estava no setor, isso, mais a curiosidade, a simplicidade e um sorriso fui criando alianças, tracei um caminho numa lógica mais colaborativa do que competitiva.

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