Os conselhos de uma head-hunter para o sucesso
“Ter sorte dá muito trabalho!” Quem o diz é Maria da Glória Ribeiro, especialista em liderança e gestão de carreiras, que explica à Máxima o que é preciso fazer para atingir o sucesso profissional (e a concretização pessoal).

"Não vale a pena esperarmos que algo nos aconteça. Não nos esqueçamos de que ter sorte dá muito trabalho…" É a convicção, que também partilhamos, de Maria da Glória Ribeiro, especialista* em liderança e gestão de carreiras. Primeiro, é necessário definir objetivos e depois há que avaliar os meios e os talentos que temos e, claro, o contexto que nos rodeia. Estes são os primeiros passos para assumirmos o lugar de piloto na trajetória da vida profissional. A head hunter portuguesa confirma-nos que a sorte não é arbitrária, pois "resulta da procura persistente e de esforço pessoal".
A sorte cai-nos no colo ou temos de a procurar?

Felizmente, tem-se encontrado, nos últimos tempos, uma insistente comunicação sobre o facto de a sorte não ser um fenómeno de achamento arbitrário, mas, pelo contrário, algo que resulta da procura persistente e de esforço pessoal. A sorte não é uma questão do acaso e nada tem a ver com os acontecimentos fortuitos. Cabe a cada um de nós criar condições para que a sorte se encontre connosco.
E como e onde é que se procura?
Seja qual for a fase em que nos encontramos e o percurso que já percorremos, tudo pode valer a pena corrigir e otimizar. As recentes teorias de aprendizagem assentam, sistematicamente, em conceitos de processo contínuo de assimilação e consolidação de conhecimentos. Nesta era de mudanças tecnológicas, civilizacionais e de conhecimento, não há mais espaço para podermos imaginar parar o processo de aprendizagem. A mudança é fluida, imiscui-se e embrenha-se em todas as áreas da vida e do trabalho.

E quais são as principais dúvidas ou obstáculos que as pessoas lhe colocam?
Decidir é difícil. Tomar uma decisão significa preferir e rejeitar, em simultâneo. Algumas pessoas não encontram coragem para o ato de tomar uma decisão, isto é, de decidir e, inevitavelmente, rejeitar. É mais fácil ficar no "limbo", deixar que os outros ou o decorrer do tempo decidam por nós. Sentenciar, deliberar, determinar e resolver… são tudo ações que exigem um ato de coragem e a capacidade de correr riscos, o risco de errar na tomada de decisões. Temos medo de enfrentar o desconhecido. Preferimos ficar na nossa zona de conforto. Não gostamos de correr riscos, de aceitar a probabilidade de termos de aprender, de nos expormos perante os outros sem a nossa imagem já formatada a que nos habituamos.
As estratégias para construir uma carreira profissional deviam aprender-se na escola e de pequeno ou é a experiência que nos dá as ferramentas?

Estratégia é a forma de pensar no futuro, integrada no processo decisório, com base num procedimento formalizado e articulador de resultados. Pode parecer uma definição algo elaborada, mas, na prática, implica que tenhamos visão, meios, decisões e atitudes certas para chegar onde queremos. Ser estratégico é tomar o conjunto de decisões estratégicas e ações táticas relativas à escolha dos meios e à articulação de recursos com vista a atingir um objetivo. São estes os pressupostos que temos de seguir para termos uma existência controlada por nós próprios e determinada pela nossa vontade que se possa repercutir no futuro de acordo com o que desejamos. Relativamente às estratégias, há uma resposta para cada pessoa. Depende de termos ainda muito tempo à nossa frente ou não; depende das nossas capacidades e de quão longe nos sentimos do nosso objetivo; e, sobretudo, depende da nossa individualidade. Por isso não há exemplos a dar, como se de receitas se tratasse. Tudo depende da fase em que estamos no nosso percurso, das ferramentas que temos (talento, preparação universitária e profissional) e da capacidade e vontade de aprendizagem e de mudança.
A ideia de que temos de procurar a nossa sorte parece intuitiva, mas talvez na prática não seja. Porque é que é preciso dar formação às pessoas, neste sentido?
Se fizermos um exercício comparativo de correlação entre a sorte criada e a capacidade de iniciativa, criatividade, esforço, engenho, sentido de oportunidade e argúcia, encontraremos a chave do sucesso. Mas claro, antes de mais, temos de saber para onde queremos ir, o que queremos atingir, que meios temos ao nosso alcance e como podemos melhorar. Só a partir daí poderemos elaborar um plano de ação e melhorar aquilo que sabemos que é insuficiente para a concretização dos nossos objetivos como pessoas, seres sociais e profissionais. Ou seja, não podemos simplesmente deixar que a vida nos leve. Penso que a esmagadora maioria das pessoas não decide ser como uma pena ao sabor do vento, isto é, deixar-se levar pelas circunstâncias e sem autodeterminação. Acredito, isso sim, que existe alguma falta de conhecimento, de discernimento e de capacidade para se ser determinado e resistente. Nestes casos é importante a existência de um programa de coaching que possa ajudar as pessoas a tomar controlo do seu futuro, a identificar os seus valores e competências e a alinhá-los com os seus interesses e o contexto para criar a situação ideal, tanto a nível profissional como pessoal.

Estar no trabalho errado pode ser confundido com falta de ambição ou interesse. Quando é que uma pessoa percebe que é altura de mudar de profissão ou de rumo?
Quando surge o sentimento de frustração e de incompatibilidade, há que mudar. É, sem dúvida, a decisão mais adequada. Pode haver vários exemplos deste género, completamente extrínsecos ao nosso controlo e que passo a citar. Há um sentimento de dicotomia entre os nossos ideais de sociedade e de vida, que se incompatibilizam com o desiderato, com o objeto ou missão da organização ou empresa onde estamos; há na organização a que pertencemos pessoas que nos perturbam fortemente. Pode ser um chefe (ou outro, hierarquicamente superior, par ou inferior) com quem não nos identificamos, com quem entramos em conflito, expresso ou omisso, de forma mais ou menos permanente; estamos muito bem na organização, mas queremos mais. Sentimos que poderemos avançar de uma maneira melhor, ou simplesmente mais rápida; gostávamos de pertencer a uma empresa maior, com mais exposição ou notoriedade. Ou, pelo contrário, parece-nos mais adequado para o nosso bem-estar e realização estarmos numa organização mais pequena, onde a dimensão particular é mais focada, onde em regra pode haver espaço para a relação emocional que nos falta, mesmo profissionalmente. Estes são apenas alguns dos casos que aparecem com frequência. Há e podem surgir um sem-número de razões para termos de tentar mudar.
Como se deve gerir a proporção coração/razão, na altura de tomar decisões?
Determinação, resiliência e automotivação são, provavelmente, as melhores ferramentas do nosso "Eu" para conseguirmos chegar à meta que traçámos para a nossa vida. Através da minha experiência profissional, constato que, quanto maior é a capacidade de integração humana e social, tanto mais provável será a capacidade de tomar decisões individuais, autênticas e em conformidade com a própria consciência. O essencial é pensarmos por nós próprios. Não podemos esquecer as circunstâncias que nos envolvem, mas respeitemos a nossa individualidade. Prepararmo-nos para sermos capazes de decidir é aprender a enfrentar a insegurança do desconhecido. É ser capaz de correr o risco da escolha, da tomada de decisão. É ser capaz de desbravar o tempo, de enfrentar o desconhecido.
E os portugueses? Continuamos a ter a mentalidade de aceitar o fado, a sorte que acontece na vida ou as novas gerações têm uma nova visão?
Não vale a pena esperarmos que algo nos aconteça. Não nos esqueçamos de que ter sorte dá muito trabalho… A sorte, quando a encontramos, é o resultado de uma procura resiliente e audaz para a encontrar. A boa sorte deve ser criada, ela depende, em larga medida, de nós mesmos. É preciso preparar as condições para que as oportunidades surjam. O fatalismo, o destino, a ausência de sorte são conceitos inaceitáveis para quem procura ser melhor e preparar-se para a realização pessoal. É frequente ouvir-se "Eu sempre fui assim" e parece estar subentendido "Portanto, não há nada a fazer". Esta atitude fatalista destrói qualquer dinâmica de melhoramento. Inventamos formas mais ou menos conscientes de nos livrarmos da dificuldade. Criamos justificações para a inércia ou para adiar ad aeternum a ação. Até que a oportunidade se perde.
É possível fazer o pleno, ser-se bem-sucedido pessoal e profissionalmente?
Para muitos, esta é uma tarefa muito complicada. É frequente conhecer pessoas em cujas histórias de vida o insucesso está muito associado à incapacidade de conjugarem as várias dimensões da vida. Não parecem ser capazes de conciliar, em simultâneo, a pressão e o foco da vida profissional com os momentos desejáveis e equilibrados de lazer necessário. Pior ainda é o caso dos que não coordenam o tempo, a energia e a força anímica entre os compromissos profissionais e os familiares ou de outra ordem. Mas há outras circunstâncias que podem ser desafiantes de conciliar, embora com intensidade e importância diferentes, como é o caso das atividades desportivas ou artísticas, pertencer a tertúlias ou outras agregações de grupo ou um sem-número de outros interesses e tarefas que nos complementam e preenchem. Não conheço a receita certa para o fazer. Cada um tem de encontrar o seu próprio equilíbrio em função das suas capacidades. O meu conselho expresso é que não se devem seguir conceitos preconcebidos, sejam eles quais forem, apenas porque a maioria das pessoas pensa dessa forma, como se de uma moda se tratasse.
Qual a diferença entre ser bem-sucedido e ser uma pessoa com sucesso?
O sucesso é o ato de atingir a Felicidade. A nossa própria felicidade, individual, autêntica, única, porque cada um de nós é diferenciado. Quando aproveitamos recursos e temos vontade podemos criar o nosso próprio sucesso. Mas, como sempre acontece na execução de qualquer tarefa, há que fazer um plano de ação.
*É fundadora e managing partner, em Portugal, da multinacional de executive search Amrop. É autora do livro Eu Sou o Meu Maior Projecto (Manuscrito, 2016).
