Mistyca: a magia da bailarina Misty Copeland
Ver Misty Copeland dançar é hipnotizante. Mas conhecer a sua história de vida é inspirador. Contra todas as probabilidades, uma jovem miscigenada norte-americana e de origens muito humildes chegou ao topo da carreira de bailarina e quebrou uma série de tabus com talento e determinação.
No dia em que, há cinco anos, se tornou a primeira afro-americana a ser bailarina principal no American Ballet Theatre (ABT), uma companhia de referência, Misty Copeland (Kansas City, Missouri, 1982) revelou o melhor conselho que já recebeu: "Sê tu própria porque não podes ser mais ninguém." No ano anterior tinha lançado um livro com a sua história de vida e cujo título dizia tudo – Life in Motion: An Unlikely Ballerina* (Simon & Schuster), escrito em parceria com a premiada jornalista Charisse Jones. Nessa altura, Misty era já solista no ABT e a terceira afro-americana com essa posição na história da instituição. Depois de uma infância instável, Misty estava a viver em Los Angeles num quarto de motel com a mãe e com os cinco irmãos quando começou a ter aulas de dança através do The Boys and Girls Club of America, uma organização que fornece programas extracurriculares para os jovens.
Segundo a própria, estava a viver a pior altura da sua infância quando descobriu o ballet aos 13 anos, uma idade já tardia para quem começa a praticar dança. Misty confessa que inicialmente tinha receio de estar nas aulas, mas quando se olhava ao espelho sentia-se poderosa e o facto de ter uma professora que acreditava nela foi o que mais a motivou. A dança tornou-se a forma de comunicação que lhe faltava na vida e, em apenas quatro anos, foi aceite numa academia de ballet de topo: o American Ballet Theatre, em 2000. Ao longo da carreira foram-lhe apontadas as mais variadas adversidades: ser "negra", ser muito musculada, ser baixa, ter o busto muito grande… E todas elas se tornaram o combustível para querer ser melhor e alargar o restrito ideal de beleza do ballet clássico.

Misty Copeland, com o seu talento e carisma, conquistou um lugar único na dança, o respeito da crítica e o carinho do público. O The New York Times rotulou-a como "A mais famosa bailarina dos Estados Unidos" e, em 2015, a Time considerou-a umas das 100 pessoas mais influentes, dedicando-lhe uma capa. Mas enquanto nos palcos Copeland dançava para uma plateia restrita, no anúncio da marca desportiva Under Armour, que protagonizou em 2014, todos a podiam ver dançar na televisão. O vídeo tornou-se viral no YouTube e a cultura popular abraçou-a. Fez várias participações numa tour de Prince, ao longo de quatro anos, dançou durante a atuação de Taylor Swift nos American Music Awards, em novembro de 2019, no número de encerramento dos Grammys, em janeiro de 2020, e teve o papel de Princesa Bailarina criado para ela no filme O Quebra-Nozes e os Quatro Reinos (Estúdios Disney), de 2018. Nos próximos meses, Misty vai interpretar Julieta em Romeu e Julieta (em maio), Jane Eyre na peça com o mesmo nome (em junho) e Odette e Odile no Lago dos Cisnes (em julho), tudo na Metropolitan Opera House, em Nova Iorque. Mas porque vê-la dançar ao vivo é um privilégio que não está ao alcance de todos, a sua história inspiradora e os seus movimentos poéticos já estão eternizados, além da biografia referida ao início, no documentário A Ballerina’s Tale, de 2015, e no livro de imagens Misty Copeland (Rizzoli). Para este último, o fotógrafo Gregg Delman lançou à bailarina o desafio de a fotografar. A agente da bailarina respondeu-lhe que Copeland tinha apreciado o trabalho dele, mas que só estaria disponível num único dia e a uma hora específica. Delman reagendou toda a sua vida profissional para não perder a oportunidade e, mais tarde, ao longo de sete ou de oito sessões, a bailarina dançou ao ritmo dos flashes. Quando o livro com 95 fotografias a cores foi lançado, em setembro de 2016, já Misty Copeland era um ícone. Gregg Delman falou à Máxima sobre este projeto especial.
Quando e como conheceu Misty Copeland?
Eu vi-a, pela primeira vez, numa revista e quis imediatamente fotografá-la, em 2011. Conhecemo-nos na nossa primeira sessão fotográfica alguns meses mais tarde…

O que o fez ter a ideia deste livro?
Quando colaborei com a Misty, pela primeira vez, ela ainda não tinha rompido para o mainstream. As fotografias que fizemos foram para nossa exploração artística, nada mais. Mas enquanto continuei a fotografá-la, ela tornou-se um nome conhecido e a imagem dela começou a ter muita procura. Eu creio que depois da quinta ou da sexta sessão que fizemos é que me apercebi do que estava a fazer.
A Misty Copeland tem uma figura e uma personalidade carismáticas. Qual foi o conceito por detrás da seleção de espaços e de roupas para as fotografias?

A estética era mantermo-nos em sintonia com a arte da performance e mostrar o talento e a força dela de uma forma emocional.
Este foi o seu primeiro livro, mas a sua carreira de fotógrafo já é longa. Como foi o início da sua carreira?
O meu amor por imagens começou quando, em criança, folheava as revistas da minha mãe. Tive a minha primeira câmara fotográfica no liceu e nunca mais a larguei. No que se refere à minha carreira, o meu primeiro trabalho foi como estagiário para a Annie Leibovitz. Estive dois anos com ela a fazer um pouco de tudo o que há para fazer nos bastidores de uma sessão fotográfica. Depois mudei-me para trabalhar num estúdio de fotografia e daí comecei a assistir fotógrafos. Foi quando aprendi a iluminar e a lidar com as personalidades e os clientes. Alguns anos mais tarde ofereceram-me a oportunidade de fotografar músicos que passaram pelos estúdios da MTV e esse foi o momento decisivo em que comecei a fotografar por conta própria.
A beleza da dança é o movimento enquanto a fotografia é estática. Porquê a atração em fotografar bailarinas?
As bailarinas sempre foram musas para os artistas. O trabalho e a disciplina necessários para se ser bailarina estão à vista no seu físico e porte atlético. Isso contribui para belas obras de arte.
Refere na introdução do livro que a única vez que assistiu a um bailado clássico foi numa visita de estudo durante o ensino básico. Depois de fazer este livro começou a ir com mais frequência a espetáculos de dança?
Só fui a mais um ballet depois dessa vez e foi para ver a Misty dançar num grande palco. Quando fotografávamos eu era o único público dela. Depois disto é difícil que alguma performance se compare.
Em que projetos está a trabalhar?
Em basebol! Estou a trabalhar num projeto fotográfico sobre essa modalidade desportiva. Ultimamente, tenho andado obcecado com o oceano e a forma como se move e dança. Não sei onde isto irá dar, mas é o que me inspira, agora. Basebol, o oceano e ser pai. O que há mais além disto?
*Vida em Movimento: Uma Bailarina Improvável, em tradução livre.
