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Isabel Sartorius - Exposição total

Fez parte de um conto de fadas ao transformar-se na primeira namorada do príncipe Felipe de Espanha. Mas a sua história estava longe de ser cor-de-rosa. Agora, Isabel Sartorius conta-nos tudo.

Isabel Sartorius - Exposição total
Isabel Sartorius - Exposição total
26 de novembro de 2012 às 07:00 Máxima

No final da década de 80 o seu nome e a sua fotografia estavam provavelmente em todas as revistas espanholas. Do coração ou não. E em Portugal acompanhávamos de perto o primeiro namoro a sério de Felipe, o futuro rei de Espanha. Era difícil suspeitar que por trás do glamour que envolvia o casal estava uma realidade dura, uma infância angustiada e uma família disfuncional, destroçada pela fragilidade de alma da sua matriarca cocainodependente.

http://videos.sapo.pt/4538ZwmNVgzAbLhwruZe

Isabel Sartorius dividia-se entre dois mundos e não aguentou. Foi sofrer à distância, em Londres, e à distância tentou encontrar o seu norte. Ali descobriu que era co-dependente, um mal que afeta muitos daqueles que convivem com pessoas com séria dependência física e/ou psicológica de uma substância ou com um comportamento autodestrutivo.

No dia em que a sua mãe morreu, Isabel tomou uma resolução: escrever um livro para ajudar todos aqueles que sofrem com relações semelhantes. E nessas páginas conta toda a sua vida. Da felicidade familiar nos primórdios da infância à rutura e ao novo casamento da mãe com Manuel Ulloa, político prestes a tornar-se primeiro-ministro do Peru.

Da espiral autodestrutiva em que entrou a mãe, passando por cenas dantescas entre mãe e padrasto e por situações que nenhuma filha deve passar… mas que Isabel passou, como ir comprar droga à mãe quando era adolescente. Lima, Washington, Espanha, Índia, Londres, amores, amizades e uma busca incessante pela serenidade. E, claro, Felipe, Sofia e Letícia de Espanha incluídos.

Por Ti Faria Mil Vezes (Objectiva) é uma história verdadeira e “não há que ter vergonha”, admite descontraidamente. Afável, aberta e natural, Isabel Sartorius comenta algumas passagens do livro, fala-nos da sua luta, da relação com a filha, da carreira na televisão e muito mais.

Creio que muitos pensaram, talvez pelo título, que o livro seria sobre a sua relação com o príncipe Felipe de Espanha. Mas na verdade não era bem isso. O que a fez querer escrevê-lo?

Estava obcecada por escrever sobre a co-dependência, porque desde que descobri que a tinha achei que devia partilhar com as pessoas. Antes disso, achava que estava louca. Pensava que por ter uma mãe com problemas de adição à cocaína o normal seria sofrer de ansiedade.

Até aos 27 anos, quando cheguei a Londres, não tive consciência de que existia este transtorno, de que era um transtorno e não uma doença, mas que pode pôr uma pessoa muito doente, ou mesmo louca. É disso que podem padecer aqueles que vivem com um viciado. Portanto, estava obcecada em escrever sobre o tema. A ideia surgiu na mesma tarde em que a minha mãe morreu. Pensei: “Tenho de escrever sobre isso para que todo o sofrimento da minha mãe que se vai hoje não fique por aqui, sem mais nada. E pelo meu próprio sofrimento, para que ninguém volte a passar por isso da maneira como eu me atei à minha mãe.”

E como descobriu esse transtorno?

Foi por acaso. Através de um livro de Melody Beattie, a número um mundial a trabalhar neste tema, que em cada página me fazia sentir como se me estivesse a descrever a mim. Alucinei que fosse tão óbvio que tivesse padrões de comportamento comuns a muitos dos que vivem com uma pessoa com adição: a obsessão, o controlo, o converter-se num polícia, o não ter nenhum rasgo de identidade própria por fazer uma simbiose com a pessoa próxima, por reprimir tudo o que é teu de tal forma que já nem sabes quem és, reprimir o bom e o mau, e, no fim, não saber ter momentos de prazer, estar sempre alerta, não saber relaxar.

 

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Como chegou a esse livro?

Numa livraria em Londres. Adoro ler e sou muito de procurar livros. Deparei-me com este e acabei por ler toda a obra da autora.

Tem uma irmã e um irmão, mais novos um ano e meio e um ano, respetivamente. Também sofreram com a co-dependência?

Não. Nós, mais velhos, muitas vezes servimos como um guarda-chuva. Não quer dizer que não tenham sentido dor, mas em geral esse transtorno acontece aos mais velhos.

Expor agora a sua vida de forma tão aberta é quase um contraste com o passado, quando preservava a sua intimidade dos jornalistas de forma quase tão obcecada...

É o meu grãozinho de areia que dou ao mundo. Já posso morrer tranquila porque creio que dei sentido a todo esse sofrimento. Antes protegia muito a minha mãe e a minha família da imprensa, de tudo. E depois, por fim, já não há nada mais que esconder. Nada é tão mau. Tudo está bem. A adição é uma doença. A minha mãe estava doente, não era uma delinquente. O livro foi escrito com carinho. Era a minha melhor amiga. E o que se passou foi uma história como há muitíssimas. Há uma em cada quatro famílias assim, sofrendo com uma adição, em Espanha. É possível trabalhar para melhorar. E se não se tem a sorte de que saiam da adição, pelo menos as pessoas que estão ao lado não se afundam pelo caminho.

Não trouxe à superfície feridas dolorosas?

Não. Tudo o que seja verdade é sempre sanador. A verdade é muito terapêutica e nunca vai revirar nada na nossa vida. Quando se está preparado, claro. Se não estivesse preparada não o teria escrito. Se a dor está em chaga não se faz nada. E isso para mim já passou.

Como foi crescer com uma mãe tão débil, frágil, e um pai distante, em Espanha, enquanto a Isabel e os irmãos estavam com a mãe no Peru?

Instável. Era como se me estivesse a movimentar sem ter um solo firme para pisar, sem estruturas onde me pudesse agarrar, sem padrões e referências.

E então agarrava-se a quê?

Aos livros, às amizades, a mim mesma, tropeçando, umas vezes mais, outras menos.

Hoje qual é a sua relação ou o seu sentimento em relação às drogas?

Não tenho nada a ver com as drogas. E não julgo as pessoas que as utilizam. Não posso julgá-las. Vivi mais a parte da doença do que a do vício. A minha mãe era doente e morreu disso. Tentou mil vezes sair.

Como fala disso com a sua filha?

A minha filha sabia. Conheceu a minha mãe e sabia que morria por causa da droga. Sabe que é uma coisa muito perigosa, tem muito respeito. É só. Tem apenas 15 anos, viu a avó morrer disso e, portanto, também não tem muito interesse em provar.

Quando aparecia em todas as revistas, parecia forte, segura, firme...

Não sei de onde vem essa imagem. Eu olhava para baixo e seguia em frente, fugia das câmaras. Não sei bem que imagem passei. Dizem-me de tudo: que parecia triste, que dava a impressão de séria… Não tenho ideia. Sempre fui igual: muito extrovertida, alegre, simpática, mas fugia para proteger tudo o que me rodeava.

No livro fala da sua relação com o príncipe Felipe. Escreve mesmo sobre a dúvida de referir ou não esta passagem da sua vida. Opta por fazê-lo. Porquê?

Não havia razão para não o fazer. São 10 páginas. Mas também, no meu transtorno, o que rodeava a relação – não tanto a relação, que foi maravilhosa, mas a imprensa, as perseguições –, fez-me ainda pior. Ninguém tinha culpa. Dou-me bem com a imprensa. Era o sistema que os levava a isso. O pior e maior hábito da co-dependência é estar sempre a controlar. E eu tinha de controlar todos estes paparazzi à minha volta. Conhecia-os a todos. Sabia as matrículas dos carros. Tornei-me quase como um computador.

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Comentou com o príncipe que o ia incluir no livro?

Somos todos amigos, mas não peço autorização a ninguém. Sou independente, tenho 47 anos. Comentei: Vou escrever um livro sobre a co-dependência e incluirei coisas autobiográficas. “Então, se estás contente, é a tua vida, faz o que quiseres.”

Coloca, de uma forma retórica, a pergunta que a dada altura toda a gente fez: Terá sido a rainha quem forçou a separação de Isabel e Felipe? Garante que não. Então, o que foi?

Éramos muito jovens. Eu estava mal, isso era claríssimo. Vivia uma situação muito esquizofrénica entre esse ambiente duríssimo da minha mãe e da droga e tudo o resto. Com toda a pressão mediática, a certa altura fiquei muito mal e disse: “Vou-me embora de Espanha.” Fui e só voltei 10 anos depois. Não aconteceu absolutamente mais nada. Foi tão natural como isso. Ele deu-se conta de que eu estava mal e disse: “Muito bem, vai.” E nunca pensámos em casamento. Só a imprensa pensou nisso. Nós não! Se havia pressão? Tudo era pressão, mas o problema é que o meu mundo interior estava mal.

O que é co-dependência?

“Imagina um mar picado, em plena tempestade. Imagina que alguém que te é próximo, alguém que amas, caiu à água e perdeu os sentidos, está prestes a afogar-se. Tu és a única pessoa a ver e lanças-te à água para salvá-la. Consegues agarrá-la e mantê-la a flutuar, se bem que essa pessoa pese imenso e os braços começam a doer-te. Ninguém te ouve gritar.” Assim começa Isabel Sartorius a descrever a co-dependência no seu livro.

. Esta é uma situação psicológica, emocional e de conduta que algumas pessoas desenvolvem após uma longa convivência com adictos – à droga, ao álcool, ao sexo, ao jogo, por exemplo – ou com comportamentos autodestrutivos.

. São pessoas que criam um mau vínculo, pouco saudável, que as leva a permitir que o comportamento da outra pessoa as afete e as leve a querer controlá-lo.

. “Sugiro que quem esteja nesta situação procure ajuda. São relações debilitantes. E é muito difícil sair sozinho dessa situação. Há um nó que tem de ser desfeito. Há inúmeros grupos de apoio, gratuitos, que podem ser de grande ajuda. Há também terapias”, aconselha Isabel Sartorius

Acabou também por não casar com o pai da sua filha. É uma solitária convicta?

“Imagina um mar picado, em plena tempestade. Imagina que alguém que te é próximo, alguém que amas, caiu à água e perdeu os sentidos, está prestes a afogar-se. Tu és a única pessoa a ver e lanças-te à água para salvá-la. Consegues agarrá-la e mantê-la a flutuar, se bem que essa pessoa pese imenso e os braços começam a doer-te. Ninguém te ouve gritar.” Assim começa Isabel Sartorius a descrever a co-dependência no seu livro.

. Esta é uma situação psicológica, emocional e de conduta que algumas pessoas desenvolvem após uma longa convivência com adictos – à droga, ao álcool, ao sexo, ao jogo, por exemplo – ou com comportamentos autodestrutivos.

. São pessoas que criam um mau vínculo, pouco saudável, que as leva a permitir que o comportamento da outra pessoa as afete e as leve a querer controlá-lo.

. “Sugiro que quem esteja nesta situação procure ajuda. São relações debilitantes. E é muito difícil sair sozinho dessa situação. Há um nó que tem de ser desfeito. Há inúmeros grupos de apoio, gratuitos, que podem ser de grande ajuda. Há também terapias”, aconselha Isabel Sartorius

Não casei com Javier Soto Fitz-James Stuart. Suponho que sim, que seja uma solitária. A vida é o habitat em que me movo, o meu habitat natural. Estou sempre só porque sim. Não indago tanto. Não me fecho a nada. Sou feliz e já está. Não encontrei ninguém com quem me apetecesse conviver. Estou muito bem como estou.

Aqui em Portugal há alguns mitos sobre si. Um deles sugere que o relacionamento com Javier Soto surgiu para encobrir a relação que ainda mantinha com Felipe de Espanha e a verdadeira paternidade da sua filha.

Isso ocorria na Idade Média, hoje em dia não é assim. Penso que se tivesse tido um filho de quem quer que fosse diria quem era o pai. Não tenho qualquer problema.

Refere ainda que sofreu mais quando Javier Soto se casou do que quando Felipe anunciou o seu casamento com Letícia.

Felipe era meu amigo e fiquei feliz por ele. Com Javier senti-me mais triste porque ia todos os dias lá a casa ver a Mencía, e quando se casou tudo isso acabou. Essa rotina que tínhamos criado rompeu-se. Mas, afinal, acabámos por conseguir criar uma outra rotina. Não consigo dar-me mal com as pessoas. Ele está casado, com filhos, e dou-me bem com todos. E a minha filha adora os irmãos. Javier é um excelente pai.

Como foi ser mãe sem ter sido filha, uma vez que cuidou mais da sua mãe do que o contrário?

Na verdade, nunca senti que não fui filha. Mas já tinha sido tão mãe da minha mãe que me saía naturalmente. Concentrei-me para que a minha filha fosse muito bem cuidada e que tivesse uma mãe. E não foi difícil. Estou muito bem com ela e tenho ajuda – uma empregada, o meu pai, enquanto era vivo, e a sua mulher. Tem corrido bem, pelo menos até agora. E Mencía é muito fácil. Houve alturas em que me excedi um pouco, ligava-lhe muito, e ela pedia-me que não o fizesse tanto. Mas apenas coisas tontas como essas.

Nunca chegou a criar um vínculo exacerbado com a sua filha como fez com a sua mãe?

Não. E nem ela deixa. É muito independente. Há um vínculo saudável entre nós. Ela é muito dócil e pacífica. Tive sorte. Fez-me descobrir o que é ter uma relação saudável com alguém.

Afirmou no livro que se dá bem com Letícia, a princesa das Astúrias. Que tipo de relação mantêm?

Temos o mesmo círculo, portanto vemo-nos em casa de amigos e lugares comuns. Damo-nos bem, é inteligente, gosto de conversar com ela e é carinhosa. O resto pertence-nos a nós as duas.

O livro narra a sua longa busca pelo equilíbrio…

Essa busca que todos fazemos. E eu talvez tenha tido de dedicar mais tempo a isso.

E agora sente-se mais próxima desse equilíbrio?

Sim, de certeza. Não sei se é devido às terapias ou à idade. Creio que é a combinação de ambas.

Quais foram os passos mais importantes nesta trajetória?

Todos os grupos de co-dependentes anónimos que contactei foram importantes. Depois, para mim resultou muito bem o coaching, em que se trabalham os objetivos, porque na co-dependência estamos tão fixados na vida de outros, em cuidá-los, que não fixamos as nossas próprias metas. O coaching ajuda muito nisso. A Programação Neurolinguística (PNL) também me ajudou muito porque se propõe a reprogramar todos esses hábitos negativos que te impedem de ser feliz. São terapias superpotentes. E continuo a trabalhar. Isso é para a vida.

Finalmente, encontrou a sua carreira?

Trabalho em televisão há dois anos e meio e estou encantada. Estou na Antena 3 de Espanha e continuo lá com vários projetos.

Estava a fazer uma rubrica de experiências. E agora?

Estou a trabalhar em algo um pouco mais sério, sobre problemas como hiperatividade e crianças, e temas similares. Quando comecei fazia este tipo de trabalhos mais profundos e agora estou a retomá-los.

E vai seguir uma carreira literária?

Não, não pretendo escrever mais nenhum livro. Não sou escritora. Queria escrever sobre a co-dependência e nada mais.

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