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Fátima: Nove dias e quatrocentos quilómetros
A propósito da estreia do novo filme de João Canijo, a Máxima reuniu dez das onze atrizes que interpretaram o grupo de peregrinas que vai de Vinhais até Fátima. O processo de preparação das personagens começou há anos e incluiu idas em peregrinação e períodos a viver naquela terra transmontana.
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Elas iam chegando ao local onde iam ser maquilhadas, penteadas e vestidas e cada uma era, na verdade, três. Era a pessoa que chegava, era a atriz que participava na produção fotográfica para a Máxima a propósito da participação em Fátima, de João Canijo, que estreia a 27 de abril, e era a personagem que tinha interpretado no filme. Anabela Moreira, Rita Blanco, Ana Bustorff, Márcia Breia, Cleia Almeida, Vera Barreto, Íris Macedo, Teresa Tavares, Sara Norte, Alexandra Rosa e Teresa Madruga, que não pôde estar presente na sessão, personificam um grupo de mulheres que fazem uma peregrinação a pé a Fátima, vindas de Vinhais, o percurso mais distante do País.
"Foram anos disto. Primeiro, o João convidou-me para fazer o filme. Depois, pediu-nos para fazer uma peregrinação com grupos de pessoas para sabermos o que é uma peregrinação a Fátima, saber o que comem, o que fazem", conta Cleia Almeida. "Fizemos depois uma peregrinação só com as atrizes e o João levou a câmara. Fomos com uma pessoa de Vinhais, dormimos na carrinha, comemos enchidos, sopa de repolho, bebemos algum vinho. Foi nessa peregrinação que adensámos as tensões entre as personagens." Em janeiro de 2016, as atrizes foram viver para Vinhais e Cleia Almeida trabalhou num jardim de infância. À tarde, juntavam-se e falavam sobre as suas experiências. Daí saiu uma base para o guião.

No cabeleireiro onde decorrem os preparativos para a sessão fotográfica, há um sofá largo, sem costas, que dá para sentar dos dois lados, à volta do qual as pessoas se reúnem e conversam. Sara Norte anuncia às colegas que vai casar em maio com o Vasco, técnico que conheceu na rodagem do filme, Teresa Tavares pergunta pelos cães de Rita Blanco, que tem visto no Instagram, Vera Barreto diz que está a deixar de fumar. Cleia Almeida opta pelo rabo-de-cavalo porque vinha com o cabelo já trabalhado pela produção da telenovela em que está a participar e Anabela Moreira aceita a sugestão da stylist Joyce Doret para usar um vestido Valentino.
"Sou uma fã do trabalho de [Peter] Lindbergh", conta Joyce Doret, enquanto mostra no telemóvel imagens a preto e branco da autoria do fotógrafo alemão. "A location é uma estrada num descampado, um caminho, como o que as atrizes fazem no filme, mas de inspiração hollywoodesca. Tudo muito sóbrio, muito clássico." São roupas pretas ou brancas, camisas, saias, smokings, vestidos, casacos. Às atrizes aguarda-as um final de tarde de luz amena, filtrada por uma camada homogénea de nuvens que deixa despontar algum sol. O descampado perde-se de vista e a ponte Vasco da Gama – estamos em Lisboa – está a ver-se ao fundo.
Fátima tem duas versões, uma de 202 minutos e outra de 153. Na curta, o filme começa com a personagem de Anabela Moreira, Céu, a afastar-se do grupo, a indiciar uma divergência para com o coletivo. "Tu transformas-te num animal, ficas quase reduzida a isso. Não tomas banho, tens de ir ao mato [fazer necessidades], não podes ir ao mato quando queres, porque o grupo não pode esperar por ti", explica a atriz. No ano em que fez a sua peregrinação, como parte do trabalho de campo indicado pelo realizador, havia uma senhora de idade que tinha de tomar medicação por causa da retenção de líquidos. "Deixou de a tomar para não atrasar o grupo." Anabela Moreira levava calçados uns ténis número 42, apesar de o seu número ser o 40, e a partir de certa altura o calçado não lhe servia. "São duas vozes que estão dentro de ti, ao mesmo tempo. O corpo diz para parar e a cabeça diz que não posso parar."
"É muito doloroso e nunca para de ser doloroso. Fiz a peregrinação [prévia à rodagem] mais longa e tive necessidade de parar. Acordas com dores e adormeces com dores." A personagem de Vera Barreto chama-se Nanda. Na cabeça de Vera, Nanda estudou agronomia e foi gerir os terrenos da família; os pais, ela e o marido vivem todos na mesma casa. "O convívio é prazeroso até ao terceiro dia, depois tudo estala. O cansaço era uma preocupação que todas tínhamos. O que é que uma pessoa faz quando está cheia de dor? O que é que a dor causa?"
Primeiro pelas montanhas, depois por não-bermas pelas quais os camiões não param de fazer razias, à medida que se aproximam do destino e o número de peregrinos nas estradas se intensifica, as tensões adensam-se entre as nove mulheres que fazem o caminho a pé e as duas (Márcia Breia e Sara Norte) que dão o apoio na carrinha com rulote, onde todas dormem e comem. Criam-se cisões, fazem-se alianças.
"A minha Amparo é a que fala menos, é uma espécie de sombra, de espírito pairante", descreve Ana Bustorff. "Foi muito fascinante trabalhar o silêncio, que existe sempre dentro de nós. Para mim, a fé estava naquelas montanhas [do percurso] e não em Fátima."
"Uma coisa é o momento em que fazes a promessa, tudo muito religioso, muito romântico – é um momento de grande fé, de grande espiritualidade. Outro é quando a concretizas, que é uma coisa completamente diferente", conta Anabela Moreira.
O filme nunca revela os motivos por que cada uma cumpre uma promessa, à exceção da professora, interpretada por Teresa Madruga, que diz no filme estar a fazer a peregrinação pela vez de outra pessoa. "Não sou religiosa, não deste tipo de religiosidade. Chego a ter pena de não saber exatamente o que é a fé. Não nesse sentido das peregrinações", revela Márcia Breia, a dona Isaura que, juntamente com a neta, gere o negócio do carro de apoio àquele grupo de peregrinas. "Interrogo-me, claro. E, quanto mais velha fico, mais penso. Mas não foi sob esse ponto de vista que explorei [a minha personagem] quando estava a fazer o filme. No filme, eu não acreditava nem deixava de acreditar. Tinha o meu negócio, tinha coisas para cumprir."
"Ri-me muito, confesso", confessa Vera Barreto acerca de quando visionou Fátima. "Uma peregrinação não é sempre um martírio total. Existem momentos de convívio, lúdicos, e há momentos em que é horroroso e só apetece desistir. Gosto que o filme mostre esses dois lados."
"Eu achei que tinha de fazer um bocadinho o papel de líder – eu e a dona da carrinha – para podermos chegar a bom porto", explana Rita Blanco. Para interpretar a Ana Maria, Rita Blanco diz ter-se inspirado numa pessoa que conheceu, dona de um café. "As personagens estavam muito fechadas e eu achei que a minha devia ser alegre, dizer graças, para desanuviar o ambiente." E acrescenta que Ana Maria não tem uma promessa para cumprir, faz a peregrinação porque adora ir a Fátima. "A Nossa Senhora é a guia espiritual dela e vai sempre lá agradecer-lhe o facto de estar viva, de ter trabalho, de existir. Na minha opinião, quando as pessoas têm uma vida dura, de sol a sol, ir a Fátima é quase como umas férias: umas vão para a praia, outras vão em profissão de fé. Estão a sair completamente das suas rotinas."
Anabela Moreira confessa que, um mês depois da experiência, deu por si a pensar que o faria de novo, agora com a vinda do Papa. "É uma questão de superação, de orgulho, o facto de não ter desistido. Mas tão rapidamente não me meto nisso. Acho que o caminho pode ser feito de outra maneira. Não acredito que Deus queira que sofras daquela maneira." Na peregrinação que fez enquanto trabalho de campo, deu por si a caminhar de forma automática e a adiantar-se do grupo, à semelhança do que vemos a sua personagem a fazer no filme. "Durante o percurso, as pessoas diziam: ‘A Anabela já está em Fátima.’"
Para a sessão fotográfica, as atrizes posaram descalças, numa estilização da ideia de caminho. "A sessão atrasou um pouco e estava muito frio, não tínhamos onde nos abrigar. Foi um pouco como revivermos a situação de Fátima", brinca Anabela Moreira.
"O filme é mais sobre o desencontro do que sobre o encontro", defende Rita Blanco. "As pessoas fazem isto na vida, desentendem-se e, por alguma razão que se desconhece, apaziguam-se, para a vida continuar igual." O filme termina com a chegada ao santuário, a reconciliação das personagens e a apoteose da congregação de milhares de fiéis, reunidos em comunhão de fé. E não era necessário, acabou por anular a catarse. Devia ter terminado no precipício.
Por Cláudia Marques Santos. Realização: Joyce Doret| Fotografia: Ricardo Santos
Por Cláudia Marques Santos.

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