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A solidão da minha irmã preocupa-me. Como posso ajudá-la?

Escrevo a partir de Luanda, onde estou a viver desde há dois anos, com a minha mulher e filha. Estamos a adaptar-mo-nos bem, mas a preocupação com a minha irmã (que ficou em Portugal) tem vindo a crescer. Ela tem 45 anos e é divorciada, sem filhos. Se na juventude tinha muitas amigas, com o passar dos anos começou a isolar-se, e a mostrar-se muito crítica em relação a todos. Quando estávamos em Portugal refugiava-se muito em minha casa, e nos últimos anos começou a parecer-me cada vez mais infeliz e a dizer que se sente sozinha. Não tenho condições para voltar para Portugal (é aqui que tenho o meu trabalho), mas gostava de a poder ajudar. Esta solidão da minha irmã preocupa-me. José Martins, 36 anos, Luanda.

15 de abril de 2015 às 07:00 Dra. Catarina Rivero

Caro José, felicito-o desde já por ter encontrado um equilíbrio familiar e profissional, bem como pela atenção afetuosa que demonstra pela sua irmã.

Relativamente à solidão que refere sobre a sua irmã, esta poderá ser derivada de múltiplos fatores e os caminhos para dar a volta, poderão ser distintos. Se o seu apoio poderá ser muito importante, competirá à sua irmã a vontade de se encontrar a si própria, com bem-estar individual e relacional, de forma autónoma.

Deixo algumas perspetivas sobre a solidão que, espero, tenham utilidade…

Muitas vezes a solidão prende-se com a perceção de estar só, de não ser amado e de não-pertença. Se bem que muitas vezes associado, o sentimento de solidão não implica estar isolado, ou estar sozinho fisicamente. Na verdade, muitas pessoas sentem uma enorme solidão estando constantemente em contacto com outras pessoas e/ou envolvidas em múltiplas atividades. Outras, por seu lado, podem estar dias sozinhas por períodos de tempo significativos sem se sentirem sós.

Todos sentimos solidão algumas vezes na vida: perante a morte de um ente querido, fim de relação ou em caso de desemprego ou reforma. Poderá tratar-se de perder um sentido para a vida e nos sentirmos sós no mundo. Este sentimento de solidão, nestes casos, é adaptativo e permite-nos reencontrar (ou recriar) um equilíbrio emocional, um novo sentido, uma nova forma de estar – trata-se de um sentimento transitório de solidão que pode durar meses. A situação agrava-se em situações de solidão com maior continuidade no tempo. Quando não conseguimos ultrapassar ou procurar ajuda. A investigação sugere que efetivamente um estado de solidão prolongado no tempo pode levar a situações de depressão e ansiedade, aumentando mesmo riscos para saúde ao nível dos sistemas imunitário e cardiovascular. As pessoas que sentem solidão tendem a descuidar alguns hábitos de vida saudável como fazer exercício, manter uma alimentação adequada à sua situação física ou cumprimento de tratamentos médicos (quando os há). Sabe-se ainda que estas pessoas apresentam mais problemas de sono e mostram-se mais vulneráveis a situações de stress. Nestes casos, a ajuda de um profissional de saúde mental pode ser importante e útil – já considerou recomendar uma consulta de psicologia à sua irmã?

Em muitas situações a solidão prende-se com uma discrepância entre as relações esperadas e as relações existentes. Há um crescendo entre jovens e adultos que se isolam e sentem as relações que se vão mantendo como pouco ou nada gratificantes. Algumas destas pessoas, cada vez mais, acabam por se envolver em relações virtuais - em chats ou redes sociais - que são menos exigentes do ponto de vista de competências sociais e emocionais (as pessoas sentem-se mais "protegidas"). Quanto mais tempo se passa num sentimento de solidão, maior a dificuldade em dar a volta e retomar contacto ao vivo (e ‘offline’) com os demais.

Pessoas que demonstram altos padrões de perfeição, tendem igualmente a afastar os demais. Nestas situações, acabam por se focar sobretudo nos defeitos das pessoas que as rodeiam, com crítica recorrente, para além de procurarem dar uma imagem ‘perfeita’ de si, não admitindo qualquer tipo de falhas. Esta postura acaba por dificultar o estabelecimento ou manutenção de relações de intimidade (familiares, românticas ou de amizade).  Por outro lado, um grande inimigo do bem-estar é a comparação social, ou seja , a tendência que temos a comparar-nos com os outros (de modo geral, os que ‘são’ ou ‘têm’ mais do que nós), podendo levar a uma noção distorcida de si próprio, com impacto na autoestima e segurança para se relacionar positivamente com outras pessoas. 

Assim, poderá ser importante ver com a irmã que atividades se sente disponível para fazer (hobbies, ginásio, cursos, etc), que pessoas se sentirá à vontade para ligar e convidar para uma atividade (cinema, caminhada, etc). E naturalmente, relembrar que poderá recorrer a um terapeuta para a ajudar a sair deste ciclo que muitas vezes se perpetua no tempo, sem o próprio ver soluções possíveis na sua forma de estar e se relacionar com os demais.

 

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