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A história da espia americana mais procurada pela Gestapo

Virginia Hall era um nome desconhecido. Sonia Purnell, jornalista, tropeçou na vida de alguém que, por ser mulher e portadora de deficiência, não tem dúvidas, viveu na sombra da História todos estes anos.

Foto: Getty
17 de maio de 2021 às 07:00 Máxima

Não faltam exemplos de mulheres que foram esquecidas da cronologia dos grandes acontecimentos do mundo. É o caso de Virginia Hall, que estabeleceu uma vasta rede de espiões por toda a França, em plena Segunda Guerra Mundial, e que era um dos principais alvos da Gestapo, a polícia secreta da Alemanha nazi.

 Sonia Purnell, jornalista britânica, debruçou-se sobre a vida desta mulher na biografia Uma mulher sem importância, recentemente editada em Portugal pela Crítica, do Grupo Planeta. Em entrevista à Máxima, por e-mail, Purnell explica como se deparou pela primeira vez com esta espia que operava na sombra e se tornou um elemento fulcral da Resistência: "Tropecei em algumas menções aqui e ali desta mulher extraordinária com uma perna de madeira chamada Cuthbert, que se tinha tornado a espia mais procurada pelos Nazis e uma lenda no mundo dos serviços secretos. Pouco era sabido sobre ela. Como é que eu poderia não querer descobrir mais?"

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 A questão transformou-se num livro mais de 400 páginas, fruto de uma investigação minuciosa da jornalista que precisou de mais de três anos para escrever. "Virginia não procurava glória ou fama, simplesmente respeito, pelo que fazia", diz, explicando por isso a escassez de recursos e documentação. "Ela sabia que era mais eficaz não falando e, claro, depois da Guerra queria continuar no mundo clandestino. Investigá-la foi por isso um enorme desafio, todos os nomes de código, tantos documentos destruídos ou perdidos, pessoas que a conheciam e não sabiam realmente quem ela era ou de onde ela vinha. Muito pouco foi escrito, e quando isso aconteceu, normalmente era escrito em charadas ou com tantos nomes e palavras de código que me demorou mais de três longos anos de trabalho de detetive, e uma grande dose de sorte, para lhe seguir o rasto que incluía, claro, viajar por Portugal".

 Durante a investigação, fascinou-a a resiliência de Virginia, uma mulher num mundo predominantemente masculino e, além disso, uma mulher portadora de uma deficiência física. "Durante anos ela esteve em perigo constante de tortura e morte, os Nazis como o reconhecido Klaus Barbie, da Gestapo, eram obcecados em apanhá-la. Ela tinha pouca formação e no início poucos esperavam que ela sobrevivesse mais do que alguns dias. Como é que ela lidou com este medo intermitente? Como é que ela encontrou a resiliência? Como é que ela foi tão autossuficiente? Queria perceber isso e acredito que a chave é o acidente terrível que a fez perder a perna quando tinha apenas 27 anos. Não se esperava que ela sobrevivesse aí também, mas ela sobreviveu e prometeu desde então mostrar porque é que tinha sido salva, para fazer algo excecional com a sua vida ", acredita autora lembrando que Hall acabou por "ajudar a mudar o curso da guerra em França.".

 A história, que neste momento já está a caminho de Hollywood, uma vez que a Paramout Pictures assegurou os direitos do livro, terá Daisy Ridley, a atriz que protagonizou os mais recentes filmes da saga Star Wars, na pele desta mulher "de espírito e mente livre" que Purnell descreve. "Pensava por ela, conseguia ver o terror que vinha da Europa antes dos outros. Acreditava fervorosamente na verdade, sabendo que uma vez perdida todos nós estamos perdidos. Se a conhecêssemos hoje acredito que ela passaria a imagem de uma mulher moderna, progressista, que teria muito para nos ensinar, ainda hoje. Ela inspira-me todos os dias", admite.

 "Muitas pessoas simplesmente não queriam saber, ou acreditar, que uma mulher, e sobretudo uma mulher com deficiência, fosse tão boa se não melhor do que os homens".  

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Em 1942, a Gestapo enviava uma transmissão urgente: "Ela é a mais perigosa de todas as espias dos Aliados. Temos de a encontrar e destruí-la.". Se parece inacreditável como é que a visada desta mensagem só é conhecida praticamente agora, Sonia Purnell aponta alguns caminhos. Além do evidente apreço pelo secretismo, a sociedade conservadora terá ditado a sombra em que esta mulher permaneceu ao longo do tempo. "Virginia era uma mulher num mundo de agentes secretos e especiais quando este era considerado exclusivamente masculino. A sociedade ficou ainda mais conservadora depois da Segunda Guerra Mundial. Muitas pessoas simplesmente não queriam saber, ou acreditar, que uma mulher, e sobretudo uma mulher com deficiência, fosse tão boa, se não melhor, do que os homens num jogo cruel e de astúcia que requeria enorme coragem e ingenuidade. Ela não preenchia a narrativa do final dos anos 40, 50 ou mesmo nas décadas seguintes. Talvez só agora estejamos prontos, no século XXI, para apreciar o seu sucesso formidável e para perceber que aqueles que gritam mais alto são muitas vezes os que menos fizeram", sugere.

 Legenda livro: Uma Mulher Sem Importância, de Sonia Purnell, € 22,90, Crítica, Editorial Planeta

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