"Em dois anos já criei sete perfis. O Hinge é a minha relação mais tóxica."

A aplicação de encontros “criada para ser apagada”. É o slogan e honestamente faz muito sentido - a não ser que, como eu, a vossa preferência seja ficar "na pausa".

Hinge: uma relação tóxica? Foto: Frederico Martins
12 de dezembro de 2025 às 09:00 Aurora Nunes

Depois de dois anos como utilizadora ávida já criei pelo menos sete perfis novos. Entretenho-me lá uns meses, farto-me dos homens medíocres e sem personalidade que lá estão e apago. Passado umas semanas volto. É a minha relação mais tóxica.

Há uns dias achei que não deveria sucumbir ao sentimento de aborrecimento e apagar. O meu perfil é fantástico, porém “intimidante” segundo fontes próximas, e tem pequenas observações que só uma pessoa sofisticada e com inteligência emocional irá perceber: o meu maior medo (ir)racional são sugestões de Inteligência Artificial e gosto de dormir com meias – sim, eu sei, esta última pode ser polémica mas é verdade. Só de pensar nos meus pés ao frio dá-me arrepios. Mas vá, vamos deixar de imaginar os meus pés.

PUB

Desta vez, em vez de apagar decidi escolher o melhor dos dois mundos – meter o meu perfil na pausa. Assim as conversas com os sete rapazes que achei dignos de receber a minha atenção continuam disponíveis mas o meu perfil desaparece para o resto dos utilizadores que estão incessantemente a tentar arranjar o amor da vida delas. Ah, uma coisa que quero deixar muito clara, não estou cá para encontrar o meu grande amor.

Eu costumo recorrer à pausa quando quero interromper o leque infinito de escolha que estas aplicações nos dão. Passar pelo perfil de mais de cem homens onde os julgo com base em imagens de ângulos questionáveis e frases pré-feitas numa semana parece um episódio de Black Mirror. É distópico e abstrato, mas onde mais é que eu vou encontrar um engenheiro francês de Paris a morar na Penha de França, e que mal sai de casa, com a altura, cara e cabelo perfeito? Eu nem frequento a Penha de França. Ok, se calhar não foi o melhor exemplo, ele disse que tinha apagado o Hinge no nosso terceiro date e era mentira. Obviamente. Nem eu sou tão obcecada para fazer tal coisa.

A pausa permite-me estar lá mas não participar na rejeição inevitável que me espera. A verdade é que tenho um avoidant attachment style, ou é o que quero acreditar depois de ter feito vários testes de personalidade online e ter lido precisamente cinco artigos sobre o tema. Eu fico investida rápido mas à mínima inconveniência farto-me, não só de homens, mas do Hinge. Farto-me da quantidade overwhelming de opções, farto-me do processo de conhecer uma pessoa: “Olá, tudo bem? De onde és? O que estás a fazer em Lisboa? Ah és nómada digital? Onde vives? Arroios. Claro.”

Farto-me especialmente de quando vou a dates com estes homens e saio de lá com a impressão de que o encontro foi bom, mas na verdade, eu é que fui engraçada, eu é que estava interessada neles, eu é que ocupei todos os silêncios com temas interessantes. Detesto relembrar-me de que eles não fizeram uma única pergunta sobre mim e depois volto ao primeiro passo, a contemplação de apagar esta aplicação que apesar de me ter dado tantos encontros, não me deu ninguém de jeito. E não vai dar, mas pelo menos aos poucos vou entendendo o que quero num parceiro. Mas isso fica para outro dia. Por agora continuo no Hinge, mas quem sabe, mais um rasgo de loucura e toca a apagar de vez… quero dizer, meter na pausa.

PUB

PUB
PUB