Tijosa eco-house. Dormir na natureza em quartos de designers de moda
Designers de moda nacionais pensaram os quartos da Tijosa, um eco-resort onde o luxo é despojado, a hospitalidade generosa e as camas leves como nuvens.
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14 de agosto de 2025 às 11:48 Patrícia Barnabé
Num momento em que todos deslizam para sul à procura do sol, preferimos fugir ao excesso de visitantes e resguardarmo-nos onde não existem menus para inglês ver, a norte, onde o ar ainda se respira limpo. Neste novo Portugal hospitaleiro, há muito que não nos deparávamos com um lugar tão autêntico. A Tijosa eco-house camp tem todos os ingredientes do bom gosto, do conforto e da hospitalidade, com uma escala humana e cuidados com a Natureza que a rodeia.
Paula Guerreiro tem uma carreira na grande hotelaria e sabe muito bem o que faz. Veio para aqui, vinda de Lisboa, porque se apaixonou por Fernando, filho da terra, e este projeto, vê-se, está cheio de amor e dedicação. Conheceram-se em Porto Santo, ia inaugurar o hotel Pestana, e Paula estava responsável pelo evento. Quis organizar “o concerto mais pequeno do mundo”, com o apoio da Rádio Comercial. “O artista que era para ir, porque tinha lançado disco há pouco tempo, era o João Pedro País, que andou a tentar conciliar agendas”, recorda. Fernando é o baterista de João Pedro Pais e voou de Lisboa, Paula voou de Lisboa, e até hoje. Aqui fizeram o seu ninho, ao pé da ria.
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Namoraram um ano à distância e um dia ele trouxe-a à Tijosa. “Nunca mais te vais esquecer daquilo”, disse-lhe. Ela começou a apanhar amoras, vê uma ruína e pensou: “Podia reconstruí-la e fazer uma casa pequenina”, recorda. Entretanto soube que iam pôr, naquele mesmo terreno, uma placa a dizer "vende-se" e correu. “Não ponha!”, ri-se. Esta viria a ser a sua nova casa e nunca imaginou a luta que foi pô-la de pé, entre a consulta de cinco entidades diferentes, por ser uma zona protegida, às burocracias infindáveis e costumeiras das autarquias, e foi preciso juntar os cinco donos diferentes daqueles terrenos, todos da zona, para avançar. Demoraram 15 anos a tornar o sonho realidade. Aponta a capelinha da Nossa Senhora da Boa Viagem, que fica mesmo ao lado, e duas árvores que já ali estavam, e testemunharam o suado nascimento deste belo projeto.
A Tijosa surge, então, e literalmente, das ruínas. Foi construída mesmo a seguir ao cais da ria, que recuperaram pela importância que sempre teve para a zona, no transporte do moliço e do sal que ali se fez por gerações. O cais da Tijosa fica em pleno verde, onde foram campos de cultivo, na bela ria de Aveiro, numa zona ainda não engolida pelo turismo, um tesouro entre a Natureza e a civilização onde ainda reina a agricultura e a pesca. E a escala humana. Ficar na Tijosa é dormir, literalmente, ao lado da água e estar perto de tudo. Vêem-se bandos variados de pássaros levantar voo numa paisagem quieta, aquática e quase lunar, é natureza por todo o lado. A Tijosa chegou a ser uma ilha na ria de Aveiro, por isso ainda faz parte dela, e isso sente-se. Quando não está vento e a água serena, pode chegar-se de barco e até ver flamingos, sempre discretos, e outras pequenas aves airosas ou pernilongas, como as garças e as cegonhas, que cortam o vento da ria para pescar. É de uma beleza esmagadora e simples, das que rareiam em outras zonas protegidas do país já cheias de gente. Aqui quando se amanhece, toma-se o pulso ao dia e à disposição da ria, que tanto pode esconder-se e confundir-se no nevoeiro ou brilhar como um espelho.
Flamingos discretos na ria de Aveiro, um tesouro natural perto da Tijosa eco-house camp
Foto: DR
A primeira pedra foi lançada no dia 10 de outubro de 2016 e a ideia foi ter apenas 10 quartos, todos virados para a Natureza. Por isso, pode dizer-se que é uma casa de campo moderna. Uma pedra, que era da entrada da ruína original, está no balcão da recepção, que é apenas um banco e mesa de marceneiro, com as suas ferramentas, veio de Lisboa para receber os hóspedes. Assim como os candeeiros feitos de galhos de árvores de uma artista alentejana, uma peça de Helena Brízio, um painel de Manuela Pimentel e velas de soja feitas pela estagiária do hotel. Tudo ali tem um sentido e uma proximidade com a Ecologia ou o humano, por isso é fácil sentirmo-nos em casa. A sala alberga um piano, por exemplo, que lhes foi oferecido, era de uma professora de piano, e as madeiras rústicas, os tons de beges e os candeeiros em palhinha, tipo junco, são uma vontade de “trazer os materiais de fora para dentro”.
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Quartos de designers de moda na Tijosa eco-house camp, junto à ria de Aveiro
Foto: DR
Os quartos são despojados e acolhedores, não têm mais nem menos, mas o tamanho necessário com tudo o que se precisa. A começar por uma grande janela aberta sobre o verde, sem prédios ou carros a estragar o idílio. São todos diferentes, cinco duplos e cinco de autor que Paula quis que fossem designers de moda. Dino Alves pintou o quarto de preto, escolheu as mesas de cabeceira, fez uma manta de retalhos da cama e assinou quatro aguarelas, por exemplo. Nuno Gama escolheu tapetes em pele e um colchão que desenhou para a Molaflex, e os Storytailors inspiraram-se na primeira coleção que apresentaram na ModaLisboa, a princesa Narké, e na roupa que usou na sua grande viagem. O universo feminino, delicado e airoso é evidente no quarto de Katy Xiomara, e Alexandra Moura inspirou-se naquela ruína, no princípio de tudo, e sentimos o olhar romântico e rock 'n'roll da sua moda, o seu inabalável bom gosto futurista, evidente na sua escolha e aplicação de azulejos. Todos os quartos têm um tablet com a explicação do quarto, quem foi o seu criador, o que já fez na moda, e não só, e porque aceitaram o desafio de desenhar espaços de descanso no meio da natureza, tão longe da definição de rapidez, hiper cosmopolitismo e fluidez que a moda abraça, cada vez mais.
Quarto com design de Dino Alves no Tijosa Eco-House Camp, perto da ria de Aveiro
Foto: DR
No pequeno-almoço evidencia-se o cuidado da hospitalidade, porque este exige frescura e detalhes fáceis de subverter com sucedâneos. Chegamos à sala de refeições e os aparadores de madeira reciclada guardam as cerâmicas da ex manequim portuguesa Anna Westerlund, feitas nas cores do logo da Tijosa: “A junção dos elementos, o amarelo que é sol, o nascer do sol na ria, as riscas são a água e o T, de terra e de Tijosa, em castanho (invertido, porque significa terra em mandarim). Tijosa era o nome da ilha”, explica-nos Fernando Tavares. Os copinhos do café são todos feitos à mão, por Helena Brízido, e quando levantamos os olhos vemos na parede pratos de cerâmica com decalques feitos com plantas da região. Mais importante, a fruta e pão muito frescos, manga, morangos, o sumo de laranja é mesmo natural, uma raridade, o pão muito variado, do mais rústico ao centeio e à beterraba, acabados de chegar. E os ovos são caseiros e feitos no momento.
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De resto, é maravilhoso não ter nada para fazer num cenário assim. É ideal para levar um livro, lagartar na piscina e fazer passeios longos – pode levar o seu fiel companheiro, é claro que este lugar recebe animais de estimação. Pode fazer percursos em bicicleta elétrica ou um passeio de barco, que se marca com antecedência e pode incluir piquenique. Também se aconselham os passeios a cavalo na Bonanza the Land e as massagem da Virginie que largou a medicina dentária para se dedicar à medicina chinesa. Regressada à terra do pai, português emigrante no Quebec, é pequena e franzina, mas com umas mãos mágicas que trabalham pés e mãos e articulações com mestria, é muito raro encontrar este conhecimento profundo da massagem terapêutica, também faz chi king e terapia de trauma, e com os cavalos dóceis que nos levaram num passeio até à praia.
Um refúgio autêntico e hospitaleiro na ria de Aveiro, com design de moda e preocupação ambiental
Foto: DR
Por fim, a Tijosa tem preocupações com a sustentabilidade, e não só porque está no meio da natureza, e encostada a uma zona protegida, mas porque Paula Guerreiro quis mesmo fazer bem, e fazer para o futuro. Contrataram três empresas que os ajudaram a escolher e aprender as melhores práticas, por isso apostam na geotermia, quatro furos que aproveitam a energia da terra, e painéis solares. Está tudo ligado, das peças feitas em materiais reciclados, aos produtos bio ou artesanais da zona, vindos de hortas e cabazes. “O excesso das águas dos banhos é tratado e vai para a piscina, por isso está sempre mais dois ou três graus mais quente do que seria suposto”, explica. “E é preta, para absorver o calor". A piscina é o coração do hotel e tem um belo recorte a preto e branco com o símbolo chinês místico do yin e do yang, a base da filosofia taísta que celebra a dualidade de tudo o que existe no universo, forças opostas e complementares: o yin que é a noite, o yang que é o dia, a lua e o sol, a passividade e a atividade. Assim, é natural que o exterior e áreas comuns sejam de um grande despojamento e acolhimento, como se fosse um espaço não só de descanso, mas de meditação, o que ajuda a descansar não só o corpo, mas a mente. Do jardim com inspiração oriental, às espreguiçadeiras em madeira e à pequena esplanada, Paula explica-nos que há uma beleza da imperfeição que vai buscar ideias ao princípio japonês wabi sabi, um ideal filosófico japonês do século XVI, com bases nos ideais do budismo zen, que aprecia a simplicidade e aceita a transitoriedade e a imperfeição dos seres e das coisas. Fernando diz-nos que quiseram “construir um projeto fluído, onde até o logo é redondo, a piscina, os passadiços, nada tem arestas”.
Tijosa: luxo despojado junto à ria de Aveiro, com quartos de designers de moda
As grandes casas da moda continuam a apostar no turismo como extensão do estilo de vida que representam. Esta união resulta em praias e piscinas em cenários imersivos, num mix de moda, decoração e experiências de luxo.
Partimos rumo a Santiago de Compostela, sempre junto ao mar. Entre o caminho e o destino, deixamo-nos levar pela curiosidade, avançando por cidades, praias e bosques, numa viagem que extravasa a rota e as expectativas.