Dar a volta (de mãos dadas)
Outubro é o mês internacional de prevenção do cancro da mama. O que podem hoje esperar as mulheres que lutam contra a doença? Que não estão sozinhas, acima de tudo. E que há um depois da doença.

Em 2015, a revista Time fazia capa com a imagem de uma mulher que tapava o seio direito com uma mão. Em baixo, lia-se What if I decide to do nothing? (E se eu decidir não fazer nada?) O artigo, assinado por Siobhan O’Connor, trazia uma nova luz sobre o tema, já de si tão fracturante, abordando a perspectiva das mulheres diagnosticadas com cancro da mama em fases muito iniciais, que escolhiam não ser tratadas a fim de evitar a exposição a tratamentos tóxicos, a cirurgias desnecessárias e também ao risco de novos cancros. A comunidade médica dividiu-se, nas reacções. Um dos especialistas nacionais na matéria, João Leal de Faria, médico cirurgião do IPO Lisboa, explica porquê: "O panorama do cancro da mama mudou radicalmente no que diz respeito ao diagnóstico e tratamento.
A maior sensibilização para a doença fez com que a mulher esteja muito mais atenta, recorrendo precocemente aos serviços de saúde, logo que lhe surja alguma suspeita." Investigado exaustivamente pelos especialistas, e tal como acontece com as restantes doenças oncológicas, o cancro da mama está hoje dissecado por toda a Internet em artigos com recomendações como You Can Take Steps to Lower Your Breast Cancer Risk (Estes passos podem diminuir o risco de cancro da mama) publicado em Maio de 2017 pelo The New York Times, que destaca algumas mudanças diárias pertinentes na prevenção; ou com testemunhos de apoio, como What I’m really thinking: the woman with breast cancer (O que estou realmente a pensar: a mulher com cancro da mama) publicado em Agosto de 2017 no The Guardian.
Questionada pela revista Visão, Fátima Cardoso (investigadora da Fundação Champalimaud e responsável pelo programa de investigação do cancro da mama) revelou numa entrevista publicada em Agosto de 2016 que, apesar de existir uma taxa de sobrevivência de 70%, "não podemos dar uma imagem cor-de-rosa: que se fizerem os tratamentos, comerem bem e fizerem exercício corre tudo bem", referindo-se à abordagem dos médicos. Ainda assim, de uma forma geral, houve uma evolução nos tratamentos em Portugal, contrapõe Leal de Faria: "A evolução das várias modalidades terapêuticas, da Cirurgia à Radioterapia, passando pelas várias opções de terapêutica medicamentosa, tem permitido a obtenção de melhores resultados terapêuticos." Ainda sobre a poderosa capa da Time, comenta: "Temos assistido a alguns casos em que a mulher recusa o tratamento, felizmente poucos e cada vez mais raros. Há evidência científica que prova que o tratamento pela medicina convencional é o mais eficaz, comparativamente aos tratamentos alternativos. A simples negação da doença também não é tratamento."
Por um lado, mais prevenção e conhecimento, por outro, mais ponderação? A verdade é que hoje sabemos que existem vários tipos de cancro da mama, que há fases de progressão diferentes e que, apesar de ser tratável, é uma doença galopante. Por isso, é preciso reagir. Em Portugal, há vários projectos que se dedicam a acompanhar em paralelo uma paciente em todo o processo de tratamento. "É fundamental que entrem em acção as várias organizações de apoio", explica Faria de Almeida, para concluir: "Muito já se fez, embora haja muito ainda por fazer."
A saber

Segundo as recomendações da American Cancer Society (ACS), o rastreio mamário deve realizar-se anualmente entre os 45 e os 54 anos, de dois em dois anos depois dos 55 anos e a cada dois ou três anos a partir dos 69 anos.
O poder da maquilhagem
Joëlle Nonni é especialista de maquilhagem médica no Centro de Hidroterapia da Avène, em França. Ao longo de quase vinte anos, acumulou experiência ao trabalhar com vítimas de cancro da mama e com doentes dermatológicas. Mais do que um recurso superficial, a maquilhagem revelou-se sempre uma poderosa arma: "Temos de nos adaptar às expectativas e à própria condição da paciente, mas quando as incentivamos a usar maquilhagem nota-se uma mudança na sua atitude e na forma como é tratada pelos outros. Ainda que indirectamente, isso acaba por ter um forte impacto na sua recuperação, bem como na qualidade de vida."

6 rituais que uma mulher (em processo de recuperação) pode adoptar em casa
- Contrariar a secura da pele (decorrente dos tratamentos) através de uma limpeza delicada e com a aplicação de cremes hidratantes (rosto e corpo).
- Não esquecer de hidratar também as mãos e os pés.
- Aplicar compressas com água termal no rosto após os tratamentos.
- Fazer uma máscara hidratante uma vez por semana.
- Usar maquilhagem em tons de rosa para dar um ar saudável à pele.
- Usar um lápis para redesenhar as sobrancelhas.

É um serviço de tratamento e aconselhamento de imagem que se dedica a acompanhar as mulheres que sofrem perda de cabelo e transformações na aparência da pele, provocadas pelos tratamentos de quimioterapia ou alopécias de foro dermatológico. Mentora do projecto implementado na CUF Infante Santo, Cláudia Piloto acompanha pessoalmente todas as pacientes: "As pessoas estão sujeitas a muitas dúvidas e isso desgasta-as imenso a todos os níveis. Elas precisam de uma energia vital para se conseguirem manter motivadas durante todo o processo. Uma pessoa não tem de passar por um processo doloroso sem cabelo, sem pestanas, sem sobrancelhas. As pessoas que acompanho passam por isso tudo acompanhadas, mimadas e protegidas."
Onde? Hospital CUF Infante Santo, Lisboa. Edifício Cláudia Piloto, Piscinas do Tamariz, Estoril. Cláudia Piloto no Lúcia Piloto Cabeleireiros, Avenida 5 de Outubro, Lisboa. Como chegar? 21 464 37 90

Há mais de duas décadas que Sérgio Carvalho, tatuador e proprietário do estúdio Wildbuddhatattoo, faz tatuagens mamárias a mulheres que decidem fazer reconstrução mamária depois de perderem um ou ambos os seios no processo de tratamento de um cancro da mama. Nos últimos dois anos, e devido a uma associação feliz ao IPO, as tatuagens mamárias são mais frequentes e feitas a metade do preço de tabela. "É uma tatuagem muito emotiva. Há sempre uma história por detrás de tudo, algumas pacientes gostam de falar e contar a história, outras não falam, o que é normal."
Onde? Av. Dom Afonso Henriques, 846, Matosinhos. Como chegar? 93 644 50 25

Depois de, aos 36 anos, vencer um cancro da mama, Rita Pereira decidiu criar a B.headstyling, um projecto que nasce da sua própria história e parte da sua experiência. "Sofremos inúmeras sequelas ao longo do tratamento, mas a falta de cabelo, apesar de não ser a pior, é a mais visível. Muitas pessoas não conseguem lidar muito bem com isso. Seja de peruca, de lenço ou careca, a forma como uma mulher decide lidar com essa exposição é muito pessoal e deve ser sempre respeitada", conta. Acabou por começar a fazer acessórios para se sentir bem, mas também para fortalecer a sua relação com as filhas. "Queria peças que pudessem viver além do diagnóstico, enquanto acessórios, e que criassem também uma ponte com as minhas filhas. Comecei então a criar produtos com os mesmos padrões para elas (elásticos, fitas de cabelo, etc.). Quando percebi que não havia nenhuma marca nacional que se dedicasse exclusivamente a este nicho de mercado, achei que não fazia sentido e decidi colocar mãos à obra. Se me tinha ajudado a estar bem comigo mesma durante o processo, porque não proporcionar o mesmo a outras mulheres?"
Onde? bheadstyling.pt Como chegar? b.headstyling@gmail.com
*Artigo originalmente publicado em outubro de 2017 (Edição 349)

Dia Mundial do Cancro: o que há a saber sobre as iniciativas deste ano
É importante prevenir todo o ano, mas as datas existem para nos lembrar disso. Hoje, 4 de fevereiro, assinala-se o Dia Mundial do Cancro, um dia para ajudar, prevenir, e manter-se informada/o sobre a doença.