Desolina Suter: “O luxo já não está em conflito com a circularidade: está a reinventá-la”
A Diretora de Moda da Première Vision Paris falou com a Máxima em vésperas do início da feira de moda, que acontece entre 16 e 18 de setembro. Entre o luxo e a reutilização, a indústria vai-se reinventando através da criação de um equilíbrio que favorece todas as partes.
Desolina Suter, da Première Vision Paris, aborda sustentabilidade e inovação na moda
Foto: DR17 de setembro de 2025 às 12:43 Diego Armés
A Première Vision Paris 2025 já abriu as suas portas - de 16 a 18 de setembro, na Paris Nord Villepinte - e a Máxima foi assistir, in loco, às demonstrações, palestras, debates e experiências que a grande feira da indústria da moda tem para apresentar. Entre tecnologia e sustentabilidade, ecologia e novas tendências no luxo, há muito para descobrir nesta edição da Première Vision.
Preparando à visita ao incontornável certame da moda internacional, a Máxima conversou com Desolina Suter, Diretora de Moda da Première Vision Paris, para tomar o pulso ao que ali se pode encontrar - “organizar a Première Vision acarreta uma responsabilidade especial: a de combinar criatividade e liberdade com relevância” - e, ainda, para entender, tanto quanto possível, a sua perspetiva acerca da moda contemporânea.
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Desolina Suter da Première Vision Paris fala sobre sustentabilidade e luxo
Foto: DR
Qual é, hoje, a maior tendência dentro da indústria da moda? Temos uma equação de sustentabilidade vs. rentabilidade ou essa é uma maneira errada de olhar para a questão?
Hoje, a tendência dominante na indústria é a aliança entre sustentabilidade e rentabilidade — não como um dilema, mas como um modelo vencedor. O bem-estar e a saúde ambiental são agora inseparáveis, impulsionando inovações em fibras seguras, biotecnologia, modelos circulares e energia verde. Longe de ser uma restrição, a sustentabilidade tornou-se um padrão empresarial fundamental e uma verdadeira alavanca de competitividade, criando valor económico, social e ambiental.
Numa era em que o vintage is trending, como é que se equilibra a circularidade na moda com a necessidade de lançar mais tendências, coleções e peças?
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A moda atual enfrenta o desafio de conciliar a exclusividade circular com a ânsia por novidades, um paradoxo resumido como “acelerar na lentidão”: produzir menos, prolongar a vida útil das peças de vestuário e reduzir o impacto, ao mesmo tempo que se continua a alimentar o desejo através da inovação. O vintage e o second-hand incorporam perfeitamente esse equilíbrio, ampliando a oferta com autenticidade, acessibilidade e sustentabilidade, ao mesmo tempo que inspiram novas coleções. Modelos híbridos — revenda, aluguer, reparação ou reutilização criativa de stocks ociosos — estão a provar que a circularidade pode tanto fortalecer a desejabilidade quanto abrir novas fontes de receita.
E onde é que fica o luxo numa realidade em que se privilegia a reutilização? De que modo pode o luxo manifestar-se e coexistir com estas abordagens à moda?
O luxo já não está em conflito com a circularidade: está a reinventá-la. Da [Louis] Vuitton à Armani, as principais maisons estão a adotar o upcycling — criar algo novo a partir do antigo — e a reivindicá-lo com orgulho. Para uma clientela premium em busca de significado, peças revendidas, alugadas ou reformuladas estão a tornar-se marcadores de desejo sustentável, sem abandonar a exclusividade. Hoje, o luxo encontra o seu lugar numa realidade que prioriza a reutilização, redefinindo a exclusividade através da durabilidade, do património e do serviço. A revenda e o aluguer já não são ameaças, mas sim alavancas de desejabilidade, abrindo o acesso a novos públicos. A circularidade também se manifesta ao nível dos materiais, através da inovação e da reciclagem de alta qualidade. Ao combinar novas coleções com revenda, aluguer, reparação ou personalização certificados, o luxo transforma a reutilização num motor de crescimento complementar, preservando simultaneamente a raridade e o prestígio.
Recentemente, vários artigos em publicações da especialidade fazem referência ao regresso do conservadorismo à moda, possivelmente como resultado e/ou reflexo do crescente conservadorismo político. Reconhece esta tendência e esta sintonia entre moda e política?
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De facto, assistimos a um regresso a códigos mais clássicos e conservadores, mas reduzir a moda a um mero espelho dos humores políticos seria demasiado simplista. À medida que a SS27 [Spring-Summer/Primavera-Verão 2027] se aproxima, surgem novos desejos: um universo otimista e alegre que responde a tempos sombrios com energia disruptiva. A moda deve incorporar um impulso criativo, libertado dos padrões, capaz de abraçar identidades plurais e subversivas.
Tendências, sustentabilidade e inovação na Première Vision Paris
Foto: DR
A moda continua a ser, como o foi em vários momentos-chave do século XX, um instrumento de empoderamento feminino? Ou perdeu-se alguma coisa pelo caminho? Ou, ainda, será essa uma perspetiva iludida sobre o assunto?
Hoje, a emancipação já não é exclusivamente feminina: a moda tornou-se um veículo de identidade para todos os géneros. Outrora libertadora — desde a rejeição do espartilho até à rebelde minissaia —, continua a inspirar revoltas silenciosas e autoafirmação. Como nos lembra o historiador Denis Bruna, o vestuário nunca é trivial: é um código social que acaba sempre por se inverter — revelando tanto o seu papel emancipatório como as suas contradições.
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Sendo França um país de referência no que respeita à conquista de direitos e liberdades, sente uma responsabilidade acrescida ao fazer a curadoria de um evento tão importante como a Première Vision?
Sim, organizar a Première Vision acarreta uma responsabilidade especial: a de combinar criatividade e liberdade com relevância. O nosso dever — e a nossa paixão — é oferecer um evento que una beleza, criatividade, inovação têxtil, ética e abertura ao mundo.
Haverá marcas e representantes portugueses no evento? Como é que vê a realidade portuguesa a nível da sustentabilidade na moda?
Sim, mais de 40 empresas portuguesas vão participar na Première Vision Paris na próxima semana. As empresas portuguesas estão fortemente empenhadas em integrar a sustentabilidade na moda — tanto por ambição como por capacidade. Portugal é o único país da Europa Ocidental com um cluster de moda tão integrado, permitindo o desenvolvimento e a produção locais em toda a cadeia de valor, desde o fio (ou couro) até ao produto acabado. Esta é uma alavanca crucial para garantir a rastreabilidade e reduzir o impacto carbónico. Muitos fabricantes portugueses também estão a investir em energias renováveis e instalações de tratamento de água. Todas as etapas de produção cumprem — e muitas vezes excedem — as regulamentações atuais. Além disso, as empresas podem contar com o CITEVE para certificação e apoio à inovação. Juntos, esses fatores consolidaram a reputação de Portugal em termos de seriedade e confiabilidade no avanço da moda sustentável.
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Por fim, a Inteligência Artificial e a Moda: poderão ser parceiras e construir uma relação simbiótica? Como vê o potencial dessa relação?
Sim. A inteligência artificial está prestes a tornar-se uma aliada visionária da moda, não a sua substituta. Ela não substitui a criatividade humana, mas amplifica-a — refinando processos, otimizando todas as etapas, desde o design até a distribuição, apoiando coleções que são mais criativas e inclusivas. A inclusão torna-se um elemento integrado, em vez de uma opção de marketing. Ao expandir as fronteiras do desejo e da identidade, a IA acompanha essa evolução: possibilitando roupas personalizadas, experiências virtuais imersivas e múltiplas identidades para explorar. Isso marca a mudança do desejo de posse para o desejo de expressão.
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