Vendido!
Um, dois, três Os martelos das leiloeiras têm batido sem parar por joias extraordinárias que superam recordes, dão lições de solidariedade e acrescentam capítulos às suas já lendárias histórias.

A tiara Poltimore foi criada pela casa joalheira Garrards em 1870 para o barão Poltimore, mas talvez nos lembremos melhor dela por ter sido a tiara que a princesa Margarida de Inglaterra usou no seu casamento, em maio de 1960. Esta joia acabou por chegar ao guarda-joias da irmã da rainha Isabel II e, em junho de 2006, foi uma das estrelas de um leilão da Christie’s, que vendeu parte do património da princesa. Qual a probabilidade de uma pessoa comum ter uma joia que pertenceu à realeza e ainda por cima uma tiara? Só através de um leilão. Já em 1987 uma coleção de joias com um toque de glamour real deu origem a um badalado leilão. As peças de Wallis Simpson, Duquesa de Windsor, fizeram o martelo da leiloeira Sotheby’s bater até a coleção ultrapassar mais de sete vezes o valor inicialmente estimado. Em 2010, algumas destas peças voltaram a leilão no que parece ter sido o início de uma época única e bem recheada no que toca a leilões de joias. Nos últimos anos, temos visto as mais excecionais peças fazerem notícia e baterem recordes de valor. Porquê?
Juntos por uma causa

No passado mês de maio, o leilão Magnificent & Noble Jewels, da Sotheby’s, em Genebra, contou com 23 peças de joalharia da coleção de Gina Lollobrigida. Depois de ter fechado 2012 como o seu ano de maior sucesso na área da joalharia, a casa leiloeira fundada por Samuel Baker em 1744, que começou esta atividade com a venda da biblioteca de Sir John Stanley, volta a dar que falar este ano pelos mais preciosos motivos. A diva do cinema italiano, que brilhou nas décadas de 50 e 60, decidiu colocar as suas famosas joias ao serviço de uma boa causa. O valor alcançado excedeu as expectativas, chegando quase aos 4 milhões de euros, e destina-se à pesquisa de células-tronco, um tipo de tratamento que não está disponível em Itália. Também Lily Safra optou por vender as suas joias em nome da solidariedade. O leilão Jewels for Hope: The Collection of Mrs. Lily Safra teve lugar em Genebra em maio de 2012 e, mais uma vez, a venda correu tão bem que a lista inicial de 20 instituições escolhidas para beneficiar dos lucros aumentou para 32. Lily Safra é uma filantropa brasileira que guarda o apelido do quarto marido e uma vida que até podia tê-la tornado uma das divas socialites do século XX. Talvez por isso a sua coleção de joias seja tão extraordinária. Um dos fatores que tornou este leilão tão especial foi a presença da maior coleção pessoal de peças de Joel Arthur Rosenthal (JAR, como ficou mais conhecido), neste caso 18, entre os 70 lotes para licitação. JAR é um joalheiro que nasceu em Nova Iorque, mas trabalha em Paris e leva a discrição do seu trabalho quase ao secretismo. O pequeno espaço nos arredores da Place Vendôme quase passa despercebido numa zona onde as casas joalheiras optam por exuberantes montras. A excelência e o rigor do trabalho, assim como uma capacidade única para o uso da cor das pedras preciosas, são motivos que justificam uma recheada lista de clientes. Não é portanto de estranhar a presença de joias JAR nestes leilões de coleções de joias emblemáticas, ao lado de peças Cartier, Bulgari, Tiffany, Van Cleef & Arpels, entre tantas outras que, além de joias, também produzem sonhos.
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Licitações históricas
Embora o mercado tenha andado especialmente agitado nos últimos tempos, há muito que os leilões fazem movimentar as mais extraordinárias joias. Os amantes destas peças estão atentos e não deixam passar a oportunidade. Foi assim que o casal Calvin Klein comprou um colar de pérolas Cartier, da Duquesa de Windsor, por mais de 500 mil euros no leilão de 1987 e foi também assim que Richard Burton adquiriu duas das mais famosas peças que ofereceu a Elizabeth Taylor. O diamante Krupp, que acabou mesmo por ser batizado com o nome da atriz, e a pérola La Peregrina. Desde que foi descoberta no início do século XVI no golfo do Panamá, passou pela corte de Felipe II de Espanha e chegou mesmo a ser pintada por Velásquez, até Richard Burton fazer a oferta mais elevada por ela num leilão, em 1969. E estas são apenas duas das peças da mítica coleção da diva que fizeram sensação num dos leilões mais badalados dos últimos tempos (ou mesmo de sempre!). Elizabeth Taylor falou desta paixão no livro My Love Affair with Jewels, onde afirmou: “Eu sinto que, contudo, sou apenas a guardiã das minhas joias. Quando eu morrer e elas forem leiloadas, espero que quem as comprar lhes dê um lar verdadeiramente bom.” Depois de falecer, em março de 2011, o seu desejo foi cumprido. O leilão The Collection of Elizabeth Taylor: The Legendary Jewels, que reuniu não só joias lendárias como também muita moda e um enorme e variado espólio, ficou a cargo da Christie’s. Como só acontece com alguns leilões mais privilegiados e glamorosos, este realizou-se à noite, nos dias 13 e 14 de dezembro, mas o frio do inverno nova-iorquino não se fez sentir: ao fim da primeira noite já a coleção de joalharia tinha batido sete recordes mundiais. Desde a venda das joias de Madame du Barry, a amante do rei Luís XV de França, em 1795, que ficou provado que, nesta área, a Christie’s está habituada a grandes leilões. Com quase 250 anos de existência, a casa leiloeira fundada por James Christie continua a ser uma referência em várias áreas englobadas em cerca de 450 vendas por ano.
Façam as vossas apostas!
Nos bastidores das mais prestigiadas leiloeiras, cruzam-se coleções de joias de celebridades, de famílias que preferem manter o anonimato e, como já vimos, até da realeza. Mais do que joias, estas peças têm uma história e é isso que torna os leilões diferentes do ato de comprar uma peça na loja. Num artigo publicado em 2010 na revista How to spend it, do Financial Times, uma pequena passagem dá uma grande ajuda para percebermos um pouco melhor a matemática por trás destes leilões. Segundo o artigo Aristocratic Jewellery, “a fórmula para avaliar tal joalharia é os quatro cês mais um pê – isto é: cor, claridade, corte e carate, depois acrescenta-se um extra para a proveniência”, citando François Curiel, na altura presidente da Christie’s Ásia e responsável pelo departamento de joalharia.
As leiloeiras até assumem o papel de museu e expõem ao público coleções de sonho dias antes do leilão, satisfazendo a curiosidade e, quem sabe, atraindo possíveis compradores. Porque na verdade o leque de pessoas atentas a estes eventos é cada vez mais vasto. Sentadas nas salas com uma placa em punho, ao telefone ou online, os seguidores incluem colecionadores, as próprias casas de joalharia que aproveitam para enriquecer os seus arquivos e também pessoas simplesmente apaixonadas por joias que procuram peças para usar. No cinema, já vimos o agente James Bond licitar por um ovo Fabergé, em Operação Tentáculo (1983), assim como uma das quatro amigas do primeiro filme da série Sexo e a Cidade (2008) a lutar ferozmente por um anel de diamantes. Nestes leilões, por vezes, o ambiente glamoroso contrasta com o sentimento de nostalgia. E se, por um lado, há coleções únicas que se separam para diferentes partes do mundo, também há a certeza de que só um verdadeiro apaixonado faria as elevadas ofertas que se têm testemunhado. Se lhe despertámos, pelo menos, um pouco de curiosidade, então aqui fica uma sugestão para o evento mais brilhante deste outono: no próximo dia 7 de outubro, o Hong Kong Magnificent Jewels and Jadeite Autumn Sale 2013 celebra o 40.º aniversário da Sotheby’s na Ásia e promete dar que falar.
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DISCURSO DIRECTO
Maria Doulton é a fundadora do site TheJewelleryEditor.com. Neste espaço, dão-se a conhecer as últimas novidades do mundo da joalharia e da relojoaria, os leilões de joias e, claro, as peças. Falámos com ela.
Quais são os fatores para se avaliar uma joia que vai a leilão?
Cada casa leiloeira tem avaliadores que determinam o valor que é provável uma joia alcançar. As estimativas para leilão são livres e, em muitos casos, o avaliador sugere que as joias entrem no leilão seguinte. No entanto, também é possível que aconselhem a esperar um ano até o mercado ser mais recetivo a um determinado estilo de joalharia. As melhores joias entram nas vendas de maio e novembro, em Genebra, onde o mercado para estas peças de elevado valor é muito forte.
Qual é a relevância da história que acompanha uma joia?
A proveniência da joia é muito importante e valorizadora também. Se pensarmos nos preços alcançados pelas joias de Elizabeth Taylor, algumas delas bateram 10 vezes o valor estimado. São o exemplo de como uma joia com história tem muito mais valor do que uma joia sem história. Antes, este estatuto estava limitado a joias de proveniência real: lembremo-nos da Tiffany & Co comprar as joias da coroa francesa no início do século passado e terem feito grande publicidade ao facto e às pedras importantes. Hoje, a cultura de celebridades permite um leque muito mais vasto.
O que é que torna um leilão uma boa opção?
Quem quiser (vender por) um bom preço, o leilão é a forma de eleição porque as peças estão expostas a um mercado muito vasto que inclui colecionadores privados e negociantes de todo o mundo. Se uma peça não alcançar o preço-base, o dono pode recolhê-la e isso funciona como uma rede de segurança.
Qual é o maior “achado”dos últimos tempos?
Um verdadeiro “achado” será aquela joia que mais ninguém viu, logo é possível tê-la por um bom preço. As joias muito importantes que têm muitos licitadores podem parecer mais excitantes, mas eu acho que as descobertas mais discretas são as melhores e é por isso que vale a pena estudar o catálogo dos leilões com muita atenção.
