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Moda

Qual o segredo para o sucesso da Gandaia? "Não nos levamos muito a sério", explicam os fundadores

Mais do que uma marca, expressa-se numa comunidade que se estende das personalidades de Vera Caldeira e Pedro Ferraz, para quem os clientes são como amigos. "Juntar a malta aqui de Lisboa nas festas é uma coisa que fazemos porque gostamos, não é marketing. E as pessoas sentem isso."

05 de maio de 2025 às 14:52 Maria Salgueiro / Com Rosário Mello e Castro

Vera Caldeira e Pedro Ferraz estão mais crescidos — afinal, quando lançaram a Mustique ainda estavam na casa dos vinte. Sete anos depois, olham para tudo o que construíram e percebem que as coisas foram sempre acontecendo de forma orgânica, como se a marca fosse uma extensão das suas personalidades, do modo como levam a vida. De Mustique passou a Gandaia, e é com este rebranding que se preparam agora para chegar a novos destinos, sempre com o coração a bater em Lisboa. A nova coleção, mais madura, mas sempre colorida, representa o nosso sol, o nosso mar, a nossa cultura gastronómica. "Gandaia é um estado de lazer descomprometido e despreocupado, uma busca pela diversão", explicam sobre o novo nome. A primeira coleção já está disponível na loja online e nas duas lojas físicas da marca, em Santos e São Bento, em Lisboa. A Máxima foi falar com os fundadores para saber mais sobre esta mudança.

A primeira inspiração que tiveram para criar a Mustique foi o block printing numa viagem à Ásia.

Pedro  Exatamente. O block printing é um tipo de impressão de padrões manual, muito típico da Índia. É um bloco de madeira, basicamente, que tem o padrão por baixo, e vai-se estampando o bloco ao longo do tecido. Transforma-se num padrão geral que se vai construindo.

Vera — É como se fosse um carimbo grande que fica nos tecidos. Misturam-se várias cores com várias camadas para criar padrões coloridos e até com bastante detalhe. É engraçado.

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Já foram nessa viagem com a ideia de lançarem uma marca juntos?

Pedro — Nós estávamos a viajar no sudeste asiático. Foi lá que tivemos a ideia e começámos a falar sobre andar com isto para a frente. Quando fomos para a Índia já tínhamos uma ideia do que queríamos fazer, t-shirts e camisas. Fomos diretamente para Jaipur, porque houve uma francesa na Tailândia que nos disse, "Ah, para o que vocês querem fazer, deviam ir a Jaipur, vão encontrar imensas soluções, atirem-se para lá". E nós atirámo-nos para lá, os dois um bocado sem saber para onde íamos, nunca tínhamos lá ido, mas já tínhamos bastante fixa a ideia de que queríamos começar uma marca de roupa e de que lá íamos ter N soluções para pôr as nossas ideias em prática e torná-las reais. E, de facto, comprovou-se. Aquilo é um mundo onde há soluções para tudo e mais qualquer coisa. Foi assim que começou.

Vera — Foi em 2017. Antes do verão. Achávamos que daí a poucos meses íamos conseguir lançar a marca, mas depois atrasámo-nos um ano.

Na altura em que lançaram, a produção era feita na Índia?

Pedro e Vera— Sim.

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Foi desafiante estarem tão longe da produção?

Vera — Sim. Ou seja, nós estivemos lá presencialmente durante mais ou menos um mês a planear tudo, a fazer as amostras e a acertar os detalhes. E depois arrancava a produção e nós voltámos para cá. Enquanto a produção acontecia, não estávamos lá. E sim, isso era desafiante, porque é complicado estarmos a trabalhar com pessoas de outro país, de outra cultura, com outra forma de trabalhar. Tudo é diferente. Gerir isso, e ainda mais à distância, era um desafio.

Pedro — Grande desafio!

Vera — Mas também fez parte do processo e da viagem de começar esta marca. Aprendemos imenso com isso e deu-nos muitas coisas boas. Se não tivesse sido na Índia, nós não teríamos conseguido lançar ou começar a marca. Porque é muito mais barato fazer as coisas lá. Só uns anos mais tarde é que conseguimos mudar tudo para Portugal. Já tendo tido dois anos de marca, de sucesso e de andamento.

Pedro — A experiência de produção na Índia comprovou-nos que podíamos dar esse passo para produzir em Portugal, que ia resultar, que não ia ser um passo em vão. E também fomos um bocadinho obrigados a fazer esta mudança por causa do Covid, porque deixávamos de poder viajar. Só o facto de não podermos ir lá já era um red flag gigante. Já era tão complicado quando podíamos passar lá períodos de mês e meio que, se não fossemos lá, ia sair tudo ao contrário. Então, foi um bocadinho também por causa disso que mudámos a produção para cá. E ainda bem que o fizemos, porque é uma coisa que nos representa muito. Faz parte da marca, as pessoas adoram o Made in Portugal. Vimos uma diferença abismal na qualidade. E também trouxe soluções de printing e de padrões para as peças que quisermos produzir. Porque produzir cá, em Portugal, e estar muito mais perto da produção, também fez crescer.

Não estarem tão em contacto com a produção limitava-vos, de alguma maneira?

Vera — Sim, tudo demorava mais tempo, o processo era todo muito mais mais denso.

Passados mais ou menos dois anos de lançarem a marca, decidiram abrir uma loja em plena pandemia. Falem-me sobre isso.

Vera  A pandemia aconteceu e aconteceram duas coisas. Primeiro, ficaram muitas lojas vagas em Lisboa, porque muitos negócios de rua começaram a fechar, o que fez com que houvesse mais oferta de lojas numa altura em que o mercado estava meio instável, portanto, a preços bastante acessíveis. E segundo, durante e por causa da pandemia, achamos nós, tivemos um boom muito grande nas encomendas online. E então deixámos de conseguir dar vazão e de conseguir gerir tudo de casa. Precisámos mesmo de um sítio físico onde podíamos estar, para termos como armazém. Ou seja, quando alugámos a primeira loja durante a pandemia, até foi um bocadinho numa de arranjar uma solução para termos um sítio onde pôr o stock e darmos resposta às encomendas online. E que, já agora, depois viria a ser a loja. Mas sim, quando alugámos a loja, estivemos ainda alguns meses sem abrir.

Pedro  Sim, sim, sim, uns seis meses.

Foto: Luísa Bravo

Agora têm esta loja em Santos, mas a primeira que abriu foi a de São Bento.

Vera  Exato. Foi essa a tal primeira, que usávamos para fazer as encomendas online. Correu muito bem. E, por ter corrido tão bem, dois anos depois abrimos também em Santos.

Há alguma diferença entre os dois espaços no que toca a posicionamento, coleções?

Vera — Não, agora estão muito alinhadas em tudo. A decoração, a arquitetura, a coleção. Portanto, são duas flagship stores.

Pedro — Têm sempre as mesmas peças. Não há nenhuma peça exclusiva que esteja só nesta loja ou na outra. É tudo bastante uniforme.

Como é que são feitos os designs? São vocês que desenham tudo?

Vera — Somos. Temos uma equipa, a nossa equipa de design, que desenha todas as nossas coleções.

E parte tudo de vocês os dois? Acompanham o processo criativo sempre?

Vera — Sim, sim, sim. Nós somos uma equipa de cinco pessoas, contando connosco, a trabalhar no escritório. Três que trabalham mais em operações, gestão e logística, e duas que trabalham mais na parte criativa e direção de arte. O Pedro trata mais da parte de gestão da empresa e eu trato mais da parte da direção de arte. Tenho o Gustavo, que trabalha comigo, que é o nosso head designer. O Pedro tem a Duda e a Constança na equipa dele. Por semos muito poucos e ser uma equipa muito pequena, trabalhamos todos muito de perto.

A Vera seria então a diretora criativa e o Pedro o CEO?

Pedro — Gestor, CEO, exato.

Apresentaram uma coleção na ModaLisboa em março de 2023, um destaque bastante especial para uma marca de pronto-a-vestir. Falem-me sobre essa experiência.

Pedro  Tivemos uma reunião com a Mod Lisboa e eles convidaram-nos, disseram que gostavam muito que fizéssemos uma apresentação. Foi um bocadinho fora da caixa, não é muito comum uma marca como a nossa estar na ModaLisboa, mas acho que eles sabem que temos bastante público e que há muitas pessoas em Portugal que gostam de nós e que são nossas clientes. E aproveitámos para mostrar um bocadinho a nossa identidade, em vez de fazer um catwalk. Queríamos mostrar a roupa, mas também fizemos um set, uma instalação de cogumelos. Correu super bem e as pessoas adoraram. Depois, tivemos aquela dinâmica de os modelos estarem com um carrinho, a dar gelados às pessoas que estavam a ver.

Foto:

Vocês não se levam demasiado a sério.

(Risos) Vera e Pedro — Exatamente.

A mudança de Mustique para Gandaia também partiu de quererem internacionalizar a marca, de já haver essa procura. E com o nome Mustique não iam conseguir fazer isso?

Pedro — Nós tentámos registar a Mustique na Ásia porque tínhamos um distribuidor que queria trabalhar connosco para pôr a marca na Coreia do Sul e no Japão, em B2B, ou seja, wholesale para lojas multimarca. E o interesse partiu dessa empresa de distribuição, que trabalha com muitas lojas pela Ásia, portanto ia ser um passo muito grande para nós. É um dos nossos grandes objetivos, crescer na revenda. Quando tentámos registar na Ásia, recebemos a informação de que não ia dar, porque já havia uma empresa com o trademark da palavra Mustique. Percebemos que íamos ter de dar aqui uma grande reviravolta. Aproveitámos este balanço para fazer o rebranding todo, e foi aí que iniciámos o processo de mudança de nome, de identidade, em que já começámos a trabalhar há dois anos.

Vera  No fundo, para conseguirmos agora tomar este próximo passo, onde queremos investir muito, e conseguirmos fazer a coisa bem feita, com a marca registada no mundo inteiro para não termos outra vez este impasse.

Pedro — Por essa razão, este negócio na Ásia não andou para a frente. E nós dissemos: bem, calma, vamos ter que redefinir isto tudo para fazer isto bem e bem feito. Para a escala que queremos alcançar, isto tem de estar tudo registado. Foi pena isto não ter andado para a frente. Vamos tentar retomar esse business model. Agora, já sabemos que tudo vai correr bem com o nome (risos).

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Já estavam a pensar no rebranding antes disto?

Pedro  Não, nós pensámos no rebranding depois. Quando percebemos mesmo que íamos ter que mudar. E foi aí que decidimos aproveitar o balanço para fazer um rebranding e para fazer a marca crescer, para dar aqui um spice up. Parece que estamos a lançar uma marca nova quase.

É isso que sentem?

Pedro — Sim, sim, sim. Sinto um bocado aquele bichinho que senti no início da Mustique. Parece uma novidade. É giro ter esta sensação de estamos a fazer uma coisa nova e de não sabermos como é que as pessoas vão reagir. E era o que sentíamos no início da Mustique.

Há poucas marcas em Portugal que têm a projeção, a cultura própria, que geram o interesse que existe à volta da — agora — Gandaia. Qual é que acham que é a vossa poção mágica?

Pedro  Acho que tem muito que ver com o facto de sermos leves e de não nos levarmos muito a sério, de termos criado uma comunidade à nossa volta e de investirmos nisso. Fazemos festas, interagimos bastante com as pessoas, com os nossos clientes. Criamos, sei lá, desde giveaways, a convites para virem à loja, fizemos uma festa no Mirari. Temos aqui uma grande comunidade à nossa volta, mas sempre com leveza.

Vera  Sim, foi de uma forma orgânica.

Pedro  De uma forma orgânica porque parece que os clientes são nossos amigos e isso faz com que as pessoas fiquem excitadas para fazer parte do que nós criamos. E também acho que o design, as cores e os padrões, que sempre foram um ponto forte das nossas coleções, fazem com que as pessoas fiquem agarradas, interessadas. Isso vem muito do nosso gosto, e acho que isso também agarrou as pessoas. E ainda bem que gostam do nosso gosto e da maneira como gostamos de comunicar. E arriscámos, também, sempre arriscámos um bocado. Isso também faz com que as pessoas fiquem, tipo: "Ai, quero, gosto".

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Para quem vos ouve, parece que a marca é como se fosse uma extensão de quem vocês são na vossa vida.

Vera  Sim, sim, sim. Acho que é isso. Acho que a marca representa, no fundo, as coisas de que nós gostamos. É uma reflexão disso, as pessoas sentem isso. E nós fazemos as coisas por gosto. E isso tudo que o Pedro estava a dizer, juntar a malta aqui de Lisboa nas festas, é uma coisa que fazemos, não porque temos de o fazer pela marca, mas porque gostamos, e as pessoas sentem isso. É assim que tudo acontece de forma orgânica e natural. Não é um marketing forçado. É mesmo, tipo, estarmos só a juntar as pessoas, porque é uma coisa que gostamos de fazer, de qualquer forma, na nossa vida pessoal. Juntar isso à marca faz com que a marca tenha quase uma vida própria, não é? E que as pessoas sintam uma empatia com isso porque é natural, porque é orgânico. Sentem essa proximidade.

Pedro  Outra coisa que sempre fizemos — e que as pessoas adoraram — foi o investimento e foco na imagem da marca. Ou seja, sempre nos preocupámos muito em contratar bons modelos, bons fotógrafos, ter ideias fora da caixa para os shoots. Isso também fez com que as pessoas vissem que temos essa preocupação, essa atenção ao detalhe, o querer fazer sempre melhor, mais, algo que ainda não foi visto. Os clientes também se interessam por isso. E foi sempre um grande foco nosso. Esse também foi um grande fator, e continua a ser. É uma coisa com que nos preocupamos muito, aquilo que mandamos cá para fora.

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