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Beleza / Wellness

Como fiz (mais ou menos) as pazes com as minhas olheiras

A jornalista Patrícia Domingues reflete sobre a sua relação de altos e baixos com esta condição mal-amada.

Foto: Pexels
07 de junho de 2024 às 16:35 Patrícia Domingues

Nem cinco minutos passaram desde que me sentei à frente do computador comprometida em descrever o meu processo de aceitação das minhas olheiras e a frase que deveria começar este artigo continua encravada. Claramente quando propus este tema estava num dia de elevada autoestima, o que não acontece hoje, agora, em que, recém-chegada da praia, a pele bronzeada, hidratada e com aquele tom de verão a gritar SAÚDE, o meu pensamento frente ao espelho foi exatamente: 'se ao menos não tivesse estas olheiras'.

Nasci cansada, ou com o que a sociedade associa a uma noite mal dormida. Debaixo daqueles pequeninos olhos de bebé que ainda mal tinham visto o mundo, no dia 27 de setembro pelas 14h nasciam também duas tiras escuras a acompanhá-los. Talvez tenha desde a barriga uma tal sede de conhecer tudo e todos que não preguei olho durante a minha gestação. Talvez o ascendente em capricórnio obstinado tenha começado logo ali a tarefa árdua de world domination. Pouca explicação lógica há para ter nascido com o que considerei desde cedo uma maldição.

Uma breve pesquisa no Google com o simples assunto 'olheiras' mostra que as olheiras não são bem-vindas – todos os artigos começam ou terminam inevitavelmente com dicas sobre como 'melhorá-las', 'disfarçá-las' ou 'apagá-las' (boa sorte). Mas na minha era adolescente pré-internet pouco precisei do www para perceber que significavam um problema. O meu primeiro investimento em maquilhagem foi um corretor de olheiras, um dos três itens que proclamei durante anos que levaria certamente para uma ilha deserta. Tentei gelo, máscaras, rolos de jade, pepino, Foreo, peelings e ácido hialurónico, e ainda me lembro da cara da médica quando o resultado foi da 'água para water' (‘de certeza que não quer fazer umas análises?’).

Por mais que durma ou não durma, hidrate ou não hidrate, a única certeza que tenho na vida é que elas vão estar sempre cá. Ri-me de todas as vezes que ouvi alguém com uma pequena mancha um pouco mais escura dizer que tem olheiras – oh, vocês sabem lá. Pelo contrário, nunca achei piada nenhuma quando querem convencer-me de que me dão 'charme'. Que raio de mania é esta de tentar mascarar algo que todas usam cremes para não ter com um elogio de personalidade forçado? Mais resistentes do que as skinny jeans, em 35 anos as minhas olheiras não tinham forma de desaparecer e, por isso, mais do que aceitá-las ou vencê-las não tive qualquer hipótese senão juntar-me a elas.

Em 2021 as olheiras viveram um 'momento': no TikTok, várias influencers adicionavam círculos negros nas pálpebras inferiores para as forçar. Em 2022, as passerelles decidiram banir os corretores e deixar os olhos ao natural. Engraçado analisar a narrativa: na Dior, Maria Grazia Chiuri queria representar um futuro em que as mulheres comandavam o mundo – seriam as olheiras um ato de libertação ou o cansaço da tarefa de mandar em tudo? Na Chloé, as guidelines da maquilhagem era 'crua, dura e forte' numa tentativa de tornar os modelos cool. Nessa mesma estação, a modelo francesa Helene Diap dizia à Vogue Brasil que não passava corretor porque aceitava 'estar cansada': "deixar as olheiras aparecerem é como um sinal social gentil para 'me deixar em paz'". Tão rápido quanto o hype surgiu também se foi, mas – adivinharam – as minhas olheiras intemporais continuaram por cá.

Sem qualquer tipo de intenção de estilo por detrás, as olheiras – pelo menos as minhas – são genéticas (e já está mais do que na hora de deixarmos de associar características naturais do ser humano a tendências, ok?). As minhas olheiras não vieram ao mundo para serem aceites, nem pela indústria da Moda nem por mim. Elas simplesmente vieram: e, querem saber, nunca me impediram de nada. Talvez me tenha precipitado ao incitar um texto em que as deveria elogiar – não as amo, não as acho a coisa mais incrível do mundo, mas se há coisa que a terapia e a idade nos ensinam é que não há nada que seja perfeito e está tudo bem com isso. Ter ou não ter olheiras não faz de mim mais ou menos carismática, atraente ou sedutora. Faz apenas de mim quem eu sou. Btw, se for para levar algo para uma ilha deserta que sejam ferramentas para conseguirmos manter-nos vivas por lá (e se houver espaço para apenas UM produto de beleza por favor, por favor, que seja protetor solar).

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