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Trabalho, família, trânsito, saúde, dinheiro. São os principais responsáveis pela mais conhecida doença dos tempos modernos. Saiba como lidar com as ansiedades do dia a dia, recorrendo a estratégias comportamentais e mudanças de hábitos.
27 de janeiro de 2017 às 07:00 Máxima
"Estarei segura neste emprego?", "Serei capaz de completar todas as minhas tarefas?", "Em que escola vou inscrever os meus filhos?", "Quem devo convidar para a festa?", "Chegarei a tempo com este trânsito?", "Como vou conseguir ter dinheiro suficiente?" "Estará tudo bem com a saúde dos meus pais?", "Porque é que a dieta não está a resultar?", "Será que o meu companheiro continua a gostar de mim?"
Preocupações relacionadas com a família, profissão, relação amorosa, amigos e obrigações sociais vão surgindo amiúde nas nossas vidas, acabando por dominar corpo e mente. Passamos a sofrer de uma doença que já é considerada como o grande mal do século XXI. Em Portugal, um terço da população sofre de ansiedade ou depressão, tendo-se registado um aumento crescente no escalão dos mais novos e dos homens. Uma epidemia global: é assim que a Organização Mundial de Saúde reconhece o stress, que, de acordo com esta instituição, atinge cerca de 90% da população mundial. Isa Silvestre, psicóloga clínica e autora do livro Gerir 1 Ano de Stress, descreve-o como "uma reação natural do organismo perante uma situação inesperada, de especial tensão ou de intensa emoção, que pode ocorrer em qualquer pessoa, independentemente da idade, raça, sexo ou situação socioeconómica".
Embora cada um de nós tenha uma forma própria de reagir a determinados acontecimentos causadores de stress, este manifesta-se normalmente através de sintomas fisiológicos e comportamentais que podem interferir e afetar negativamente a vida quotidiana. Quanto aos primeiros, estudos científicos têm vindo a demonstrar que pessoas stressadas tendem a desenvolver problemas de saúde, desde simples dores de cabeça, cansaço, falta ou excesso de apetite, sonolência e tensão muscular a doenças cardíacas, mudanças hormonais e até infertilidade. A nível comportamental e cognitivo, verifica-se dificuldade em cumprir responsabilidades e tomar decisões, adiamento sucessivo de tarefas, falta de memória e concentração, baixa autoestima, inquietação e isolamento. Já em termos emocionais, pode haver manifestações de choro, irritabilidade, nervosismo, apatia, tristeza e, quando a preocupação e ansiedade apresentam um grau de intensidade muito elevado, ataques de pânico e depressão.
As exigências do dia a dia e muitos outros acontecimentos externos tornam-nos vulneráveis a sentir stress, mas aquilo que nos distingue é a forma como lidamos com ele. Com certeza já pensou inúmeras vezes como é possível que aquela pessoa se mantenha tão calma, enquanto você se sente impotente perante as contrariedades e obstáculos. E quanto mais pensa, pior é. Isa Silvestre reconhece a influência das características individuais de cada um: "A forma como reconhecemos, lidamos e gerimos o nosso próprio stress tem um caráter específico, individual e particular em nós. Ou seja, depende da nossa estrutura de personalidade, das nossas expectativas, desejos e objetivos pessoais." Assim, quem almeja a perfeição em tudo o que faz e sofre por antecipação "tem tendência para apresentar maior dificuldade em lidar com situações inesperadas ou sem aviso prévio". Por outro lado, há sempre os que encaram os tais momentos stressantes como desafios, ultrapassando-os com sucesso. É por isso que o stress também pode ser positivo. Como? Para já, no sentido em que há situações entusiasmantes que nos podem stressar (estar grávida, ganhar a lotaria, etc.), e depois quando o stress ainda está numa fase inicial e "o organismo produz adrenalina que dá motivação e energia, aumentando a nossa criatividade para resolvermos os problemas". Pode acontecer, por exemplo, numa situação de desemprego, em que se toma uma atitude empreendedora e proativa. A diferença para o stress negativo é a sua duração no tempo – quando esta é longa, a pessoa ultrapassa a sua capacidade de adaptação, esgotando corpo e mente.
"Todos nós temos os nossos limites, que são diferentes de pessoa para pessoa. É importante procurarmos acompanhamento psicológico ou psicoterapia quando sentimos que os efeitos do stress estão a ter consequências no nosso humor, sono e, de forma geral, nas atividades do dia a dia."
Para Isa Silvestre, "o que acontece, na maioria das vezes, é que investimos muita energia numa determinada dimensão da vida (profissional, por exemplo) em detrimento de outros aspetos", o que "acaba por prejudicar a qualidade de vida e o bem-estar individual". Foi o que confirmou um estudo recente desenvolvido pela AESE – Business School, segundo o qual os portugueses trabalham cada vez mais horas, colocando em risco as relações familiares e a saúde, aumentando a hipertensão, as doenças cardiovasculares ou a diabetes, mas também os casos de depressão, ansiedade e insónia. Ouvido pela Agência Lusa, Pedro Afonso, professor de psiquiatria daquela Escola de Negócios, revela: "Parece ser um fenómeno cultural português e em todas as profissões. De tal maneira que quem não fica mais horas a trabalhar é censurado, quer pelos seus pares quer pelas chefias." A crise, o medo de ficar desempregado e a falta de tempo para outras atividades explicam por que razão o stress veio ocupar um lugar preponderante nas nossas vidas. Mas a pressão social não se fica por aqui.
Numa época como esta, preenchida de eventos festivos como o Natal ou a Passagem de Ano, era suposto vivermos momentos de paz, harmonia e diversão. Muitas vezes, porém, não é isso que se verifica e Isa Silvestre culpa o excesso de afazeres e compromissos. "De acordo com a data, temos de implicar mais ou menos tempo na organização; variam os custos financeiros, o número de pessoas envolvidas, as expectativas e as ideias criadas em torno do dia. Os convidados também influenciam os preparativos, bem como o ambiente relacional entre os elementos familiares." No seu livro, a psicóloga explica como estes acontecimentos podem ser importantes rituais simbólicos que têm como função abrir e fechar ciclos, "tanto para as crises e para os problemas ou dificuldades da vida que terminam como para os projetos e sonhos que ficaram estagnados e que precisam de ser atualizados". O novo ano traz sempre com ele o desejo de mudança e recomeço. Colocam-se então as habituais resoluções, que "ajudam a definir prioridades na nossa vida e, desde que flexíveis e bem definidas, podem ser úteis na tomada de decisões e organização do estilo de vida". Mas é comum que, com o passar do tempo, chegue a frustração e o stress por não as termos conseguido cumprir. E é precisamente para evitar isso que Isa Silvestre aconselha a traçar um plano realista baseado no autoconhecimento, embora não apenas no fim do ano. E se, por um lado, os rituais ou rotinas podem ser motivos de stress, por outro também ajudam a combatê-lo. Apesar de ser costume associar a palavra rotina à estagnação e resignação, muitos estudos sobre gestão de tempo e produtividade reforçam o seu papel positivo, responsável pela criação de uma ordem no caos. "Ao invés de ficarmos preocupados com o que devemos fazer em seguida, a rotina contribui para que saibamos intuitivamente o que precisa de ser feito e faz com que permaneçamos orientados."
Posto isto, e partindo do princípio de que é quase impossível eliminar completamente o stress das nossas vidas, importa então identificar os sintomas de alerta e aprender as técnicas necessárias para lidar com este distúrbio. Dito de outra forma, talvez não tenhamos controlo sobre o que nos causa stress, mas poderemos controlar a maneira como reagimos a esse estímulo. Em Gerir 1 Ano de Stress, encontramos algumas soluções para situações específicas (ver caixa), mas a autora sugere-nos mudanças de hábitos mais gerais que devemos ter em conta – "dormir bem, pois é fundamental para regular o humor e os níveis de ansiedade"; "fazer simplesmente o que gostamos, compensando os momentos de stress com momentos de prazer e diversão"; "fazer uma boa gestão do tempo, precavendo a sobrecarga de tarefas e definindo objetivos realistas"; "promover a autoestima, evitando expressões que demonstrem representações pejorativas (‘eu não sou bom nisto’, ‘não consigo’)"; "expressar as emoções e os sentimentos com assertividade, aprendendo a colocar limites (dizer não) às situações tóxicas".
Já aqui falámos do lado positivo do stress, mas quando este, devido à sua intensidade, frequência e duração no tempo, leva ao desenvolvimento de quadros clínicos graves, Isa Silvestre aconselha a tomar outras medidas: "Todos nós temos os nossos limites, que são diferentes de pessoa para pessoa. É importante procurarmos acompanhamento psicológico ou psicoterapia quando sentimos que os efeitos do stress estão a ter consequências no nosso humor, sono e, de forma geral, nas atividades do dia a dia."
O que fazer?
Partindo de casos práticos comuns a todos nós, Isa Silvestre propõe estratégias comportamentais já testadas para lidar com o stress.
Trânsito Gestão de tempo nas deslocações; recorrer a diferentes meios de transporte.
Doença O doente deve cumprir tarefas relacionadas com a adaptação ao problema de saúde, preservar o estado funcional, percecionar qualidade de vida noutras dimensões, manter um humor positivo e objetivos. Já a família tem uma influência fundamental na construção de crenças e comportamentos de saúde, bem como fonte de força e motivação.
Morte de um familiar Fazer o luto, aceitando a realidade da perda, trabalhando a dor, ajustando-se a um ambiente em que o falecido está ausente e prosseguindo com a vida. Para falar da morte às crianças, deve-se privilegiar a verdade, a honestidade e uma linguagem clara, dando tempo e espaço para que assimilem a informação, coloquem dúvidas e exprimam emoções.
Sobrecarga de trabalho Dormir bem e fazer uma alimentação adequada; ter horas de relaxamento e de diversão, investindo energia noutros aspetos da vida, como a família, os amigos, relações amorosas e lazer.
Preparação para um exame Planear um horário de estudo, distribuindo o trabalho ao longo dos dias e deixando tempo para rever os resumos antes do exame; eliminar elementos de distração (TV, telemóvel, Net) e deixar as preocupações pessoais para depois; recompensar quando o horário de trabalho é cumprido; não fazer dietas nesta época.
Entrevista de emprego Preparar-se, realizando uma pesquisa detalhada sobre a empresa; ter confiança.
Falta de dinheiro Adotar uma atitude preventiva e informada; investir em diferentes interesses e aptidões profissionais e pessoais; promover a criatividade individual.
Incumprimento de metas estabelecidas Planear e estabelecer objetivos específicos e realistas em vez de objetivos indefinidos e grandiosos; enumerar os problemas que podem surgir se não se cumprir e listar soluções possíveis para os mesmos; realizar pouco de cada vez.
Redes sociais Sabendo que os sintomas de depressão e isolamento social estão muitas vezes associados ao uso excessivo de Internet, sobretudo nos jovens, é importante que os adultos se mantenham informados para que possam proteger e orientar os filhos, privilegiando a comunicação, estabelecendo limites e procurando outras atividades que dão prazer.
Respiração para reduzir o stress
Inspirar quatro vezes e expirar outras quatro, sempre pelo nariz.
À medida que o corpo se for adaptando ao processo, aumentar para oito vezes.
Respire fundo pelo nariz, com uma mão no peito e outra na barriga, como se estivesse a encher a barriga de ar.
É o abdómen que deve encher de ar e não o tórax.
Durante dez minutos, realize entre seis e dez respirações profundas e lentas por minuto.
Por Mafalda Sequeira Braga
*Originalmente publicado na Revista Máxima, edição nº340
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