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Os meus dois filhos emigraram e eu e o meu marido ficámos sós. Como supero esta dor?

Eugénia, 68 anos, Vila Nova de Gaia

01 de julho de 2015 às 07:00 Dra. Catarina Rivero

Tenho andado muito em baixo no último mês, desde que a minha filha mais nova emigrou para a China. O meu filho mais velho está há quatro anos nos Estados Unidos, tendo feito lá a sua vida … Já me tinha habituado até a ter os meus netos longe. Mas agora foi também a minha filha ("a minha menina"), ainda por cima sem qualquer vontade de ir (estava há dois anos desempregada), e fico só eu e o marido, a sentir-nos muito sós. Sinto-me triste e sem vontade de ir à hidroginástica ou à Universidade da Terceira Idade, onde andava com gosto. Vou falando com os amigos, mas também sem vontade de grandes convívios… às vezes sinto-me revoltada com a situação do país que nos leva os filhos, outras vezes fico com medo com a ideia de envelhecermos aqui sozinhos. Agora todos me dizem que não devia andar assim e que estou deprimida. O que me diz?

Cara Eugénia, quero desde já felicitá-la pelo bem-estar dos seus filhos e netos, bem como pela sua capacidade de encontrar atividades gratificantes no dia-a-dia. Naturalmente não poderei afirmar aqui a presença ou ausência de depressão, mas deixarei, tal como é habitual, uma reflexão sobre as questões que aqui traz, e que desde já agradeço.

As mudanças que não escolhemos e que experienciamos como negativas podem trazer tristeza e vontade de maior reclusão. Tal pode acontecer por diversos motivos incluindo, claro, quando os filhos emigram (apesar da alegria das possibilidades de carreira, dá muitas vezes lugar a saudades e tristeza), ou na perspetiva de futuro, quando mudanças no contexto irão implicar o ativar de novos recursos e soluções até ao momento desconhecidos.

Desta forma, quero sublinhar que os múltiplos desafios com que nos deparamos ao longo da vida podem provocar em nós alguma tristeza e tal pode não ser uma situação de depressão. Pode ser uma tristeza transitória de adaptação a uma nova realidade e cada pessoa levará o seu tempo até encontrar um novo equilíbrio emocional. Perante mudanças e perdas na vida, isto é, alterações da presença de pessoas (ou relações, estatuto, formas de vida, etc.), é necessário fazer o luto da situação anterior, integrando esta mudança ou perda, até ficar disponível para encarar e abraçar a vida. O luto é um processo que pode levar meses (em algumas situações anos) e podem surgir situações de tristeza profunda, revolta, etc. As emoções nunca estão erradas, o que é recomendável é, tal como está a fazer, parar e refletir, para ver a melhor forma de agir.

Muitas vezes é confundida a tristeza com depressão, mas a tristeza é inerente à condição humana, sempre que sentimos um abalo emocional. Na tristeza há o sentir de um vazio no mundo exterior que era preenchido e enriquecido pela presença de pessoas ou atividades e que no presente implicam uma reorganização emocional e relacional, para reencontrar de novo um equilíbrio emocional e bem-estar. A depressão é um processo mais profundo em que as pessoas experimentam um vazio interior e podem mesmo sentir ausência de propósito de vida, por um tempo mais alargado. Em muitas situações, há choro frequente e uma tristeza e angústia muito profundas, mas pode também manifestar-se com grande fechamento e irritabilidade. A depressão tem frequentemente impacto negativo muito marcado nas atividades diárias das pessoas, e tal pode ser um sinal importante também. Ainda a considerar as alterações ao longo do tempo ao nível dos sonos, apetite e capacidade de concentração. Também se prolonga no tempo, muitas vezes, uma vontade de maior isolamento. Pese embora os "diagnósticos" de depressão sejam muitas vezes feitos por amigos e familiares, é importante que tal seja feito apenas por profissionais de saúde mental, que ajudem a distinguir tristeza de depressão.

Nestes momentos de transição, torna-se importante aceitar que há momentos de dor que, quando vividos, nos permitem de novo encontrar formas de bem-estar. Nesse sentido, ver o que é gratificante e traz significado (amigos e familiares, atividades de tempos livre, entre outras) e, no seu ritmo, encontrar uma rotina e objetivos que a preencham, bem como recursos de apoio que tragam sentimento de segurança para o futuro. No caso dos filhos emigrados, encontrar formas de manter a relação e suporte e, quem sabe, preparar umas férias de visita. Se a tristeza perdurar e sentir que não está a conseguir ultrapassar esta fase, será útil recorrer a um profissional de psicologia que a poderá ajudar neste processo.

 

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