Estes são os piores psicopatas de Portugal segundo Joana Amaral Dias
A psicóloga explicou à ‘Máxima’ o processo por trás do seu último livro, quais as principais características dos grandes assassinos e até como podemos identificá-los no nosso círculo de amizades. A investigação transformou-se entretanto num podcast que estreia esta sexta, 27.
O novo livro Psicopatas Portugueses – 13 histórias reais de morte, perversão e horror começa por contar o caso de Luísa de Jesus, que matou com as suas próprias mãos 33 bebés. Asfixiava-os e, de seguida, ou os abandonava em campos, ou os esquartejava-os e os escondia debaixo da sua cama. Uma infanticida como se conhecem poucas ou raras no mundo inteiro e a última condenada à morte em Portugal, em 1772. Mas há também a história de José Domingues Borrego. No último meio século da criminologia portuguesa não se viu homicida mais bárbaro. No outono de 1970, Borrego matou vários homens (quatro ou 14, não se sabe ao certo). Estrangulava as vítimas, depois esquartejava os corpos, mutilava-os, estraçalhava os rostos e lançava os restos de mortais ao rio Tejo.
Estas histórias tenebrosas referem dois dos 13 piores psicopatas portugueses, cujos crimes são narrados pela psicóloga clínica e autora Joana Amaral Dias. A nova obra relata os factos reais e descreve os acontecimentos, tentando explicar as mentes perversas e as suas motivações traiçoeiras. O livro transformou-se entretanto num podcast, que estreia já esta sexta, dia 27 de março, em todas as plataformas, como o Spotify ou a Apple Podcasts. A série vai contar as histórias de crimes recentes em Portugal, na voz de Joana. "Vamos ter casos incríveis, descer às profundezas perversas da mente desses psicopatas", adianta. O programa tem 12 episódios com cerca de 30 minutos cada, publicados a cada duas semanas, e irá explorar a história dos crimes da mesma forma que abordará o perfil dos seus protagonistas.

Antes ouvir as histórias através do podcast, falámos com a psicóloga clínica sobre o livro, o primeiro passo de todo este processo.
A Joana sempre se interessou por este tema ou foi uma descoberta?
Psicopatas Portugueses conta 13 histórias reais de grandes assassinos portugueses. Todos mataram, pelo menos, três pessoas e ilustram praticamente todo o espetro clínico dos homicidas: há sociopatas, narcisistas malignos, psicóticos, assassinos em série, assassinos em onda, assassinos em massa e exterminadores. O homicídio, o poder de decidir sobre a vida do outro, o poder divino, é o crime-rei e, desse modo, o seu estudo e análise é altamente sedutor. E sim, sempre gostei de histórias de crime, Mentes Perigosas, CSI, etc. Afinal, sou psicóloga ;)
Como surgiu a ideia de escrever o livro?
Enquanto clínica, o profiling [perfil psicológico criminal] e a avaliação psíquica são o meu quotidiano. Entre o meu consultório, as peritagens em tribunal e as minhas crónicas criminais na televisão, a psicologia forense integra a minha rotina. E apercebi-me que, em Portugal, não havia um único trabalho clínico e de divulgação científica sobre os maiores homicidas portugueses. Estava na altura de partilhar com o público este meu interesse e de ir encontro a esse vazio.
Por quê o número 13?
Bom, entre os inúmeros homicidas em série e em massa portugueses, havia que escolher casos que ilustrassem diferentes patologias e diversos funcionamentos psicológicos, para o leitor contactar com a maior variabilidade possível de doenças mentais presentes nos assassinatos. E, de facto, as histórias escolhidas para este livro conseguem ilustrar bem todos os principais quadros psiquiátricos associados ao crime violento. Depois, 13 acabou por ser uma brincadeira irresistível. Entre ter 12 ou 14 acabei por estacionar no vulgarmente chamado número do azar até porque, como bem demonstram estas histórias reais, ser assassinado é, muitas vezes, também uma questão de acaso e sorte, de estar no sítio errado na hora errada.
Pode contar-nos um pouco do processo de investigação?
A pesquisa passou pela hemeroteca e pelas bibliotecas, arquivos e registos, troca de impressões com outros peritos e investigadores. São muitas horas de investigação, de leitura, comparações, verificação de factos. É uma fase difícil mas que adoro, é a altura da descoberta e do deslumbramento. Por vezes encontram-se pistas férteis que desaguam em histórias extraordinárias – como foi o caso do Aniqulador da Ajuda (que disparou sobre mais de 300 pessoas em Lisboa) ou do Bárbaro de Boston (o assassino português preferido da máfia italiana nos Estados Unidos da América, considerado pelo diretor do FBI como o homem mais perigoso de todos). Outras vezes, perde-se imenso tempo e esforço em pistas estéreis, histórias que inicialmente pareciam prometedoras mas que se revelam áridas, repetidas ou desinteressantes. Para este livro, a pesquisa durou cerca de um ano e meio. Só depois de recolhida toda a informação e de a sedimentar, de a consolidar, é que veio a fase da escrita.
A confiança e a falta de remorso são características destes assassinos?
Um psicopata é alguém que tem uma singular empatia cognitiva e zero empatia emocional. Ou seja, é quem percebe bem o seu interlocutor, intui as suas necessidades e expetativas de forma incrível (pode quase parecer telepático ou mediúnico) mas, simultaneamente, não tem qualquer compaixão ou solidariedade com essa mesma pessoa. Isso torna-se muito perigoso, porque o psicopata (mesmo que não mate) é capaz de manipular facilmente o outro, jogando e instrumentalizando os seus desejos e medos, sem qualquer remorso, culpa ou arrependimento. Para um psicopata, os outros humanos são sempre e só veículos descartáveis para a satisfação das suas vontades e perversões. O outro é sempre e só para usar e deitar fora. As relações são invariavelmente construídas num horizonte temporal limitado, o período durante o qual o psicopata vai extrair da sua vítima aquilo de que necessita. No final, por vezes resta apenas a carcaça.
Quais os sinais de alerta a que se deveria dar mais atenção para tentar reconhecer uma mente doente e perigosa?
É uma boa pergunta, posto que a reação comum de vizinhos, familiares e amigos costuma ser: "Ninguém diria, parecia tão boa pessoa, ajuda sempre toda a gente". Na verdade, este livro também tem esse propósito, alertar para as situações que parecem normais mas, na verdade, são sinais de perigo, nomeadamente pessoas extremamente sedutoras e encantatórias que, num primeiro momento, parecem perfeitas e fantasticamente altruístas; pessoas com histórico de comportamento violento e/ou atitudes intimidarias e/ou ódios de fel (como homofobia extremas, raivas raciais, misoginias acentuadas); pessoas muito rígidas com códigos éticos e padrões morais inalcançáveis; pessoas extremamente solitárias por opção; adultos que, por sistema, preferem a companhia de crianças ou adolescentes.
Acredita Portugal ainda é considerado um país de brandos costumes? Escondemos ou esquecemos os casos como estes?
Por vezes, quando escondemos as coisas, acabamos por as esquecer. E, claro, que esquecer também é uma forma de esconder. Portugal dos brandos costumes foi um mito criado por Salazar e a sua ditadura que queriam que o povo fosse subserviente e obediente. Se os portugueses tivessem a crença de que, no coração da sua identidade, estavam os brandos costumes, se interiorizassem essa autoimagem de dóceis e pacíficos, a probabilidade de se comportarem como rebanho servil seria maior. Todas as ditaduras apostaram na reescrita da história, na releitura do calendário, ao fim e ao cabo na reinvenção do espaço e do tempo. O Estado Novo salazarento não foi exceção. Contudo, os tempos da Inquisição e a época dos linchamentos na rua de pessoas suspeitas de "jacobinismo" foram sinistros. Depois, só nos séculos XIX e XX contam-se por milhares os mortos em guerras civis e revoluções. Desde o regicídio de 1908, passando a guerra civil de 1919, até às vésperas do regime ditatorial amordaçar o país esvaiu-se em sangue.
