"Trans fat" e transgénicos: separar o trigo do joio

Nos Estados Unidos, os Organismos Geneticamente Modificados (OGM) e as gorduras trans voltam a dar que falar. Desta vez, por causa dos rótulos. O problema é que esta nova polémica, em vez de esclarecer, veio aumentar a confusão dos consumidores, que, quando ouvem falar de trans fat, pensam que são o mesmo que transgénicos. E não são.

04 de dezembro de 2015 às 07:00 Máxima

Uma das vozes mais ativas em Portugal contra os OGM é a Plataforma Transgénicos Fora (PTF), que defende uma agricultura sustentável orientada para a proteção da biodiversidade. Constituída por algumas associações nacionais, como a Quercus, a AGROBIO, a CAMPO ABERTO e o Grupo GAIA. Tumores, inflamação intestinal, stress hepático e renal em animais de laboratório são alguns dos efeitos de certos transgénicos que a PTF aponta, tendo por base "diversos estudos científicos internacionais".

Mas a bióloga Margarida Silva, porta-voz da plataforma, considera que "mais importante do que os efeitos que estão demonstrados, é o que está por investigar", referindo-se ao sistema de autorização de novos transgénicos que, segundo a mesma, "está sabotado": "Este tipo de pesquisas é muito caro e praticamente só as empresas é que têm capacidade financeira para o desenvolver. Por isso, chegamos à grande ironia da União Europeia nesta área: as empresas que investem milhões na criação dos transgénicos é que fazem a investigação para avaliar se esses mesmos transgénicos são seguros e podem ser autorizados."

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Os argumentos contra a Monsanto, a maior empresa agrícola mundial, que já comprou mais de 70 empresas de sementes nos últimos 20 anos e detém grande parte das patentes, é uma das bandeiras usadas pela PTF para alertar os consumidores para as consequências deste monopólio de sementes: "Afeta-nos a todos, agora e no futuro – há menos variedades de sementes não transgénicas, menos agricultores a guardar as suas próprias sementes e redução do investimento em sementes livres." Margarida Silva questiona mesmo a credibilidade da gigante norte-americana, que já foi condenada por vários tribunais, um dos quais norte-americano, por "publicidade enganosa" e "comportamento de natureza inacreditável que ultrapassa todos os limites da decência e deve ser visto como horrível e intolerável numa sociedade civilizada".

      O que são?

  Os OGM são organismos nos quais o material genético (ADN) foi alterado de uma forma que não ocorre naturalmente. Existem vários nomes para a tecnologia usada na modificação genética dos organismos: uns chamam-lhe "engenharia genética", outros "biotecnologia moderna" e "tecnologia dos genes" ou "tecnologia do ADN recombinante". Mas mais do que o nome, importa o processo: através dela faz-se a transferência de genes individuais selecionados de um organismo para outros.  

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      Onde é que eles estão?

  São vários os produtos que importamos e que podem conter OGM. Exemplos: algodão, milho, soja, colza, papaia, chicória, squash (um tipo de abóbora), batata (incluindo derivados) e alguns aditivos que habitualmente são usados na produção de múltiplos produtos alimentares e, por esta razão, cereais, bolachas, chocolates, polpa de tomate, hambúrgueres, pizza e outros alimentos também podem ter na sua composição OGM. Em Portugal, a única planta GM é o milho bt (resistente à broca) e só é utilizado na produção de rações para animais.

      Como se avalia a sua segurança ou perigosidade?

  Através de várias investigações, onde se afere os efeitos diretos na saúde humana, a tendência para provocar reações alérgicas, os componentes específicos suspeitos de possuírem propriedades nutritivas ou tóxicas, a estabilidade do gene inserido, os efeitos nutritivos associados à modificação genética e os efeitos indesejados que possam resultar da inserção do gene.

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      Quem beneficia com eles?

  Existem vantagens tanto para os agricultores como para os consumidores. Os agricultores têm uma melhor rentabilidade das culturas (com menos perdas, maiores produtividades, redução do uso de pesticidas e de herbicidas); os consumidores têm à disposição produtos de melhor qualidade (mais vitaminados, mais licopeno e betacaroteno, mais ferro, mais ómega-3 e menos microtoxinas).

 

Fontes: Organização Mundial de Saúde, CIB e Pedro Fevereiro, investigador em Biologia Vegetal

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O diretor do CIB vai mais longe e afirma que "faz tanto sentido rotular os OGM como os produtos alimentares resultantes do melhoramento por salvamento de embriões vegetais. Ou resultantes da aplicação de radiação ionizante. Ou de variação somaclonal. Não faz qualquer sentido rotular um processo de melhoramento porque isso não esclarece nada sobre as características do produto".Em todo o caso, qual é a relevância dessa declaração no rótulo? Que indicação sobre as suas características ou sobre a sua inocuidade dá dizer que um alimento contém OGM? Para Pedro Fevereiro, apenas "atemoriza as pessoas" sem as informar: "OK, o rótulo diz que o produto contém OGM. E então? O que é que isso diz aos consumidores? Rotular OGM quer dizer que este alimento contém componentes provenientes de variedades vegetais melhoradas com recurso à engenharia genética. Mas existem diferentes alterações genéticas. No rótulo também se vai dizer quais?"

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