Os livros da minha vida: A escolha de Isabel Rio Novo

Desafiámos alguns escritores portugueses a partilhar as suas escolhas literárias de uma vida. Conheça as de Isabel Rio Novo.

02 de abril de 2020 às 07:00 Rita Lúcio Martins

Natural do Porto, onde se doutorou em Literatura Comparada, Isabel Rio Novo é autora de obras como A Caridade (2005, Prémio Literário Manuel Teixeira Gomes), Histórias com Santos (livro de contos de 2014) e dos romances Rio do Esquecimento (2016, finalista do Prémio LeYa e semifinalista do Prémio Oceanos) e A Febre das Almas Sensíveis (2018, finalista do Prémio LeYa). Em 2019, publicou O Poço e a Estrada, biografia da escritora Agustina Bessa-Luís. Rua de Paris em Dia de Chuva, o seu mais recente romance, chegará brevemente as livrarias.

Machado de Assis, Memorial de Aires

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É o último romance de Machado de Assis, um dos maiores escritores de todos os tempos, e por sinal de língua portuguesa. Mas podia ser qualquer livro deste autor. A narrativa caminha lentamente, ou pelo menos é isso que nos parece, até percebermos que tudo correu a um ritmo vertiginoso e já estamos na borda do precipício. Só que se trata de uma vertigem interior, contida, silenciosa; sem "banda sonora", como eu costumo dizer. E por isso mais perigosa.

Gustave Flaubert, Madame Bovary

Muita gente vive atormentada com a quantidade de livros que nunca irá ter tempo para ler na vida. Pela minha parte, sou uma releitora compulsiva, regressando obsessivamente a livros que já conheço. Li Madame Bovary pela primeira vez na faculdade. Reli-o aos trinta e poucos anos, já depois de ter sido mãe, e o destino da pequena Berthe, personagem que me passara completamente despercebida da primeira vez, atingiu-me como um golpe. Os livros bons são assim: ficam a ressoar em nós.

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Marguerite Yourcenar, Memórias de Adriano

Um romance que confirma a minha convicção de que, bem melhor do que classificar livros e querer que eles encaixem em géneros ou categorias, é lê-los e fruí-los. É um romance histórico? Não é um romance histórico? É ficção? É não ficção? Que importa. A escrita de Yourcenar flui como uma carícia luxuriante, quase sensual, quase dolorosa. E, no posfácio, está aquela frase em que a autora descreveu perfeitamente, como se as duas tivéssemos discutido o assunto, o meu sentimento sobre os "amigos à distância": "duas dúzias de pares de mãos descarnadas, alguns vinte e cinco velhos bastariam para estabelecer um contacto ininterrupto entre Adriano e nós." Emociono-me sempre que leio isto.

Camilo Castelo Branco, Amor de Perdição

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Romantismo, sentimentalismo, a força da paixão, a penumbra da tragédia, e depois a linguagem concisa, cortante, irrepreensível. Como disse Manoel de Oliveira, sacode-se o livro e não cai de lá nada: nenhuma palavra está a mais.

Albert Camus, O Estrangeiro

Um pequeno enorme livro que incomoda, perturba, desestabiliza. Gosto de livros que me atinjam as emoções e os nervos. Gosto de sentir que também eu poderia matar, como Mersault. (Tem mais efeito sobre mim uma página de Camus do que um livro inteiro de Sartre.)

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2 de 5 Gustave Flaubert, Madame Bovary
3 de 5 Marguerite Yourcenar, Memórias de Adriano
4 de 5 Camilo Castelo Branco, Amor de Perdição
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5 de 5 Albert Camus, O Estrangeiro
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