Carmo Mexia e Nuno Benito, amigos em primeiro lugar e sócios em segundo, partilham o privilégio de fazer o que mais prazer lhes dá: desenhar tapetes. Porque mais do que nunca é preciso aproveitar o momento!
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15 minutos com…os criadores da Carpet Diem
03 de maio de 2013 às 06:00 Máxima
Uma carpete interrompe a calçada portuguesa, duas plantas fazem-lhe companhia e um elegante toldo preto sobressai na fachada do n.º 74 da rua D. Pedro V, em Lisboa. Lá dentro, a generosidade do espaço, de pé-direito e arcos em pedra imponentes, dá protagonismo aos tapetes. No chão definem os ambientes, na parede assumem-se como murais, numa pilha podem ser “folheados” como um catálogo real. É difícil resistir à tentação de tocar-lhes e pisá-los. Carmo Mexia, pianista, e Nuno Benito, formado em design de moda, são os responsáveis pela marca Carpet Diem. Amigos desde sempre, assumem múltiplas afinidades e até o que os distingue resulta numa complementaridade.
O que cada um faz está bem definido?
Carmo:
Trabalhamos sempre em conjunto. Mas o Nuno é mais geométrico e eu mais orgânica.
Nuno:
Os padrões geométricos chamam-me muito a atenção, como aquela criança que vai atrás da cor. Gosto de brincar com a geometria, sou mais gráfico. Deve ser resultado de ter sido professor na área de fitness durante 25 anos. Todas as coreografias que montava eram muito estruturadas, simétricas.
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SE ESTES TAPETES VOASSEM...
... em que local público gostariam que aterrassem?
N: Um dos meus arquitetos preferidos é Mies van der Rohe e não me importava nada de ter um tapete no pavilhão de Barcelona.
C: Num filme do Almodóvar!
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N: No outro dia, a Rossi de Palma, atriz fetiche do Almodóvar, revelou-se apaixonadíssima pelo tapete Dragão. E eu muitas vezes quando faço um desenho penso numa pessoa e quando isto aconteceu foi uma feliz coincidência.
... onde vos levariam de férias?
N+C: Bali, 15 dias, já!
O jeito para desenhar é puro talento?
C:
Sim, não desenvolvi.
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N: A Carmo é autodidata. Eu venho do design de moda, por isso estava mais do que habituado a tratar de padrões e lidar com desenhos. Por isso, passar de uma área para a outra foi um pulinho. Desenhar um padrão têxtil é quase igual, apesar de as coisas funcionarem de outra maneira no chão.
E desenham juntos, no mesmo espaço?
C:
Sempre.
N: Enquanto um está com as canetas, o outro com as lãs e as referências, depois um de nós passa o desenho a limpo.
E como é isso de desenhar ao telefone?
N:
Desenhamos no mundo. A Carmo pode estar em Roma e eu na Sardenha, um viu uma tatuagem no braço de alguém, ou uma toalha de mesa num restaurante lindíssimo, numa esplanada à beira-mar, e telefonamo-nos, partilhamos essa informação e de repente surge um tapete no meio do nada…Vamos sempre divertindo-nos.
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O que vos influencia e inspira?
N:
Se quiser uma influência direta, nós somos malucos por Mozart. Deixa-nos extasiados, mais do que falar em Pucci, Missoni ou outros.
C: Gostamos cada vez mais das mesmas coisas.
Como foi o dia em que decidiram arrancar com este projeto?
N:
Tivemos imensos negócios pelo meio: um restaurante, uma loja de roupa...Decidimos apenas fazer mais um depois de acabarem os outros. Acho que começou pelo prazer de termos alguma coisa que gostássemos de fazer em conjunto. E pouco a pouco foi tomando uma forma sem nenhum objetivo de início.
Qual é o vosso conceito vencedor?
N:
Democratizar o tapete. Ter um bom produto, com qualidade e apostando no design, a preço acessível.
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Começaram por produzir em Portugal e depois rumaram à Índia. Porquê?
C:
Sim, desde 2003 que fazíamos tudo em Portugal. Só há um ano é que passámos a enviar os desenhos para serem produzidos na Índia.
N: Era a única maneira de ter o preço que temos. Tínhamos de reduzir custos. Na Índia, a mão-de-obra é muito mais barata e o trabalho altamente especializado. Por que não aproveitar essa situação?
Gere-se bem à distância?
C:
Geralmente, vamos à Índia uma vez por ano.
N: Claro que em termos logísticos é mais complicado, mas tivemos a sorte de encontrar um fabricante muito honesto, com uma empresa familiar. Conseguimos chegar a um produto muito digno. Não são preços fora do normal, temos margens reduzidas, eliminámos intermediários. Por outro lado, a loja online permite-nos isso mesmo.
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Confiam que não há exploração de mão-de-obra infantil?
C:
Sim. Colaborámos desde logo com uma associação alemã, Care & Fair, que se responsabiliza pelas famílias dos trabalhadores dos tapetes, ou seja, asseguram-lhes o trabalho e asseguram que as famílias têm educação e saúde.
N: Uma percentagem das nossas vendas reverte a favor dessa associação. Cada um dos nossos tapetes tem uma etiqueta que garante que não há exploração de mão-de-obra infantil.
Sim, na ideia que tivemos, a rabiscar, entra a cor, há momentos em que estamos mais coloridos, outros em que estamos mais apagados, mais contidos. Depende…
C: O que conseguimos desenvolver bem é a capacidade de transpor um qualquer desenho para um tapete, porque isso é que nem sempre é fácil. E nem sempre resulta no chão.
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Só desenham o que gostam?
N:
Sim, só desenhamos o que gostamos. Provavelmente porque já temos alguma rodagem também percebemos o que pode atingir um maior número de pessoas… Nunca há uma intenção de base determinada, fazemos porque somos nós e o que gostamos.
C: É pessoal e partilhamos.
Qual é o conceito da base da coleção?
C:
É unida pela cor. A cor tornou apelativo o próprio site e diferenciou do resto.
N: A primeira coleção em que assumimos o shop online partiu de um patchwork, de unir padrões no mesmo desenho e por aí chegámos a outras coisas que nada tinham a ver, mas foi o início.
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C: Não havia nada do género em tapetes, só mesmo em roupa, era o caso da Custo, com mistura de padrões e texturas.
Não trabalham encomendas específicas, não há margem para personalização?
C:
Já fizemos. Mas agora que os tapetes vêm da Índia é mais complicado. Se há uma cor que vem alterada, corremos o risco de ter um cliente insatisfeito.
N: Assim de repente, parece que desenhar um tapete é algo muito fluido e fácil. Mas não é. Sabemos de muitos designers que não conseguem mesmo desenhar tapetes. Quando um cliente de repente aparece entusiasmado com as lãs e quer alterar uma determinada cor, pode resultar numa borrada… Mas há exceções, por exemplo, quando percebemos que do outro lado está alguém que realmente tem know-how. A Christian Dior, em Madrid, pediu-nos e nós fizemos porque eles sabiam bem o que estavam a pedir. Esperar quatro meses por um tapete que depois não vai ficar bem não merece a pena. Temos a certeza que funciona como planeámos. Também ninguém vai à Zara dizer que quer um blazer com as mangas mais curtas...
Estão a celebrar 10 anos. Este showroom inaugurado recentemente assinala um marco no vosso percurso?
N:
O espaço físico da loja surge também porque tínhamos de ter stocks para dar resposta rápida às encomendas online. Começámos por ter um armazém sem qualquer interesse comercial, mas depois surgiu este espaço que pensámos abrir primeiro como showroom e depois como loja. Agora somos procurados de várias formas.
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Quais os mercados que mais compram Carpet Diem?
C:
França, Ucrânia, Alemanha (muito), Inglaterra, Canadá.
N: Vamos tentar este ano minimizar os elevados custos de transporte transatlânticos que põem um preço final mais alto.
O nome, tal como o desenho, é o que testemunha o que cada tapete tem de cada um de vocês?
C:
Há alguns que podem ter ligação com o nome, mas a maioria não. O Copacabana, por exemplo, faz lembrar a calçada… O tapete Padma baseia-se na Padma Lakshmi (ex-mulher de Salman Rushdie).
N: É uma mulher indiana lindíssima e quando fizemos este tapete alusivo a Bollywood tínhamos de lhe dar o nome dela.
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C: Foi um tapete feito para vender outros.
N: Quando desenhamos um tapete destes sabemos que não será o que mais se vende, mas também acontece connosco o que se passa nas coleções de moda. É algo de passerelle, que acaba por afirmar um conceito. Por exemplo, o Dragão custa a chegar a um maior número de pessoas, mas sabemos que chega.
Há um tapete para cada tipo de casa ou estilo de decoração?
N:
Em Portugal, as pessoas ainda são um bocadinho fechadas e conservadoras. Nem sempre são capazes de prever como o contraste pode resultar numa decoração fantástica.
C: Os portugueses optam pelo seguro, pelas cores lisas e desenhos com relevos.
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Há cores, motivos que sejam proibidos num desenho?
N:
Há sobretudo más combinações de cores, há padrões mal desenhados, tudo aquilo que fique mal à minha sensibilidade… O que diria é que nunca utilizaremos uma matéria-prima que não seja natural como é a lã.
C: Sim, isso é obrigatório. Da lã só para a seda.
O tapete termina a sua viagem quando chega a casa do cliente?
N:
Sim, para nós termina a nossa história mas começa uma nova história. O tapete vai criar uma atmosfera diferente, vai criar uma interferência pela cor, pela textura, e começará uma nova história.
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