Era uma vez...
Decidimos lançar um pouco de pó mágico sobre esta época festiva e mergulhámos de cabeça no mundo fantástico dos contos de fadas. Descobrimos que, afinal, eles estão um pouco por todo o lado e recomendam-se em todas as idades.
Foi, provavelmente, uma das poucas vezes em que a escolha de roupa da Duquesa de Cambridge não convenceu. Há cerca de dois anos, Kate Middleton fez uma discreta visita à escola primária Robert Blair, em Londres, e, ao que parece, os pequenos alunos, surpreendidos, exclamaram: “Ela não parece uma princesa. Onde está o vestido?” Com ou sem fada madrinha, as escolhas de moda da duquesa já lhe valeram o estatuto de ícone de estilo e um lugar na lista das mais bem vestidas da Vanity Fair. No entanto, o look descontraído com calças de ganga ficou muito aquém das expectativas de quem queria ver uma princesa de conto de fadas e o vestido é, sem dúvida, um dos elementos-chave da fórmula mágica destas histórias que recheiam a infância de cor e fantasia.
As histórias de encantar fazem parte das memórias da infância. Quem não teve uma princesa ou um herói favorito, um monstro ou até um vilão que ameaçasse trazer pesadelos à noite ou um filme que era visto vezes sem conta? Mas serão mero entretenimento ou têm um papel mais profundo? No livro A Psicanálise dos Contos de Fadas, o autor, Bruno Bettelheim, analisa alguns dos mais famosos contos e explica: “Enquanto diverte a criança, o conto de fadas esclarece-a sobre si mesma, e favorece o desenvolvimento da sua personalidade.” As mensagens por trás destes contos são importantes e fazem deles um veículo divertido e simplificado para as fazer chegar aos mais pequenos. Segundo o autor, “é aqui que os contos de fadas têm um valor inigualável, porque oferecem novas dimensões à imaginação da criança que ela não poderia descobrir verdadeiramente por si só. Ainda mais importante: a forma e estrutura dos contos de fadas sugerem imagens à criança com as quais ela pode estruturar os seus devaneios e com eles dar melhor direção à sua vida”, Afinal de contas, estas histórias fantásticas não são só para crianças. Ora vejamos por exemplo a saga de Shrek (2001), a história que até começou por ser bastante desencantada e em perfeita oposição a todos os contos perfeitos que conhecíamos também cativou, de imediato, não só as crianças como toda a família. Porque como diz Bruno Bettelheim “o conto de fadas não poderia ter o seu impacto psicológico sobre a criança se não fosse primeiro e antes de tudo uma obra de arte”.
Indiferentes ao estatuto de arte, os fãs da obra de vida dos irmãos Grimm e de Walt Disney, por exemplo, reconhecem o valor de histórias tão especiais que perduram pelo tempo e conquistam geração após geração sem se esgotarem. Na verdade, os contos de encantar são de tal forma poderosos que o Sr. Disney até criou um mundo num parque temático com o seu nome. Aquele projeto que muitos criticaram por ser demasiado ambicioso abriu e 17 de julho de 1955 na Califórnia como Disneyland e é ainda hoje um lugar único onde os cenários e as personagens dos contos de fadas existem e onde todos podemos voltar a ser crianças. De facto, quando crescemos passamos a olhar para os contos de fadas de uma forma mais crítica e a retirar-lhes todo o suculento encanto que nos cativou no início. As responsabilidades que invadem a vida dos adultos dão uma dura lição de realidade e estas histórias passam a ser vistas como pura fantasia. Mas há que continuar a acreditar: aquilo a que alguns chamam acaso outros poderão chamar magia. Como nos disse Katy Harris, a responsável pelos espetáculos ao vivo da Disney de Paris, “todos precisamos de ter sonhos, todos precisamos de ter o ‘um dia gostava de fazer isto’ e algumas pessoas vão de facto tentar fazer isso acontecer e outras ficam muito contentes só por terem o sonho (...) Penso que nos enterramos na vida do dia a dia e em responsabilidades, às vezes precisamos de brincar e de encontrar o nosso espírito infantil”. Assim, numa divertida tentativa de misturar contos de fadas e realidade, a Disney trouxe uma das suas princesas, Giselle, da animação para a movimentada Nova Iorque, onde não só encontrou animais da cidade para a ajudarem a limpar a casa como também trocou o seu príncipe de desenho animado por um advogado de sucesso. Aos contos seculares que todos conhecemos começam a juntar-se novas histórias que acompanham as mudanças da sociedade, mas sempre com um toque de magia. As princesas agora também são guerreiras, os brinquedos têm vida quando as portas se fecham, saem monstros pelo armário quando cai a noite, os veículos ganham vida própria e ainda há espaço para os conflitos culturais e a ecologia.
É verdade que o mundo da fantasia não impõe limites, muito pelo contrário. Talvez por isso seja uma fonte de inspiração inesgotável em tantas outras áreas. Na moda, marcas como Marchesa ou Giambattista Valli partilham uma estética romântica e sonhadora. Em cada coleção há vestidos que parecem feitos para princesas encantadas e proporcionam verdadeiros momentos de princesa a muitas divas na passadeira vermelha, mas é a Alta-Costura que concentra toda magia. Os criadores de moda criteriosamente selecionados para pertencer a este clube entregam-se aos temas mais fantásticos para levar à passerelle vestidos únicos e com o minucioso trabalho artesanal dos lendários ateliês de Paris algumas peças até parecem feitas por fadas. De tal forma que as verdadeiras princesas não lhes resistem. Os casamentos reais que invadiram Europa com uma onda de glamour tiveram como protagonistas não só os príncipes e princesas mas também os vestidos de noiva. Em Londres, Kate Middleton usou um vestido de Sarah Burton para Alexander McQueen, no Mónaco, a princesa Charlene escolheu um modelo de Giorgio Armani, no Luxemburgo, as novas princesas renderam-se ambas à magia de Elie Saab e a mais recente foi Madalena da Suécia com um desenho especial do veterano Valentino. A imprensa escreveu vezes sem conta nos últimos anos a expressão “casamento de conto de fadas”, o que nos prova que, no fundo, continua a haver um certo fascínio pelas histórias de amor e, claro, pelo final feliz.
Ainda pelos caminhos da semana de Alta-Costura, a recém-chegada criadora russa Ulyana Sergeenko tem uma preferência pelos contos de encantar russos como fonte de inspiração para as suas coleções. Já a sua conterrânea, a modelo Natalia Vodianova, usa este tema para dar o mote aos bailes que organiza anualmente com fins solidários para a sua associação Naked Heart. Pelo cinema e pela televisão, os filmes, e também séries, recuperam histórias antigas reinventadas e, para o próximo ano de 2014, já estão prometidos dois filmes que vão dar que falar: Saving Mr. Banks, em que Tom Hanks interpreta o próprio Walt Disney, e Maleficent, com Angelina Jolie como rainha má e protagonista desta versão de A Bela Adormecida. Nem só pelos ecrãs de cinema tem passado muita magia: há anúncios de televisão que são como curtas-metragens encantadas que ficam a cargo da área da beleza de algumas marcas. Como no caso dos perfumes nos anúncios da linha Nina, de Nina Ricci, e Angel, de Thierry Mugler, partilham um universo de magia com estéticas bem diferentes. Quase fazem os seus perfumes parecer uma poção mágica que nos convida a entrar no seu universo. Podemos concluir que a magia dos contos de fadas não está encerrada nos livros infantis nem se resume a desenhos animados. No Natal passado, os armazéns Harrods, em Londres, e Barneys, em Nova Iorque, renderam as suas lendárias montras ao universo Disney, provando-nos, não só que os contos de fadas vendem como também que são um tema muito apreciado pela maioria do público, independentemente da idade.
Mas afinal de que são feitos os contos de fadas e o que é preciso para viver um? Quando procuramos o seu significado ou de fantasia no dicionário saltam palavras como criatividade, sonho ou imaginação, por isso com fatores tão variáveis como estes o melhor é cada pessoa criar o seu, desde que o final seja, está claro, muito feliz.
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TIARAS CARTIER
A joia no topo do bolo
A incalculável concentração de joias históricas no Grand Palais, em Paris, quase torna precioso o ar que se respira no seu interior. A Cartier prepara a sua maior exposição de sempre: Cartier, the Style and History vai deslumbrar o público entre 4 de dezembro a 16 de fevereiro de 2014. Um dos destaques desta exposição é um conjunto de tiaras que inclui 19 peças que regressaram a casa e fazem agora parte da coleção Cartier e seis emprestadas por clientes privados, numa rica demonstração de variadas inspirações.
Diadema Folhas de Oliveira (em platina, diamantes e pérolas, 1907) criado para o casamento da princesa Maria Bonaparte (bisneta de um irmão do imperador Napoleão) com o príncipe Jorge da Grécia e Dinamarca, segundo filho do rei Jorge I da Grécia. A princesa, que se tornou próxima de Sigmund Freud e foi mesmo a sua primeira tradutora para francês, encomendou várias joias para o enxoval do seu casamento. As peças criadas pela Cartier para a ocasião adornaram a montra da loja da Rue de la Paix.
A tiara Halo (em platina e diamantes, 1936) percorreu 75 anos de história na família real inglesa até chegar à cabeça de Kate Middleton no dia do seu casamento com o príncipe William, em abril de 2011.
Em 1937, Londres celebrou a coroação do rei Jorge VI e a Cartier recebeu encomendas para 27 tiaras, muitas delas para usar nesta ocasião. Tiara em platina, diamantes e águas-marinhas e tiara em ouro, platina, diamantes e citrinas.
Nem só de diamantes se fazem belas tiaras. Tiara (em platina, diamantes e turquesas, 1936) encomendada para o Honorável Robert Henry Brand, banqueiro e alto funcionário que foi diretor da Lazard’s e Loyd’s. Bandeau em platina, ouro, diamantes, contas de coral, de ónix, carapaça de tartaruga e esmalte (1922). Bandeau em prata, ouro, esmalte e pérolas (1908).
A Cartier chegou à Rússia em 1907 e depressa começou a criar tiaras inspiradas nas típicas kokoshnik russas. Tiara em platina, diamantes, pérolas, ónix e esmalte (1914).