Vou casar daqui a dois meses (apesar de vivermos juntos há dois anos) e quero muito viver a minha história do ‘felizes para sempre’. Sendo filha de pais divorciados, sei o que não quero para mim… Tenho lido imenso e tido imensas conversas sobre o ‘amor para sempre’ (que muitos não acreditam). É possível? O que faz o Amor durar?
Cara Susana, antes de mais, muitos parabéns pelo casamento que aí vem. São múltiplos os fatores que podem facilitar uma relação romântica duradoura, e tal poderá começar precisamente por ter presente que esse é o caminho que faz sentido. Um casal com um compromisso partilhado para a vida, tenderá a ter mais atenção a manter o enamoramento ao longo dos anos e a encontrar soluções nas fases de maiores dificuldades. Não considerando soluções ou ‘verdades’ para todos, deixarei alguns pontos que para muitos casais têm servido.
Cada casal é um casal e as soluções são muito diversificadas naqueles que se mantêm por décadas. Há, contudo, alguns pontos que parecem emergir quando casais satisfeitos com a sua vida conjugal falam dos seus percursos. Por um lado, aceitam que não é uma relação assente numa paixão arrebatadora (como no primeiro par de anos), mas sim num amor romântico companheiro (isto não quer dizer que deixe de haver romantismo ou erotismo, pelo contrário, mas sentem que a satisfação das necessidades emocionais não depende exclusivamente do outro). Na fase mais apaixonada da relação, há um sentimento (quase) de fusão, em que muitas vezes é sentido que "nada mais interessa". Com o passar dos anos a relação solidifica num percurso partilhado em que há necessidades individuais, e conjugais, procurando o casal um equilíbrio ótimo, sempre que possível, nestas aspirações e expectativas.
É referido por muitos casais de longo curso que cuidam dos sonhos conjuntos (e buscam novos sonhos que naturalmente vão mudando ao longo da vida), ao mesmo tempo que apoiam o outro nos seus sonhos individuais. Demonstram muito uma atenção ao Nós, mais do que ao Eu, pelo que os projetos individuais consideram sempre a existência do casal. Os casais que se encontram numa relação positiva de muitos anos, demonstram geralmente um sentimento de pertença forte, e mesmo um sentido de transcendência (sendo muitas vezes o casal referido como algo omnipresente, que dá força e segurança, mesmo quando cada elemento está nos seus projetos individuais).
Um ponto muitas vezes referido pelos casais com que vou trabalhando passa pela ideia de reservarem tempo a dois, muitas vezes com grande criatividade (nomeadamente nos casais que entram na parentalidade, algumas vezes partindo para uma família numerosa, e/ou quando um ou os dois elementos do casal estão em profissões desafiantes em termos de tempo e exigência). Neste tempo a dois há espaço para partilha e expressão de carinho. O erotismo e a sexualidade não são descurados, pelo contrário: o à vontade crescente pela convivência de anos é muitas vezes aproveitado por estes casais para explorar a sua vida a dois de forma gratificante para ambos.
São muitas vezes casais que mantêm e cultivam a arte de rir a dois, com sentido de humor positivo e construtivo, conseguindo evitar cair na rasteira do sarcasmo. Ainda, são casais que referem que não se fecham, isto é, procuram ter espaço social em casal e/ou família (onde repetidamente valorizam o outro e demonstram a admiração), para além de promoverem o crescimento individual e conjugal ao longo das décadas.
Estes casais naturalmente também passam por crises e conflitos, por vezes mesmo com dúvidas sobre o sentido da relação. Contudo, tendem a não evitar esses conflitos, mas a crescer com eles, a conversar sobre as crises, a dar tempo e espaço para as dúvidas e para as reaproximações. O divórcio ou separação não fazem parte do dicionário destes casais – nas discussões não é uma questão que venha para a conversa, como moeda de troca ou mesmo chantagem. A ideia de ‘juntos para sempre’ mantém-se nos momentos mais difíceis e a tendência é apenas falar da possibilidade de separação em casos de genuínas dúvidas, e não como ameaça em momentos de maior exaltação. Tendo um espírito de compromisso muito forte, mesmo em momentos de dúvidas e mágoas, tendem a procurar soluções para reencontros positivos num tempo e espaço adequados às necessidades de ambos. Perante crises, mais do que entrar num padrão de competição, rapidamente passam para comportamentos reparadores e orientados para as possibilidades de um futuro conjunto.
Uma relação duradoura passa assim pelo compromisso de alimentar um romance, tendencialmente com altos e baixos, em que cada um assume que dará o seu melhor na maioria dos dias, para que a regra seja escolher diariamente o reencontro do final de cada dia. O ‘Amor para Sempre’ pode não acontecer em todos os casais, e não depende apenas de um dos elementos e pode mesmo haver casais que sentem que o fim aconteceu, ou que a relação deixou de fazer sentido. Estando a Susana no início, estará a tempo de tentar prevenir um fim não desejado, e promover que a chama se mantenha ao longo da vida. Como uma dança, precisa do empenho, atenção e dedicação de ambos, numa sintonia que se vai construindo ao longo do tempo, com necessidade de reajustamentos constantes. No discurso dos casais que se sentem satisfeitos com a sua relação conjugal duradoura, costuma transparecer que vale a pena. Felicidades!