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Sou como sou e gosto!

Ter a autoestima no sítio é o que vai faltando a muitos portugueses, miúdos e graúdos. Também é a favor da criação do Dia Nacional da Autoestima?

18 de janeiro de 2017 às 07:00 Máxima

O estudo é britânico. E revela que 38% das meninas com idades entre os sete e os dez anos não se sentem bonitas o suficiente. Há outros números, divulgados pela organização Girlguiding, que demonstram que a pressão começa cedo, ainda nos bancos da escola. Ao todo, quase 15% das mais de 1600 inquiridas diziam sentir-se envergonhadas em relação à própria aparência e 25% confirmavam a obrigação de ter um corpo perfeito. Os dados não são nacionais, mas a falta de autoestima, garantem as psicólogas Ana Paula Reis e Sónia Gaudêncio Oliveira, não é um problema apenas com sotaque inglês. Também por cá, as crianças, as meninas e os meninos, sofrem dele, o que levou esta dupla a unir esforços em torno de uma dupla missão: aumentar a autoestima dos mais pequenos, e isto através de um programa já implementado em várias escolas do País, e reforçar o tema junto dos mais velhos. Como? Através da criação do Dia Nacional da Autoestima.

"É complicado, tanto para o bem-estar psicológico como para o equilíbrio emocional, quando as meninas começam logo com este tipo de preocupações", confirma à Máxima Sónia Gaudêncio Oliveira. "E isto tem a ver com uma pressão para se ser perfeito, para se ser o melhor em tudo." O dedo é aqui apontado aos estereótipos. São eles, garante a especialista, que definem a imagem do que deve ser, tornando mais difícil aceitar e gostar daquilo que se é. "Muitas vezes as pessoas não gostam de si porque se comparam aos outros: a outra é mais bonita, a outra é mais magra, a outra tem determinadas coisas que eu não tenho, faz as coisas melhor do que eu. Isto é uma coisa muito cultural ? os portugueses têm um bocadinho a tendência para se desvalorizarem ? e tem também a ver com a pressão da sociedade para o sucesso, aquela pressão de que temos de ser os melhores em tudo."

E apesar de este ser um problema com impacto nas meninas, a baixa autoestima também não deixa os rapazes descansados. "Elas acabam por ter uma maior pressão associada à aparência, à beleza, mas hoje em dia já estamos numa sociedade em que os rapazes também sentem isso", revela a psicóloga. "Atualmente, as coisas estão a evoluir para que se esbatam as diferenças", acrescenta Ana Paula Reis. "E, no caso masculino, a pressão acaba por ter mais a ver com a eficácia e a competência, está mais virada para os resultados." 

Fica a confirmação: a desvalorização começa cedo. Mas não se fica por aqui. "Estas estereotipias que a sociedade impõe e que nós tentamos acompanhar existem na primeira infância, mas vão por aí fora. Porque não são só os miúdos que têm esta experiência nas escolas. Também existe na vida adulta, quando as pessoas são levadas a exteriorizar o que muitas vezes não tem nada a ver com elas e fazem-no para acompanhar o que está na moda", reforça Ana Paula Reis.

Conscientes de tudo isto, as duas especialistas juntaram-se para criar um programa, implementado atualmente nas escolas do concelho de Cascais, que gostariam de ver replicado um pouco por todo o País. ‘Sou como sou e gosto!’ é o princípio que norteia a sua ação, que começa cedo, exatamente porque cedo começam também os problemas de autoestima. "É importante que a intervenção comece ao nível do primeiro ciclo, ali no 4.º ano, precisamente para ajudar a que as crianças comecem a reconhecerem-se como são e a aceitarem-se como tal. A perceber, por exemplo, que as meninas não têm todas de ter as medidas da Barbie", refere Sónia Gaudêncio Oliveira.

Via verde para comportamentos de risco

Crianças com baixa autoestima vão tornar-se adultos com também baixa autoestima. E mais. "Inseguros, pouco assertivos, que não acreditam nas suas capacidades, com dificuldade em arriscar, com dificuldade nos relacionamentos interpessoais, com mais apetência para se envolverem em situações potencialmente perigosas, ou seja, mais influenciáveis pelos outros", descreve Sónia Gaudêncio Oliveira. Ana Paula Reis concorda e vai mais longe. "No fundo, o facto de não terem esta característica interiorizada, esta estrutura e esta competência de autoestima no seu ‘eu’, leva a que muitas vezes, para agradar ao próximo, não consigam dizer que não. E a partir daí alinham em algumas coisas com as quais não se identificam. E se tivessem a consciência realmente do que são, do que gostam, do que querem fazer, alguma segurança na sua maneira de agir perante os outros, seriam mais assertivos e conseguiriam dizer que não a essas coisas. Muitas vezes a autoestima torna-se uma via verde para muitos comportamentos de risco, alguns mais graves, de dependência, isto na adolescência e na vida adulta."

E o exemplo vem, não raras vezes, de casa. Pode não ser por querer. E é, muitas vezes, sem perceber que os pais acabam por contribuir para este cenário. É que o seu papel, aqui, como em tantas outras áreas, é também ele determinante. "Para o bem e para o mal, os modelos parentais repetem-se, ou seja, no fundo, absorvemos da nossa família aquilo que os nossos pais também absorveram. É um ciclo infinito", defende Ana Paula Reis. E se todos nós temos a capacidade para quebrar ciclos, "no geral, os pais ou mães desejam que os seus filhos sejam de uma determinada maneira, porque têm de cumprir com os requisitos da sociedade ou porque também passaram por isso com os seus pais, é uma espiral que vai levando, na vida, a que as pessoas repitam, em determinadas fases, modelos de aprendizagem".

É desta forma que a família acaba por criar e perpetuar os estereótipos vigentes. "Pensando até que aquilo é o melhor para a criança, compram-lhe a roupa tal, o telemóvel tal, a bola tal… porque não querem ficar mal vistos." Mas não tem de ser assim. O importante, garante Ana Paula Reis, "é tentar quebrar um bocadinho aquilo que é imposto do exterior, tentar encontrar realmente aquilo que nós somos, com as coisas boas e as menos boas, com as características positivas e as menos positivas, aceitar essa realidade e construir, com base nesta plataforma, uma autoestima equilibrada, boa, positiva, mas não em excesso, porque aí teríamos crianças e adultos com personalidades perfeitamente absurdas".

 

Mas há mais, alerta Sónia Gaudêncio Oliveira. "Há coisas que todos fazemos enquanto pais, sobre as quais devíamos refletir, como comparar irmãos, ou comparar a criança com os primos, com os amigos, com os filhos dos colegas. E não se deve fazer isso. Devemos comparar a criança com ela própria, na sua evolução." Depois, há aquelas coisas que às vezes dizemos: "És sempre a mesma coisa"; "Nunca fazes nada de jeito"; "Estou sempre a chamar-te a atenção". "E não é sempre, há de haver vezes em que faz as coisas bem, mas há muito aquela cultura de apontar o que está mal feito. As crianças chegam com 60% no teste e dizemos-lhes que para a próxima têm de fazer melhor. Devemos valorizar aqueles 60%, porque é muito bom. Até podemos dizer que acreditamos que tenha capacidade para conseguir mais, mas há que mostrar satisfação com aquela nota. Se refletirmos sobre estas pequenas coisas que fazem parte do nosso dia a dia, poderemos fazê-las de outra forma."

Um dia para celebrar a autoestima

É porque, dizem, "é um aspeto importante da qualidade de vida" nem sempre tido em conta que as duas psicólogas gostariam de ver implementado o Dia Nacional da Autoestima. E janeiro seria o mês ideal para a sua celebração, "por ser aquele em que as pessoas estão dispostas a mudar, a renovar, têm uma disposição mais positiva". Para que se torne realidade, basta apenas reunir o número de assinaturas necessárias para levar o tema à Assembleia da República. É por isso que nasceu a petição pública, que pede a ajuda de todos para que este desejo se torne realidade. Até porque, confirma Ana Paula Reis, "é mais do que um desejo. É uma necessidade. E quando o conseguirmos, vamos poder fazer mais sessões de formação, de sensibilização, partilhar a nossa experiência com pais e professores para que possa haver um efeito multiplicador a nível nacional. Queremos que se pense na autoestima ao longo de todo o ano e não só quando acontecem aquelas vitórias, seja da seleção nacional de futebol, sejam as nomeações de portugueses para altos cargos. Temos de ter sempre a autoestima no sítio certo e tratar este assunto com a seriedade que merece".

Por Carla Marina Mendes

*originalmente publicado na Revista Máxima edição nº340

O desenvolvimento da autoestima em uma criança é crucial para uma vida mais feliz no futuro.
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O desenvolvimento da autoestima em uma criança é muito importante.
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