Márcia: “As mulheres têm de se impor e fazer-se ouvir e isso está a acontecer cada vez mais”
Com uma voz que nos fascina e tranquiliza, a cantora Márcia lança o seu novo álbum, Vai e Vem, a 21 de outubro.

Nasceu na década de 80, estudou Pintura, adora Cinema, mas a música é o seu "habitat natural". Uma mulher das Artes, Márcia conquistou o público português com a canção A pele que há em mim, um dueto com o cantor J.P. Simões que fazia parte do EP Márcia, de 2009. Seguiram-se os álbuns Dá (2010), o primeiro disco, Casulo (2013), sobre a experiência como mãe, e Quarto Crescente (2015). Agora, surpreende com um disco catchy, doce, poético – como ela. Chamou-lhe Vai e Vem, e o single Tempestade (que também já tem videoclip) é o cartão de apresentação. O disco, composto por 11 canções, inclui duetos com António Zambujo, Samuel Úria e Salvador Sobral. A cantautora conversou com a Máxima sobre inspirações, igualdade de género e a eterna possibilidade dos recomeços.
Estudou Pintura na Faculdade de Belas-Artes e interessou-se por Cinema, depois veio a Música. É, claramente, uma mulher das Artes. Em criança interessava-se por esse universo?

Sempre me interessei. Desenhava muito, comecei a pintar (pintura a óleo) muito cedo. Tinha muita vontade de inventar e criar coisas, e fazia essas coisas para matar o tédio. Cantava, dançava, desenhava. Pela altura da adolescência comecei a escrever, e depois foi um passo muito rápido até fundir a escrita com aquilo que inventava na guitarra. Tinha 13 anos quando compus a minha primeira canção.
Como foi descobrir a sua voz, já enquanto estudava no Hot Clube de Portugal?
Já a tinha descoberto numa "banda de garagem" aos 18, mas foi através do Hot Clube que tomei a decisão de ser cantora. Tinha muita afinidade com o jazz e queria aprofundar aquilo que sabia intuitivamente. Ali conheci outras pessoas e outras características da minha voz e, mais importante, aprendi a ouvir.

Fez parte do grupo popular Real Combo Lisbonense. Como foi essa experiência?
Eu era muito tímida em palco quando entrei no RCL, em 2008, e estava habituada a cantar sozinha com a minha guitarra. Era uma orquestra com muitos músicos, um reportório intenso e diferente, que nos ensinou muito. Percebi que, com tanta densidade musical, se eu cantasse para dentro nunca me deixaria ouvir. Foi uma temporada muito divertida e desafiante.
Em 2009 apresentou-se ao mundo, digamos assim, ao lançar o primeiro trabalho a solo com cinco canções. Quem queria ser, como artista?

Eu mesma. Sempre. O desafio é sempre esse, em tudo: fazer algo que sirva ao mundo, mas sem ter de trair a minha verdade.
Seguiram-se os álbuns Dá e depois Casulo, sobre a maternidade. Como foi cantar a experiência de se tornar mãe?
Ser mãe sempre foi um dos meus desejos mais profundos. Quando isso aconteceu senti-me profundamente feliz e, ao mesmo tempo, muito chamada à realidade. Parecem, às vezes, coisas incompatíveis.O Dá era um álbum explosivo. Depois, com a maternidade, conheci um tipo diferente de introspeção, a procura de um lugar novo para reconhecer mundo, e acho que é isso que aparece no Casulo.

Em 2015 lançou um novo álbum de originais, Quarto Crescente, e agora presenteia-nos com Vai e Vem. O que nos diz este novo projeto? Em que se inspirou?
É um disco que fala muito da possibilidade de renascimento, de recomeço. A possibilidade da separação das coisas, das pessoas, dos sítios. As coisas efémeras e a eterna possibilidade de recomeçar.
No panorama musical nacional, quais são os maiores desafios em ser-se artista?

Acho que em Portugal o maior desafio como artista é ser-se levado a sério. Temos imenso brio, qualidade e originalidade. Mas não somos vistos como pessoas trabalhadoras, com uma profissão séria com responsabilidades e benefícios para a sociedade.
Como mulher, alguma vez sentiu a desigualdade de género nesta indústria?
Sinto que há muito mais homens do que mulheres a compor e a cantar ? o chamado cantautor, que é uma designação que não adoro. Mas é um dado que começa a inverter-se de forma galopante. Não é por culpa ou inimizade dos homens, nossos pares, que acontece essa maioria. É uma coisa que está meio despercebida e vinculada, quase invisível, e por isso é tão difícil mudá-la. São as mulheres que têm de se impor e fazer-se ouvir, e isso está a acontecer cada vez mais.

As mulheres têm hoje mais voz do que nunca nesta e noutras áreas ou ainda há um longo caminho pela frente?
Há cada vez mais voz.

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