Perdi o meu marido e não consigo ser feliz. Como recupero a alegria?

Rita, 41 anos, Alenquer

10 de junho de 2015 às 08:00 Dra. Catarina Rivero

Há um ano e pouco perdi o meu marido num acidente de viação. Estávamos casados há oito anos. Vivo sozinha desde então, ainda com grande tristeza e, em alguns momentos, alguma revolta. Tenho uma filha agora com seis anos, a quem tento dar o maior apoio possível, com grande ajuda da família. Todavia, parece que ninguém reconhece o meu esforço nem compreendem a minha dor. Todos insistem que devia arranjar alguém, e que não é normal ainda andar tão triste com esta perda. A verdade é que não tenho vontade de sair e conhecer outras pessoas, apesar de já me saber bem estar com os familiares e amigos mais próximos e até voltei a ter gosto em trabalhar. Mas há dias mais tristes… Será normal sofrer a morte do meu marido depois de um ano?

Cara Rita, desde já lamento a perda e a dor que sente. São de facto perdas difíceis de gerir e lidar. Quero felicitá-la pela força que tem tido, nomeadamente com a sua filha, bem como pelo apoio que tem tido da família, para além de estar a conseguir aos poucos reavivar as suas relações e os seus projetos profissionais. Segundo percebo, sente ainda uma grande dor, ao mesmo tempo que se sente pressionada pelos demais para seguir com a sua vida e eventualmente encontrar outra pessoa, e não parece sentir-se disponível para tal.

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O luto é um processo complexo e, de facto, leva tempo. O seu tempo. Não existe um tempo certo, já que há múltiplos fatores que influenciam este processo de lidar com a dor pela morte de alguém que nos é querido e especial. A dor e o sofrimento são incontornáveis e negar essa dor poderá mesmo trazer mais transtornos do que encará-lo, chorando e reencontrando aos poucos o equilíbrio emocional que se pretende. Um "luto normal" pode levar até cerca de 2 anos, e em algumas situações mais, e consideramos que o luto está feito quando conseguimos voltar a criar laços e a dedicar-nos à vida, lembrando-nos de quem partiu com tristeza, mas sem nos devastar emocionalmente, ou seja, quando conseguimos adaptarmo-nos a essa ausência. Sublinho aqui a ideia de processo, com diferentes fases e emoções, não é algo que arrumemos numa caixa, mas sim um sentir que vai evoluindo e que de alguma forma nos permite aos poucos encontrar um novo espaço emocional e até, muitas vezes, um novo propósito.

Na nossa sociedade, vivemos um tempo corrido e muitas vezes tendemos a evitar ou negar algumas dores necessárias. O tempo de parar e chorar são fundamentais para encontrarmos um novo sentido e naturalmente todo o bem-estar. Perceber e integrar a ausência leva tempo e nem sempre na nossa cultura ocidental tal é considerado. Muitas vezes falamos em ‘fugas para a frente’, quando se procura contornar ou passar por cima de uma dor que não é confortável (nunca é confortável). Assim, reforço a ideia de lidar com as emoções que surgem, integrando esta perda, e assim – tal como parece estar a fazer – aos poucos vai encontrando uma nova forma de estar e de se relacionar. É importante não confundir de forma precipitada aquilo que é a dor normal de um luto, decorrente de uma ausência no mundo relacional, daquilo que se cristaliza como uma depressão, em que há um sentimento de vazio interior que não passa ou que até, meses depois, é agravado. Nestas situações, pode ser de grande ajuda um profissional de psicologia de modo a gerir e resolver este turbilhão emocional que muitas vezes acontece.

Relativamente às pressões sociais, muitas vezes tão bem intencionadas, relacionam-se com o tal tempo de uns e de outros, nas diferentes sensibilidades. Para nos sentirmos livres para viver uma vida plena, é fundamental fazer os lutos das nossas perdas. Contrariando muitas vezes um ritmo de uma sociedade que tende a não valorizar tanto o sentir, e convidando tantas vezes a continuar a correr. Desta forma, face ao que expõe, nada indica ser "anormal" considerando um típico processo de luto mas, naturalmente, só a Rita o saberá. Se considerar que não está a gerir as suas emoções da melhor forma, deixo a sugestão de visitar um profissional de psicologia, com quem poderá aprofundar o seu sentir.

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