A conversa com o músico é tão surpreendente como as suas composições. Rica e ao mesmo tempo simples. Leve mas repleta de conteúdo.
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15 minutos com... Tiago Bettencourt
06 de março de 2013 às 08:00 Máxima
São 10 anos de carreira e para comemorar um novo álbum, Acústico, com as músicas preferidas do público. Excelente pretexto para pôr em prática um projeto de longa data: entrevistar Tiago Bettencourt e conhecê-lo melhor.
O tempo passou a correr. Imaginava chegar até aqui?
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Não parecem nada 10 anos. Comecei na música quando tive a primeira banda. Não tive aquela fase de tentar, lutar e tal. Ganhámos um concurso para novas bandas e o prémio era tocar no Garage. Nunca tínhamos tocado ao vivo. Era o nosso primeiro concerto e tivemos logo propostas para gravar.
Quando começou, o que esperava?
Estava à espera de divertir-me um bocado e depois voltar para a Arquitetura, para o atelier onde ia estagiar.
PROSA E POESIA NA PRIMEIRA PESSOA
. Muitos poetas influenciaram-me, como, por exemplo, Sophia de Mello Breyner, Florbela Espanca, David Mourão-Ferreira, Ary dos Santos, entre outros, que musiquei num projeto que fiz chamado Tiago na Toca.
. Qualquer poeta que respeite a sua língua é influência para mim.
. Leio muita poesia, faz-me muito bem.
. Há autores que pela sonoridade e ritmo nos fazem escrever de imediato. Outros nos servem mais para absorver.
. Se calhar, ler uma crónica do António Lobo Antunes é uma coisa que tem um ritmo qualquer que me apetece escrever de seguida.
. Por outro lado, Tolstói, que li por não sei quanto tempo e adorei, não é coisa que eu acabe e comece a escrever.
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. Muitos poetas influenciaram-me, como, por exemplo, Sophia de Mello Breyner, Florbela Espanca, David Mourão-Ferreira, Ary dos Santos, entre outros, que musiquei num projeto que fiz chamado Tiago na Toca.
. Qualquer poeta que respeite a sua língua é influência para mim.
. Leio muita poesia, faz-me muito bem.
. Há autores que pela sonoridade e ritmo nos fazem escrever de imediato. Outros nos servem mais para absorver.
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. Se calhar, ler uma crónica do António Lobo Antunes é uma coisa que tem um ritmo qualquer que me apetece escrever de seguida.
E voltou?
Não! [Risos] A profissão de arquiteto não é bem aquilo que se acha no curso. Tem muito a parte técnica, a burocracia. Não me vejo num atelier. Acho que ia aguentar um bocado e depois desistia. Mas tenho muitas saudades de projetar, de desenhar e continuo a informar-me.
O que mais gostava em Arquitetura?
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O facto de ser a junção de várias artes. E um aspeto seduzia-me: a maneira como o tempo passa pelas coisas, a forma como um edifício envelhece, como a pessoa vai vivendo a casa e a vai gastando, como se a casa fosse uma tela.
E o que ganhou com a mudança?
Ganhei uma porta muito engraçada para falar com as pessoas. Antes usava a música para exorcizar, para relaxar e descansar a cabeça. A partir do momento em que isso se torna público, ganho uma espécie de lugar privilegiado que me permite entrar por uma porta que as pessoas não estão à espera. A música tem esse poder. Pode entrar de repente e passar a fazer parte da vida de uma pessoa. Isso é um privilégio gigantesco. Ganhei isso. E ganhei, se calhar, um bocado de humildade. Tem a ver com essa coisa do sucesso. Uma pessoa que tem sucesso ou se sente um bocadinho mais pequena ou se sente a maior do mundo. A mim aconteceu sentir-me um bocadinho mais pequeno. Sinto-me mais responsável do que fascinado.
Quando descobriu a música?
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Tive aulas de piano quando era mais novo, depois parei. A primeira guitarra que tive foi aos 16 anos. Tocava com amigos e tocava músicas de outras pessoas. Só quando fui para a universidade e conheci o Pedro Puppe, dos Oioai, que me convidou para fazer uma banda, é que comecei a escrever. Escrevi e compus pela primeira vez já para a banda que viria a ser os Toranja.
Foi uma descoberta?
Sim. Foi engraçado. Senti como se estivesse a acumular coisas a minha vida toda para aquele momento. Tudo saía com uma grande facilidade. Acho que era mais fluido do que é hoje. Mas eu também era menos autocrítico do que sou hoje. As coisas saem, mas até eu as escolher para fazer uma música ou fazer um texto exige um bocadinho mais de mim. Na altura, tinha uma liberdade gigantesca. Não tinha nada para comparar ou para provar.
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Com tantos artistas nacionais da sua geração a cantar em inglês, cantar em português era importante?
Muito importante e foi uma coisa natural para mim. Estranho era cantar em inglês. Não acho estranho a pessoa ter uma carreira internacional e cantar em inglês. Fazê-lo em Portugal é estranho. Era a mesma coisa que estarmos a ter esta conversa em inglês. Na altura, havia muitas bandas a cantar em inglês. Os Ornatos Violeta tinham acabado e a cantar em português havia os Clã, os Mesa e pouco mais. Talvez por isso tivéssemos sido uma coisa tão diferente na altura.
Se é melhor, não sei. A verdade é que Portugal não sabe exportar como, por exemplo, o Brasil. Tenho uma pena gigantesca de não ter apoios. Fiz uma digressão com Los Hermanos e foi muito giro. Mas não somos milionários. Tem de haver projetos, apoios. Se calhar, há miúdos a cantar em inglês porque acham que essa é a sua porta de saída.
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E de onde vem a maneira como joga com as palavras nas suas letras?
Comecei muito cedo a ouvir fado. Não o fado castiço (embora haja letras castiças muito boas), mas o fado dos bons poetas. Daí fui buscar muitas influências em termos de sonoridade, métrica, divisão das palavras.
Pode também ter a ver com o Jacques Brel, a maneira como diz as palavras, como canta quase a falar. Ou o Bob Dylan. Tem a ver com a atitude perante a música. Tento não trocar o som das palavras por estar a cantar. Não vou fazer a minha voz de canto para cantar. Uso a minha voz normal.
A INFLUÊNCIA MUSICAL
. O fado é um influência inegável.
. David Bowie, Bob Dylan, Tom Waits e Jacques Brel também marcaram a sua forma de cantar e de compor.
. E para quem cresceu a ouvir e tocar grunge, Nirvana, Pearl Jam, Sound Garden, Smashing Pumpkins tiveram também um papel importante na construção do artista.
. Atualmente, Tiago Bettencourt juntou-se a Fred, baterista dos Buraka e dos Orelha Negra, e produz os Miúda, "uma banda assim meio eletrónica". Com isso, começou a ouvir mais música eletrónica. "Tenho gostado imenso de descobrir essa vertente da música", comenta.
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. O fado é um influência inegável.
. David Bowie, Bob Dylan, Tom Waits e Jacques Brel também marcaram a sua forma de cantar e de compor.
. E para quem cresceu a ouvir e tocar grunge, Nirvana, Pearl Jam, Sound Garden, Smashing Pumpkins tiveram também um papel importante na construção do artista.
No início foi uma opção racional?
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Foi um bocado imediato. Não pensei como queria cantar. Tinha a ver com o que eu e o Pedro Puppe ouvíamos. Era a época dos Smashing Pumpkins, dos Pearl Jam, dos Coldplay.
Às vezes, as bandas têm esse percurso intelectual antes de começar a fazer música – que eu acho um erro –, pensar: “Queremos soar como isso, pois é o que está a soar cool.” Deixa de haver ali qualquer coisa de original. É bom ter influências, mas é bom sabermos soltar-nos e encontrar algo de original.
Qual é o seu maior prazer?
Dar concertos. Isso porque já há muito tempo que não o fazemos.
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E do que é que mais gosta quando está a dar um concerto?
Sentir que as pessoas estão comigo. Perceber que não estamos sozinhos.
Já tivemos situações em que tocámos para públicos estranhíssimos que não sabiam muito bem o que estávamos ali a fazer. Isso já não acontece. Foi mais na época dos Toranja, pois chegaram a um público que não era propriamente o nosso. Fomos a sítios onde não devíamos ter ido, com cartazes tipo: Emanuel, Tony Carreira e Toranja. Não havia empatia.
É um rebelde?
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Não, sou um betinho [risos].
E quais são os próximos passos?
Agora é começar a perceber o que é que estou aqui a fazer. Estou sempre ansioso para fazer um CD de originais. Portanto, logo que puder vou para estúdio gravar mais um. E, se Deus quiser, também vou fazer mais um Tiago na Toca. E vou continuando a tentar superar-me.
1 de 6 /15 minutos com... Tiago Bettencourt
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2 de 6 /Atualmente, o músico juntou-se a Fred, baterista dos Buraka e dos Orelha Negra, e produz os Miúda.
3 de 6 /"Acústico", CD comemorativo dos 10 anos de carreira.