O petit amour da Hermès está em Lisboa
Lisboa recebe, até 29 de setembro, um dos projetos mais queridos à Casa Hermès: o Petit h. Neste pequeno ateliê, o savoir-faire e a criatividade unem-se na conceção de objetos únicos. Antes de o Petit h vir a Lisboa, a Máxima foi a Paris conhecê-lo, em exclusivo, e conversar com o novo diretor criativo, Godefroy de Virieu.

Será verdade que é nas pequenas ideias que se escondem as maiores surpresas? A Hermès pode comprovar essa teoria com o seu ateliê Petit h, um projeto pensado por Pascale Mussard, bisneta de Émile Hermès, com o objetivo de reunir, num só espaço, três dos elementos-chave do universo Hermès: a excelência da mão-de-obra, os materiais de alta qualidade e artistas que utilizem ambos para desafiar os limites da criatividade. Assim nasceu o Petit h, em 2010. No espaço que a Hermès possui na zona de Pantin, em Paris, a letra h espalha-se no chão dos corredores como que indicando o caminho para um pequeno ateliê com entrada ensolarada, a casa do Petit h. E a Máxima esteve lá dentro.
Num espaço onde se acredita não haver impossíveis e onde impera a criatividade, há que referir que a organização é fundamental. Ali, artesãos especializados da Hermès unem-se a artistas convidados para criarem peças únicas que têm sempre como ponto de partida os materiais que sobraram das coleções Hermès. No coração deste ateliê situa-se uma ampla sala e o espaço é definido por bancadas onde os artesãos trabalham diferentes projetos e materiais. Logo à entrada, o olhar e o olfato não resistem às estantes que acumulam, em altura, rolos de peles em diferentes cores e texturas, a matéria-prima com que a Hermès faz magia, tanto nos acessórios de moda como nas peças equestres que são a essência da história da marca. Mesmo ao lado, uma estreita porta convida a uma espreitadela indiscreta e, afinal, trata-se de uma sala onde inúmeras ferragens, que em coleções passadas adornaram carteiras e sapatos, estão organizadas em caixas como se fora uma loja. Numa outra sala, pilhas de lenços em seda aguardam projetos que lhes permitam exibir as suas cores e padrões e, numa vitrina, algumas peças em cristal e em porcelana lembram que também estes materiais fazem parte da matéria-prima deste ateliê. Embora o espaço não seja demasiado grande, passear entre as bancadas é como um labirinto recheado de máquinas, de ferramentas e de experiências que estão a ser feitas em materiais e processos que já deixam perceber o trabalho final, como a colocação de cera em asas de carteiras. Uma pequena sala guarda as peças já acabadas, como se fosse um cofre onde as preciosidades só são manuseadas com luvas. Afinal, cada um destes objetos é uma peça de designer. E é única. Aqui não se aceitam encomendas, nem projetos pré-concebidos. É sempre nos materiais que está o ponto de partida. A loja Hermès, na Rue de Sèvres (ver em baixo: Na rota do luxo), é o ponto de venda fixo das criações Petit h, mas, de vez em quando, a marca francesa surpreende os clientes e admiradores incondicionais e leva o Petit h em viagem para vendas efémeras em lojas fora de França. Entre 6 e 29 de setembro, será a vez de Lisboa receber este projeto tão especial para a marca. O primeiro andar da loja Hermès, situada no número 9 do Largo do Chiado, foi transformado num cenário da autoria de Joana Astolfi, habitualmente responsável pelas montras da loja. Godefroy de Virieu sucedeu a Pascale Mussard como diretor criativo do Petit h, em janeiro deste ano, e refere que apenas três dias depois de assumir o cargo ficou a conhecer a equipa portuguesa. Acredita que o mais importante destas viagens é conhecer designers e cenógrafos que ajudem a dar sentido a cada visita porque, depois de Lisboa, o Petit h estará em Hong Kong, de 16 de novembro a 9 de dezembro, e em maio será a vez de Chengdu, na China. Antes do Petit h viajar para Portugal, a Máxima esteve em Paris para conversar com Godefroy de Virieu e para conhecer o projeto pelas palavras do seu novo mestre e perceber o que nos reserva a passagem por Lisboa.
O que é o Petit h, nas suas palavras?
Primeiro, eu quero dizer que é uma ideia de Pascale [Mussard]. E é uma ideia maravilhosa, esta de trazer para um mesmo espaço materiais da Hermès que já não são usados, dar espaço aos artesãos e pedir a criativos, a artistas e a designers para virem ver estes materiais e começarem um diálogo com os artesãos só para imaginarem novos projetos. Esta é a receita. O material, mais o artesão, mais o artista/designer. É mesmo como uma receita e estes três ingredientes são os mais importantes. Pascale tem a mente aberta no seu interesse por tudo e, por isso, convidou muitos artistas (cerca de 100). Mas eu não os conheço todos. Estou aqui há seis meses e comecei a encontrar-me com os artistas para ver o que fizeram e o que propuseram e como podemos começar a trabalhar nessas ideias. Às vezes fazem-se alguns ajustes, pedimos aos artistas para virem ao ateliê e depois eles regressam a casa e pensam nos projetos. Foi isso que fiz, há dez anos, quando conheci a Pascale. Para mim, é muito importante dar direções a estes artistas. Em cada ano iremos contar uma história relacionada com algo da vida quotidiana e a ideia de objetos simples que são compreendidos por toda a gente. No próximo ano estaremos com outra história.
Quem são as pessoas que trabalham aqui?
Aqui na oficina são os artesãos. Mas também há artistas que nos visitam todos os dias. Também há a equipa da organização que trata as vendas em outros países. E igualmente em Paris, porque há um local principal para o Petit h que está situado na Rue de Sèvres, a única loja onde o Petit h está em permanência. Na Rue de Sèvres mudamos a apresentação sete vezes por ano, nas montras e na loja.
Os artistas vêm aqui falar com os artesãos e vê-los a construir as peças?
Sim, esse é o objetivo principal. Isso é o que a Pascale queria manter e tem razão, porque se o ateliê e a criação estão separados há uma grande perda entre os dois. Esta é a solução perfeita para a criação e é por isso que ela teve esta ótima ideia.
Isto é um luxo e não acontece muito?
Não, eu nunca vi nada assim em outras grandes marcas.
O que acontece às peças depois de terminadas aqui? O que vem a seguir?
As peças são vendidas. Vão para a loja da Rue de Sèvres e para lojas no estrangeiro, como Lisboa e Hong Kong. Depois iremos para Chengdu [na China], para Singapura e para a Austrália… Enfim, por todo o mundo. Para mim, o que é importante nas histórias de ir a países estrangeiros não é apenas a deslocação. Por exemplo, quando vamos à China e conhecemos os cenógrafos [responsáveis pelas montras] que estão a começar muito jovens, quero que eles proponham objetos, quero que as pessoas do país para onde estamos a ir tenham uma ideia do Petit h. Cruzar o know-how da China com o do Petit h, criando novas possibilidades de objetos.
Porquê Lisboa?
Lisboa acontece porque eu cheguei em janeiro e conheci logo a equipa portuguesa e foi muito bom. Acho Lisboa a cidade perfeita para esta exploração.
Vão estar pessoas a trabalhar para o público poder ver?
Sim! Quando nós nos deslocamos a outros países com o Petit h vamos sempre com uma artista que trabalha para ele e que se chama Isabelle Leloup, cabendo-lhe organizar workshops, usar os materiais da Hermès e explicar como se constroem objetos simples. Ela vai lá estar como artista, mas não irá haver artesãos.
O que é que mais o atrai na história desta marca?
O know-how, a perfeição, a inteligência das mãos, dos olhos e da cabeça dos artesãos porque são inteligentes e encontram sempre a solução. Eles envolvem-se nos projetos e não se limitam apenas a concretizar. Cada vez que falamos com eles é um verdadeiro prazer porque criamos algo.
Como começou a sua relação com a Hermès?
Foi há muito tempo. Eu saí da escola de design e tornei-me designer industrial. Fui ver pequenas fábricas e pequenos produtores e uma vez numa feira conheci a Pascale e começámos a falar sobre as nossas paixões, no que diz respeito ao trabalho artesanal e de criar com os artesãos. Então convidou-me para trabalhar com ela num projeto de equitação, na Hermès. Desenhei coisas muito simples que foram concretizadas. Depois começámos a falar e continuamos em contato e a trabalhar em várias coisas. Quando ela decidiu começar o Petit h convidou-me para iniciar a história com ela e com outros designers. Éramos uma equipa muito pequena com cinco artistas…
Quais são as peças mais espantosas que já viu aqui?
Quando nos viramos e cada vez que paramos dois minutos para falar sobre um projeto, vamos achá-lo bonito. E é isso que eu quero… Eu quero que cada projeto que nós fazemos tenha uma história. Isto é o cerne do Petit h e é muito transversal reunir todos os materiais da Hermès para revelar novos projetos. Acontecem misturas, faz-se luz sobre coisas diferentes e há novas ideias. Para mim, "não há objeto sem objetivo" e o que é realmente importante é a utilidade dos objetos que fazemos. Todos os objetos do Petit h têm de ser úteis e isto é muito importante porque se seguem as regras da Hermès.
A sustentabilidade é um tema importante na Moda, neste momento. Podemos dizer que o Petit h é um bom exemplo porque dá uma segunda vida aos materiais?
Eu considero que é um caso de bom senso. Eu dou sempre este exemplo: quando vamos ao ateliê de um carpinteiro que vai construir uma mesa, ele tem madeira para fazer as pernas e o tampo, mas vai sempre ter pequenos pedaços e aí está a solução – ele não olha para estes pedaços e deita-os fora, mas vai aproveitá-los para fazer outras coisas. É essa a história e o bom senso de um ateliê. Não se deita fora… Guarda-se para fazer depois alguma outra coisa. É isso que acontece em todos os ateliês da Hermès, com a porcelana, a seda, o cristal… Porque havemos de deitar fora? Vamos usar depois. Nós não fazemos reciclagem. Não é essa a ideia do Petit h. É dar um novo olhar aos materiais e a maioria deles são muito bonitos.
Na rota do luxo
As peças realizadas no Petit h têm um local de venda fixo: a loja Hermès, no número 17 da Rue de Sèvres, em Paris. Toda a entrada desse espaço está decorada segundo o tema que é explorado, este ano, no exclusivo ateliê com os respetivos objetos em exposição. Além das criações Petit h, essa loja merece uma visita porque ocupa o espaço da antiga Piscina Lutetia, que esteve ativa entre 1935 e 1979. A Hermès manteve o projeto original e recuperou o espaço, juntando aos azulejos em quadradinhos, que cobrem todo o chão, uma escadaria e casulos gigantes em madeira para "aquecer" o espaço e torná-lo mais confortável. A loja abriu em 2010 e é uma verdadeira visita pelo deslumbrante universo Hermès.
