
Preciso de ajuda com a ansiedade que estou a sentir desde que deixei a minha mãe num lar. Tenho 55 anos, sou divorciada com dois filhos ainda a meu cargo, e após 4 anos a cuidar da minha mãe em casa, sinto que cheguei ao meu limite. Sou professora universitária, investigadora e sempre tive uma vida muito ativa e viajada. A minha mãe sempre me deu muito apoio e mostrou grande orgulho. Eu fui a sua única filha. Tínhamos uma ótima relação. Era muito autónoma, mulher da aldeia, sempre ativa na comunidade com múltiplas relações quer entre vizinhos, quer na igreja onde dinamizava projetos de apoio à comunidade. Antes tinha sido professora na escola primária. Era muito querida lá, e entre nós. Com a demência a avançar, tivemos de trazê-la para Lisboa… pela primeira vez a viver num apartamento. Tentávamos ir com regularidade ao fim-de-semana à aldeia, mas depois as coisas foram agravando. Ficou acamada. Felizmente consegui ter algum apoio, contratando uma pessoa durante o dia. À medida que a saúde da minha mãe degenerava, eu e os meus filhos tentávamos organizarmo-nos… até que uma noite caiu da cama e teve de ir para o hospital. Chorei muito de raiva e fiquei com muitos medos. Não podemos dar o apoio que ela necessita. O lar é ótimo mas… sinto que devia continuar com ela. Sei que não posso dar-lhe a resposta, nem mesmo se parasse totalmente de trabalhar (o que seria incomportável e as exigências na faculdade são cada vez maiores). Tenho pesadelos, sinto vergonha pelo que fiz. Por mais visitas que faça, de passeios que dê com ela… sinto-me a falhar como filha. Teresa, Lisboa

Cara Teresa, antes de mais quero felicitá-la pela relação positiva que co-construiu com a sua mãe ao longo da vida. O orgulho que ambas têm tido uma pela outra parece ser verdadeiramente especial. Percebo que manteve apoio à sua mãe ao longo da vida, e mesmo quando a trouxe para a sua casa, teve o cuidado de manter alguma ligação à aldeia. Certamente que tal terá contribuído para muito bem-estar e paz da sua mãe. O envolvimento dos filhos neste processo de apoio é também muito positivo.
A falta de saúde de um familiar coloca sempre múltiplas questões a todas as famílias, sobretudo quando temos de enfrentar processos degenerativos tão comuns no processo de envelhecimento. Os processos de demência são sempre desafiantes e, como sabemos, têm apenas um sentido. Muitas famílias procuram dar apoio em casa e a decisão de encaminhar os nossos idosos para lares é sempre uma decisão limite, não raras vezes com culpa. Esta culpa é maior quando há uma relação próxima e ligada, como parece ser o vosso caso. Alguns filhos experimentam um sentimento de traição a esse amor alimentado ao longo da vida. Não podemos identificar boas e más escolhas, sabemos sim que os filhos tentam fazer o melhor que sabem e podem.
Não raras vezes o envelhecimento dos pais coincide com a adolescência dos filhos, ficando estes como ‘ensanduichados’ entre duas gerações que precisam de atenção e cuidado. Suponho que nestes cinco anos sentiu esse desafio. Stress acumulado, exigências profissionais e muitas exigências de um idoso sem saúde, em casa, sem dúvida que implica ansiedade e nessas alturas encontrar uma solução alternativa torna-se muito desafiante. Como filha única, o lar foi uma opção possível e (felizmente!) encontrou uma instituição na qual parece confiar. Isso é importante.
Todavia, e não obstante ter sempre procurado dar a melhor resposta que encontrou ao seu alcance, a ansiedade parece manter-se. Quais as suas maiores preocupações e medos? Identificar o que neste momento é sentido como problemático pode ajudar. Procure concretizar ao máximo, escrevendo as inquietações que sente no momento e para cada uma delas, procurar possíveis soluções. Veja as possibilidades atuais e prós e contras dessas possibilidades. Veja o que depende de si e o que não está ao seu alcance. Qual a melhor solução para a saúde e bem-estar da sua mãe? Como pode de algum modo manifestar o afeto que sente? Como celebrar os pequenos feitos da sua mãe? Como otimizar as visitas que faz? Conversa com a sua mãe sobre o que sente por ela? Partilha histórias de bons momentos que tiveram juntas? Mesmo em fases em que já não é claro que compreenda, pode fazer bem a ambas. Como gostaria a sua mãe que estivesse a gerir esta fase? O que acha de escrever-lhe uma carta (mesmo sabendo que nunca vai ser lida), agradecendo o bem que a sua mãe lhe trouxe? E por que não ler-lhe em voz alta numa das visitas, olhando para os seus olhos e ou tocando na sua mão? Se considera que alguma destas possibilidades pode acrescentar, trazendo mais paz neste processo, experimente!
Aceitar a opção que fez é um primeiro passo para poder ainda cuidar de si – o seu bem-estar vai também influenciar a forma como continua a gerir esta fase familiar.Neste sentido relembro a importância de ter momentos para si, que a ajudem a relaxar (que não um foco exclusivo no trabalho ou tarefas de casa). Que a atividades podem ser? Cuida dos seus sonos e alimentação? Mantém contacto com outros familiares e amigos? Que momentos de partilha mantém com os seus filhos? É tempo de aceitar esta nova realidade, em que a mãe perdeu autonomia e que possivelmente os cuidados de que necessita não passam por continuar em casa da Teresa. É preciso gerir emoções para aceitar a situação, aceitar a sua opção e dessa forma conseguir seguir com a sua vida individual e familiar, incluindo esta nova relação possível com a mãe, considerando as circunstâncias efetivas do momento.
Por vezes a ansiedade permanece, bem como a culpa e a agitação interior. Poderá ser tempo de procurar um psicoterapeuta, criando um tempo em que pode resolver estas questões emocionais e dilemas da vida, abrindo espaço para mais bem-estar interior e relacional.
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