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Detox Digital

Spoiler: deixei de fumar há seis meses e foi mais fácil do que desligar o telemóvel por 24 horas. Mas igualmente benéfico.

27 de fevereiro de 2017 às 07:00 Máxima
Sabem aquele tipo de pessoas que proclamam, descontraidamente, "ups, esqueci-me do telemóvel em casa"? Que fique bem assente que não sou uma delas. A par de aparecer um tubarão por baixo daquele monte de algas escuras na praia (não perguntem), sair sem trazer o iphone é um dos meus piores pesadelos. Há todo um ritual: acordar, atingir com a luz do ecrã os meus olhos ainda entreabertos, fazer uma ronda entre Facebook, Instagram, e-mail, snapchat em dias bons, seguir para o banho com música a tocar, maquilhar-me com música a tocar, tomar o pequeno almoço enquanto passo os olhos pelos sites de notícias, vestir-me com o iphone em cima da cama, preparar-me para sair, verificar 3 vezes se tenho o telemóvel no bolso do casaco, por os phones e sair. Qual é a primeira coisa que faço quando saio à rua? Exato. Bom, esta não seria a forma como eu me descreveria até um dia atrás, quando, nas vésperas de fazer esta experiencia arriscada, observei o meu comportamento matinal. Não, não melhora ao longo do dia. Gostava de pensar em mim como alguém não dependente da tecnologia (essencialmente do telemóvel) mas estaria a enganar-vos e a mim própria (às minhas amigas e ao meu namorado já não engano). Ia jurar que não responderia iphone à pergunta ‘o que levaria para uma ilha deserta’.
Mas antes de partir para aquele que me pareceu um dia muito, muito longo, decidi conhecer as regras do jogo... online, claro. Devo anunciar ao mundo a minha decisão ou é batota? Escolho estrategicamente um dia com poucos afazeres para ficar off? Pelo bem da minha sanidade mental avisei os parentes próximos e algumas amigas, sem grandes pormenores. "Se amanhã tiver o telefone desligado não estranhes…". Depois, comecei a planear o dia: um belo passeio à beira mar, adiantar algumas páginas de The Great Gatsby, que já não sei porquê parei a meio, talvez uma corrida? De repente, parecia que o telemóvel além de ocupar espaço ocupava… tempo?! Segundo as leituras, alguns dos ‘sintomas’ de um detox digital incluem maior estado de mindfulness e menos ansiedade, duas coisas que estão há demasiado tempo na minha to do list (e duas das mais difíceis de realizar, claro. Fazer dieta, comparativamente a atingir uma mente sã, é fácil).
Long story short, o dia, apesar de difícil, correu sem grandes percalços. Não me perguntem porquê mas cheguei ao fim do dia com uma sensação de liberdade. Num dos livros que estou a ler (já disse que li imenso hoje?) diz que se pode dever ao poder do minimalismo - e não estou a falar da tendência de Moda. Em Menos é Mais, de Francine Jay, ajuda-nos a perceber que precisamos de muito menos objetos do que somos levados a acreditar. E o telemóvel é bem capaz de ser um deles. Outro, Mindfulness no dia a dia, de Padraig O’Morain,  ensina a incluir  pequenos rituais de mindfulness no dia a dia. Uma das dicas? Praticar a atenção plena numa das habituais atividades matinais (tomar banho por exemplo: sinta a água, o champô, a textura da espuma, o cheiro,  o toque, por ai fora está a ver? Resulta a deixar os pensamentos debaixo de água).  Outro dos meus momentos preferidos de mindfulness? A hora da refeição. E que bem que me soube o almoço tailandês – e todos aqueles sabores e cores e picante - sem a paragem de digestão provocada pelo toque do telemóvel.
Fazer o jantar sem a chave de receitas digital da Bimby (na qual me viciei no espaço de 4 meses, claro) também foi, no mínimo, interessante… Serviu para dar uso aos livros que acumulo na prateleira da cozinha (mais por serem giros do que outra coisa) e uma última oportunidade ao arroz integral. Conclusão: ninguém passou fome. O mais curioso nestas 24 horas é que cada vez que pensava em pegar no telemóvel (e a bem da verdade não foram poucas vezes) o meu cérebro acendia com uma ideia alternativa. E, na maioria, muito mais interessante. Passei mais tempo com o meu cão. Dei atenção ao percurso de todos os dias de casa à estação, tive paciência para voltar a usar o ferro de encaracolar cabelo. Toquei à porta da minha mãe e fiz-lhe uma surpresa. Se não podia ter feito exatamente as mesmas coisas com o telemóvel ligado? Poder, podia, mas não seria a mesma coisa…
A verdade é que há alturas em que reviro os olhos quando recebo uma chamada. O meu coração acelera a mil com o barulhinho do email. Controlo de hora em hora o estado de bateria como se se tratasse de um caso de vida ou de morte. Também me lembro daquele voo de 11 horas para o Brasil onde dormi o tempo todo (a minha cabeça parecia cansada. Porque seria?!). Tudo isto (quero dizer, o dia de hoje) põe as coisas em perspetiva – ou então é só a ressaca do digital a falar. Será mesmo um email capaz de mudar a nossa vida? Temos mesmo de estar disponíveis para toda a gente a todo o momento? Uma coisa sei: quero manter o telemóvel ainda mais vezes no silêncio e afastá-lo da mesa de refeições e da cama. Talvez um dia ganhe coragem e embarque numa aventura destas. Que me perdoem os nicotina addicts, mas as minhas preces a partir de hoje estão com outra tribo: a dos offliners.

Por Patrícia Domingues

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