E quando nasce um filho com deficiência?

Violeta, 65 anos, Almada.

23 de setembro de 2015 às 11:42 Dra. Catarina Rivero

O meu filho teve um bebé há seis meses que se verificou sofrer de deficiência… não era esperado e entrámos todos em choque. Mas todos nos temos vindo a adaptar, exceto a minha nora. Mostra-se muito abatida e reativa connosco, avós. Penso que não está a conseguir lidar com a situação, e já não sabemos o que fazer para ajudar. Gostava de saber a sua opinião. 

Cara Violeta, desde já agradeço a partilha e lamento a dor que a família está a passar. É importante, antes de mais, estarem atentos às necessidades de cada familiar envolvido, de forma a garantir o bem-estar de todos e cada um.

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Todos os pais sonham com filhos perfeitos e bem integrados e aceitar uma doença ou incapacidade crónica pode levar meses ou anos. Os pais precisarão de espaço e de suporte, que deverá ser gerido por familiares e amigos, em comunicação aberta e respeitando as necessidades de cada um dos pais, eventuais irmãos e, claro, da criança em questão. O processo de aceitação de um filho com desenvolvimento atípico, seja a nível físico ou cognitivo, ocorrerá num tempo próprio. Será o tempo de um luto de um ideal, que não raras vezes passa por fases de negação, raiva, tristeza, adaptação, até chegar à aceitação (e as fases podem oscilar de forma intermitente). Os pais podem tender a negar as evidências, mesmo quando a informação sobre a cronicidade da situação é muito clara, sendo que esta negação pode levar a que os pais não partilhem ou falem da dor, das dúvidas, dos medos, que se isolem… o que pode comprometer o bem-estar de todos. Pode haver períodos de raiva e revolta ("porquê a mim?!") e mesmo dirigidos a outros familiares ou profissionais. A tristeza é uma reação natural (e não deve ser confundida com depressão) e que, se vivida de forma adequada, pode ajudar a um reajustar emocional, necessário nesta fase. No seu tempo possível, os pais compreendem que há necessidades próprias daquela criança que têm de ser atendidas, e entram na fase de adaptação. De modo geral, já fizeram o luto do ideal de bebé, para se adaptarem à realidade. Nesta fase há uma busca de informação, não para negar evidências, mas para melhor compreender e responder às necessidades. Tendem aqui a diminuir o isolamento, e inclusivamente tendem a procurar outras famílias com a mesma situação. Num percurso ótimo, os pais entram então no período de aceitação, em que lidam de forma realista o seu filho, e envolvem-se mais do ponto de vista emocional. Aqui o amor por esta criança floresce e aceitam-na totalmente como seu filho, celebrando os pequenos avanços possíveis no seu desenvolvimento. Mesmo que tenham momentos de tristeza, aceitam que também estas emoções são naturais na situação que estão a viver. São os pais que afirmam que este é o filho que querem acompanhar e fazer florescer.

Dependendo da dinâmica inicial do casal (e eventualmente com outros filhos e família alargada), podemos encontrar famílias que se isolam dos seus amigos, com sentimentos de vergonha, ou por "não quererem incomodar"; o mesmo pode acontecer em relação às próprias famílias de origem. Há ainda o risco dos irmãos com desenvolvimento típico serem passados para um plano secundário, pelos cuidados que precisam de dar ao filho com deficiência. Há porém situações em que os irmãos têm uma relação ótima com o irmão com desenvolvimento atípico e considera-se estar relacionado com a forma como a dinâmica dos pais com os filhos acontece, bem como a qualidade da relação conjugal. Não raras vezes, vemos ainda o casal a ser menos investido, concentrando-se todos os esforços na parentalidade (pode ser um excelente apoio, conseguir facilitar esse tempo a dois, em que o casal cuide do seu espaço de romance). De modo geral, numa vivência construtiva com a deficiência vemos muitas vezes que ambos os elementos do casal se envolvem ativamente no apoio e cuidados dos filhos, o que parece, de acordo com a investigação, ter impacto na satisfação conjugal. Ter uma criança Deficiência na família pode ser gerador de muito stress, trazendo consequências para todos os membros em maior ou menor dimensão, mas a harmonia familiar pode sempre acontecer.

São os pais que promovem a coesão familiar, com alguma flexibilidade na sua dinâmica, que demonstram maior resiliência - ou seja, estão mais disponíveis para se adaptarem tendo em conta as necessidades da criança com deficiência, sem desistir nunca, e que o fazem envolvendo toda a família "juntos iremos apoiar cada um de nós nas respetivas necessidades". Neste sentido da coesão, também os irmãos se sentem integrados, respeitados e amados. As suas necessidades são igualmente cuidadas com empenho, e a sua expressão de emoções promovida, de forma a garantir suporte. A sua socialização com outras crianças não é comprometida e, desta forma, acabam por naturalmente apoiar os outros irmãos, incluindo o irmão com desenvolvimento atípico.

Quando há uma criança com deficiência o desafio é sempre maior para toda a família. Os pais irão sofrer de forma diferenciada e procurar uma harmonia entre eles. Da parte da família alargada, como os avós e tios e/ou amigos, é fundamental o suporte, mas de acordo com o que os pais estão a conseguir receber. No tempo que todos irão descobrir.

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