O fascinante mundo dos encontros online

Já pensou em servir-se da Internet para encontrar o homem da sua vida? Assuma a curiosidade e leia o relato na primeira pessoa de quem ao longo de um ano experimentou o mundo virtual dos encontros amorosos.

O fascinante mundo dos encontros online
04 de outubro de 2012 às 06:58 Máxima

Durante um ano procurei na Internet “um homem para relação séria”. Inscrevi-me nos sites mais credíveis, conversei com muitos homens e saí, noite fora, com tantos outros. A maioria queria sexo, alguns ansiavam pela “princesa” e poucos precisavam de uma amiga. E, de repente, vi-me dependente daquela montra eletrónica com milhares de homens, acreditando que ali encontraria o príncipe, o companheiro ou apenas o parceiro. Tudo começa porque ansiamos, de facto, uma relação emocional, sentimental, amorosa ou sexual. As jovens adultas frequentam o ecrã eletrónico porque não encontram nas universidades, no emprego, ou no seu núcleo de amigos, o homem da sua vida. As divorciadas teclam por vingança. Enquanto a terapia da perda não surte efeito, as palavras delicadas, gentis, sensuais, que chegam do outro lado, aumentam a autoestima e criam a ilusão do encontro feliz. As mulheres solteiras, essas, veem na web o reduto da procura. É então que o desejo se transforma em adição e, quando damos por nós, o ritual de visitar diariamente o site, onde visualizamos caras bonitas, homens musculados, sensuais, conversamos ou fazemos sexo, torna-se uma escravatura, da qual só saímos com muita teimosia e, às vezes, sem o príncipe.

O desejo de uma relação emocional, sentimental ou sexual impulsiona a busca do homem ideal numa montra eletrónica que pode viciar...

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A prudência levou-me a investigar os sites de relacionamento mais seguros.

Das muitas oportunidades que o Google oferece, elegi, assim, o www.meetic.com e o www.be2.pt. Ambos exigem uma mensalidade. O valor médio é de 17 euros. Na qualidade de “membros”, temos acesso direto ao chat, a enviar e receber e-mails, o que nos permite uma comunicação mais direta e potenciada. Durante seis meses frequentei o www.be2.pt, influenciada pelo subtítulo “site de relacionamentos e encontros sérios”. Encontrei, aqui, o meu primeiro “homem”. Levei algum tempo... Talvez mais de 15 dias, mas nunca abdiquei das exigências a que me propunha: conhecer uma pessoa entre os 35 e os 55 anos, licenciada, fisicamente apetecível, culta, amante de caminhadas.

Pedro, o meu primeiro contacto, é professor universitário, gosta de literatura, sobretudo de poesia. Parti, então, para a marcação do encontro pessoal. Sabia que Pedro era um homem sensível e educado. Fui “musa” de muitos poemas e, com eles, viajei por mundos de extrema sensualidade. Recebia todos os dias dezenas de sms tratando-me por “princesa”. Estavam criadas as condições para que o encontro resultasse.

Conhecemo-nos na Brasileira do Chiado, num dia quente de primavera. Pedro não era um homem bonito, mas criara no meu imaginário uma boa dose de ilusão. Vinha bem vestido. Não parámos de falar. Era preciso confirmar as informações que tínhamos um do outro: da história de vida, das profissões e dos propósitos. Pedro tem 50 anos e é divorciado. Pedro não tinha mentido acerca de si. Eu estava confiante e sentia-me uma “rainha”. O jantar foi amigável, respeitoso, até cerimonioso; correntes de vibração percorriam a linguagem corporal, de tal modo que, de facto, ambos concordámos na química, despedindo-nos com um “até já”. Entretanto, na caixa de correio de www.be2.pt, chegavam galanteios de outros candidatos ao meu perfil. Com Pedro, o contacto estava assegurado. Era impossível resistir a outros desafios.

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A Internet pode resultar num sucedâneo da solidão. É preciso saber gerir os sentimentos à distância e não acalentar expectativas vãs.

O universo da escolha está, aparentemente, a nossos pés.

Como dizia Kátia, também ela candidata ao homem ideal, “nisto dos relacionamentos eletrónicos, o melhor é conhecermos o maior número de homens possível e, depois, então, optar”. Kátia teve uma experiência dolorosa neste caminho de procura. Conheceu o homem da sua vida, um brasileiro a viver no Brasil, com quem, durante um ano, alimentou uma relação virtual. “Julgava saber tudo a seu respeito até que um dia ele desapareceu e eu entrei numa depressão profunda. Perdi, julguei, o homem da minha vida. Estava apaixonada, preparava-me para ir ao seu encontro, quando, de repente, caí na real”, conta-nos.

Como Pedro se ausentou de Lisboa durante um período, resolvi meter conversa com um especialista em museologia. A princípio, falámos horas através do chat. Parecia-me até uma pessoa interessante. Porém, percebi que era um homem angustiado, perturbado, vítima de uma relação anterior mal resolvida. Fomos ao cinema e almoçámos várias vezes juntos, mas o assunto teve o seu epílogo rapidamente.

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Ao fim de alguns meses, eu já conhecia bem alguns perfis, várias abordagens e, sobretudo, os tiques de linguagem utilizados. Conversei com Sandra, mulher experiente nestes assuntos, sobretudo para perceber as razões que estavam por detrás do facto de os homens rodarem pouco neste tipo de “sítios”. A galeria dos “pretendentes” mantinha-se quase inalterável desde o primeiro dia, e fazia já um ano que andava nestas andanças. Não teriam os homens encontrado, ainda, a mulher que desejavam? Ou a circunstância da maioria dos homens procurarem sexo tornava a sua permanência menos rotativa?

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Vem-me à memória a fugaz “relação” que travei com Alexandre, típico perfil de tarado sexual. A sua ficha dizia: “Alexandre M., gestor de empresas, atraente fisicamente, veste clássico, gosta de comida italiana, adora viajar, divorciado e sem filhos.” Alexandre não tinha fotografia no perfil e explica porquê: “O tipo de profissão que desempenho não permite.” Cá está um caso de quem esconde a verdadeira identidade. Piquei o perfil de Alexandre dezenas de vezes. Não percebi as razões pelas quais levou tempo a responder. Talvez o facto de ter lido a minha profissão na ficha criasse alguma insegurança, pensei. Um dia, porém, confrontei-me com as primeiras palavras que caíam no chat: “Tens câmara? Gostas de sexo? O que gostas de fazer?” Fiquei sem palavras. Nesse dia, não fui capaz de continuar o diálogo. Pensei como iria continuar a abordagem. Seria capaz de ter uma narrativa consistente? No dia seguinte, esperei pelas 22 horas, hora habitual para começar a planear encontros, e voltei ao contacto com Alexandre. Do lado de lá, as perguntas repetiam-se, pela mesma ordem e prioridades. Respondi, então, que não tinha câmara, mas que “gostava muito de sexo e, nessa matéria, não tinha nenhum preconceito”. Alexandre sentiu-se à vontade para continuar a conversa. “Então o que gostas mais de fazer?” “Tudo”, respondi. Alexandre, de imediato, propôs-me um encontro. Durante semanas a fio, todos os dias, Alexandre apregoava o mesmo refrão. Um dia, nauseada com o discurso, interrompi abruptamente o signatário, pedindo-lhe que nunca mais entrasse em contacto comigo. Devo ter sido tão eficaz que Alexandre desapareceu.

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O que pode, então, querer de um site de relacionamentos? "tentar aliviar a dor, a solidão, o desespero."

Outro dos meus pretendentes era um rapaz de 30 anos, obsessivo-compulsivo em sexo virtual. Mal a minha presença era assinalada no site vinha a pergunta: “Tens câmara?” Enquanto fui uma iniciada neste universo das relações virtuais, não percebia a intenção subjacente a esta interrogação. Houve um dia em que, enfurecida, o chamei à atenção para o facto de poder ser mãe dele. “Tenho 50 anos”, respondi. Ao que replicou: “Gosto de mulheres maduras.”

Sempre que não conseguia entender a realidade com a qual me confrontava, consultava Sandra. A sua experiência ajudava-me muito. Explique-me este assunto da câmara, indaguei. Sandra, perentória, afirmava: “Se tiver câmara faz sexo virtual.” Ah, sim, percebo, mas como? “De um modo muito simples: eles pedem para se colocar em frente à câmara despida ou com lingerie sexy, e daí à masturbação é um passo.” E depois?, perguntei. “Depois, nada, o assunto fica por aqui”, explicou Sandra.

O medo das doenças sexualmente transmissíveis leva muitos homens, sobretudo os que vivem carreiras internacionais, a praticar sexo virtual com assiduidade. No conforto dos quatros de hotel, e até nos seus gabinetes, engenheiros, gestores, advogados, informáticos, empresários recorrem a sexo virtual como higiene diária. A metáfora do ecrã é muito semelhante à realidade das ruas de Amesterdão. Tal como do nosso lado, aparecem milhares de galerias com todos os tipos de homens, do lado de lá, aparecem milhares de mulheres, cuja vida sexual está longe do padrão normal, se é que a sexualidade pode ser reservada a arquétipos fechados.

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Perguntei a todos os homens com quem falei quem estava do outro lado, que tipo de mulheres podiam encontrar, quais as suas motivações, o porquê da sua presença nestes meandros obscuros do relacionamento virtual. Francisco, o médico com quem mantive a mais longa e interessante “relação”, fez a síntese perfeita: “Brasileiras de todas as idades, portuguesas, sobretudo das classes média e média-alta, com mais de 40 anos, a grande maioria destas mulheres sós, divorciadas ou com profissões muito absorventes, suecas fascinadas em homens negros, africanas muçulmanas que querem deixar os seus países, russas e ucranianas vidradas em sexo, americanas seniores à procura de experiências na Europa.” Do nosso lado, a realidade, apesar de igualmente global, não apresenta estereótipos tão diversos. É verdade que a grande maioria dos homens é europeia: espanhóis, italianos, portugueses, nórdicos, muitos americanos, mas as suas motivações não se prendem maioritariamente com relacionamentos estáveis.

Ouso afirmar, sem ser possível recorrer a estatísticas, que a maior parte dos homens que se inscrevem em sites de relacionamentos amorosos querem, sobretudo, sexo, e apenas sexo, sendo estes, na sua maioria, casados; depois, vem uma percentagem, que anda algures entre os 5 a 10 por cento, que deseja, de facto, reconstruir as suas vidas, procurando uma companhia amorosa e há ainda um grupo de pré-divorciados, curiosos, que vieram apenas constatar a eficácia deste suporte digital.

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Durante este tempo encarnei várias personagens. Fui confidente, psicóloga, terapeuta e até vidente. Aconselhei o Carlos a ser prudente nas decisões que tomava sobre a sua vida amorosa, ouvi o Frederico chorar perdidamente pela perda da mulher que amava, conversei meses a fio com o Tiago, vítima de violência doméstica, e consegui que o Bruno fosse ao terapeuta tratar uma disfunção eréctil provocada por uma mulher manipuladora, autoritária e castradora. Mas não posso também deixar de vos dizer que fui vezes sem conta surpreendida por homens que amaram e amam muito, que adoram os seus filhos e por eles suportam inefáveis histórias de horror. Dois dos casos mais surpreendentes foram contados por dois economistas, ambos gestores de empresas. Tomás e Salvador, 32 e 37 anos, respetivamente, são vítimas de violência doméstica. Foram os únicos exemplos de pessoas com quem estabeleci contacto que procuravam apenas uma relação de amizade. O que eles precisavam e desejavam era apenas alguém com quem conversar via chat ou telefone. De preferência, um anónimo. Dispus-me a ser confidente. Ambos eram batidos pelas suas mulheres, psicologicamente manipulados, dependentes de bizarras práticas sexuais.

Surpreendentemente, um polícia esteve prestes a dar-me a volta à cabeça. Não fosse o facto de a sua vida ser pautada por um obscuro anonimato, ter ligações à maçonaria e eu nunca ter conseguido esclarecer a sua pertença ao SIS, e a esta hora estaria a contar-vos uma extraordinária história de sucesso. Conheci o Victor no Meetic, o mais prestigiado site nesta área. Falámos muito pouco através da Internet. Tínhamos o endereço de facebook, confirmámos as principais referências um do outro e combinámos rapidamente o encontro no Pavilhão Chinês, às 23 horas de uma sexta-feira. A conversa não foi simpática. Victor é alguns anos mais novo do que eu e o assunto, claro, veio à baila. A dada altura, dizia: “Sabes, nos homens, o tempo joga contra o sexo e a favor do amor.” Percebi a ideia. Não sendo um homem culto, Victor tem um pensamento racional e uma delicadeza de alma que souberam prender-me. A dada altura da conversa senti que entre nós o contacto físico era possível e desejável. Victor não procurava uma relação séria. Deixava-o transparecer no discurso e na postura física. Ele queria mesmo sexo. Nunca tive muito jeito para alimentar jogos de sedução. Nestas alturas mostro ostensivamente o meu desagrado. Mas, nesse dia, a minha personagem nãopodia fugir ao compromisso e não foi fácil distinguir a jornalista da mulher. Victor é um assíduo frequentador do Meetic. Manipula na perfeição os códigos sexuais e está habituado a ser rápido até porque em casa estava o filho e a mãe (leia-se, a mulher) e, portanto, o tempo estava controlado. Enchi-me então de coragem e perguntei-lhe: "Quando vai ao Meetic procura uma prostituta ou quer mesmo encontrar uma pessoa séria com quem partilhar a vida?" Nem uma coisa, nem outra, respondeu. O que pode, então, querer de um site de relacionamentos? "Tentar aliviar a dor, a solidão, o desespero."

SEIS REGRAS DE SEGURANÇA

1. Sempre que se encontrar, pessoalmente, com um homem, peça a alguém da sua confiança que a interrompa com um telefonema.

2. Nunca confie nas fotografias que ilustram o perfil da galeria: estão sempre desatualizadas.

3. Se o perfil do candidato não tem fotografia, não confie nos dados da ficha.

4. Marque os encontros em lugares públicos.

5. Esteja atenta aos seus objetos pessoais: telefone, cartões de crédito, dinheiro, passaporte e cartão de identidade.

6. Faça sexo seguro.

1. Sempre que se encontrar, pessoalmente, com um homem, peça a alguém da sua confiança que a interrompa com um telefonema.

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2. Nunca confie nas fotografias que ilustram o perfil da galeria: estão sempre desatualizadas.

3. Se o perfil do candidato não tem fotografia, não confie nos dados da ficha.

4. Marque os encontros em lugares públicos.

5. Esteja atenta aos seus objetos pessoais: telefone, cartões de crédito, dinheiro, passaporte e cartão de identidade.

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Sandra, apesar de ser um bom exemplo de uma relação amorosa conseguida através da web, é uma exceção e não a regra neste universo, às vezes promíscuo, sempre volátil, vazio, dos encontros alimentados na Internet. “Consegui uma relação séria, sólida, construtiva, através dos sites de encontros amorosos. Mas são poucos os casos com sucesso. Fui persistente. É verdade que dormi com muitos homens, alimentei sexo virtual com alguns deles, vivi na dependência deste instrumento durante muitos meses. Não tinha nada a perder. Não aguentava a solidão e a Internet é um domínio eficaz para sublimar a tristeza e o sofrimento”, contou-nos Sandra G., professora da Universidade de Lisboa.

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