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Noivas em fuga

Aberta a "época dos casamentos", a Máxima foi ouvir quatro mulheres que fugiram do altar. Apesar do investimento financeiro e da chantagem emocional, tiveram a coragem de ser verdadeiras consigo mesmas. Os especialistas tiram-lhes o chapéu.

18 de junho de 2015 às 06:00 Máxima

A data está marcada, o vestido pendurado na porta do armário, os convites enviados, e a mãe, sobretudo a mãe, rejuvenesceu com o entusiasmo dos preparativos. Não se fala de mais nada há seis meses, nem os noivos parecem discutir outra coisa, e o investimento financeiro na festa obrigou a ir buscar as poupanças guardadas para um dia especial. Escolheram o fotógrafo, encomendaram também o vídeo e, com muita sorte, conseguiram que a banda que tocou no casamento de uma amiga aceitasse animar o "copo-de-água". Tudo somado já vai em mais de dez mil euros, a dividir pelas duas famílias, cada uma com cem convidados.

Mas subitamente, pelo menos parece repentino, a noiva começa a hesitar. Tem dúvidas. Falta-lhe o ar quando pensa que é com aquele homem que vai ficar para sempre. Dá por si a acalmar-se, lembrando que afinal se a vida a dois não correr bem pode sempre divorciar-se. Por vezes há quem lhe diga isso mesmo, mais terrível ainda, os próprios pais. As amigas, a irmã ou a mãe percebem o seu nervosismo, mas dizem-lhe que é normal. Todas as noivas se sentem assim. Depois passa, garantem-lhe. Basta meterem-se no avião para a lua-de-mel e tudo volta ao normal. E, de qualquer maneira, quem é que quer perder a oportunidade de quinze dias nas Maldivas?

Mas com a aproximação da data, as palavras "Até que a morte nos separe" parecem uma condenação. Subitamente é impossível continuar, mas onde encontrar coragem para pôr um ponto final a uma história que já tem tantos capítulos? Com que cara vão magoar o outro, de quem gostam tanto, mesmo que agora duvidem se o amam, já para não falar na desilusão causada às famílias, no arruinar das finanças para nada? As olheiras tornam-se mais fundas, as noites sem dormir repetem-se. E se afinal é uma coisa passageira, vão deitar todo o seu futuro ao lixo, arruinar a possibilidade de serem felizes? E se ficam sozinhas?

Os psicoterapeutas com que a Máxima falou dizem que é considerável o número de homens e mulheres que querem desistir, mas não têm coragem de o fazer. Muito maior do que imaginamos. Contam histórias tristes de noivos a quem os pais  esbofetearam quando lhes anunciaram a intenção de desistir, de noivas a quem a mãe disse: "Casas! Depois se te quiseres divorciar, divorcias, mas não me vais fazer passar por uma vergonha destas." Dizem ainda que há quem recorra às consultas em desespero, porque o noivo passou a noite de núpcias a mandar sms a uma  rapariga por quem se apaixonou meses antes do casamento. Mas, garantem, a fatura paga-se cedo, e raramente os casamentos duram, com o remorso de se poder ter evitado arruinar a vida de uma outra pessoa.

Outros, sobretudo aqueles que sentem que, apesar do choque inicial, vão poder contar com o apoio dos pais, encontram a coragem, sabe-se lá onde, para romper com o  compromisso, mesmo que em cima da hora. As semanas e meses que se seguem são complicados, em que sobretudo a noiva que decidiu "fugir do altar" é, muitas vezes, denegrida e insultada, descobrindo com amargura que tem menos amigos do que pensava, mas habitualmente o noivo abandonado acaba por lhe agradecer.

> DÊ ATENÇÃO AO QUE DIZ O SEU CORPO: constipações repetidas, dores de cabeça que não passam, alergias que não a largam? Quando estamos sob um stress agudo, o sistema  imunitário vai abaixo, e apanha-se tudo.

Mas mais do que os especialistas, o que nos importava era ouvir os testemunhos de quem passou por isso. Leia as histórias de Rita, Inês, Carla e Susana (nomes fictícios) que aceitaram relatar à Máxima como tudo aconteceu. E, se está noiva e vai casar em breve, espreite os sinais de perigo e aqueles que são apenas sinal de cansaço e nervosismo.

"Apaixonei-me por outro, não podia enganar o João"

RITA, NA ALTURA COM 23 ANOS

Como é que era possível que nos últimos meses, com a data do casamento já marcada, e todos os preparativos em curso, me tivesse apaixonado por um colega de trabalho? Repeti a pergunta mil vezes a mim mesma. Não fazia sentido nenhum. Namorava com o João há seis anos, adorava-o, admirava-o, confiávamos um no outro, estava tudo tão certo, que esta paixão só podia ser um ataque de loucura. Confessei o que sentia à minha melhor amiga e ela disse-me que reagia à ideia do compromisso definitivo, que queria era viver um último flirt. Concordei com ela, mas a verdade é que fazia tudo para me cruzar com ele, e quando estávamos juntos percebia que ele tinha tanta vontade como eu de me tocar na mão ou pôr um braço em redor do pescoço.

Um dia, quando ficámos a trabalhar até mais tarde, deixei que me abraçasse e beijasse, e foi tão bom. Senti-me tão eufórica que – não vai acreditar nisto, mas foi mesmo assim – tive vontade de ir a correr contar ao João, partilhar com ele o que me estava a acontecer, como partilhávamos tudo. Tinha perfeita consciência de que perdera a cabeça. Passei a noite a chorar, mas quando perguntava a mim mesma se me arrependia desta traição, a resposta era que não só não me arrependia como queria muito que se repetisse. Quando fechava os olhos, era o meu colega que via ao meu lado na Igreja e não o meu noivo.

Sabia o que era obrigatório fazer, por muito que me custasse. Desci para tomar o pequeno-almoço e disse à minha mãe: "Não posso casar!" Ela, que há um ano não fazia mais nada senão envolver-se nos preparativos, olhou-me como se tivesse visto uma alma assombrada. Gritou-me que estava maluca, que era o que faltava, que agora era tarde demais. Quando berrei de volta, deu-me um estalo: "Estás histérica, isto é tudo nervos." E quando desatei a chorar, tentou abraçar-me, dizendo: "Filha, são nervos, isso passa, e se não passar, divorcias-te depois."

Enojou-me tanto que saí dali direta para falar com o João. Quando me viu chegar num pranto, quando lhe disse que não podia casar com ele, pelo menos naquele momento, porque sentia que não o amava o suficiente, não estava ainda preparada para um compromisso para a vida, ainda me consolou.  De facto, era a melhor das pessoas, e a nossa relação era sobretudo a de uma amizade profunda. Mas não era amor.

Não vale a pena falar das semanas que se seguiram, os "desconvites" que tivemos de fazer a mais de 200 pessoas, o cansaço de explicar vez após vez que sim, desistira. As reações das pessoas são as mais extraordinárias. Umas, impecáveis, elogiam-nos a coragem, mas há outras que só querem coscuvilhar, escarafunchar na ferida. A minha mãe, depois daquela reação assustadora, pediu-me as maiores desculpas, estava tão envergonhada, não sabia como tinha sido capaz de dizer aquilo. Tornou-se a minha maior defensora e tratou de tudo sem se queixar, e sei quanto aquilo tudo lhe custou.

Não falei a ninguém no meu colega, não queria magoar mais o João, mas um ano depois começámos  oficialmente a andar juntos. Estamos casados há cinco.

"Olhei para o vestido e tive um ataque de pânico. Nas Urgências, um médico ajudou-me a pensar"

INÊS, NA ALTURA COM 26 ANOS

Não morávamos juntos, mas fazíamos tudo a dois. Andávamos na mesma faculdade e víamo-nos todos os dias, viajávamos juntos, tínhamos os mesmos amigos e, claro, dormíamos juntos sempre que podíamos. Depois ele começou a trabalhar, e eu continuei a estudar, estávamos menos tempo e quando estávamos tudo era mais morno. Falámos muito sobre isso e concluímos que era sinal de que estávamos cansados de namorar e que agora era tempo de casar. Quando ele se ajoelhou e me estendeu um anel, achei que íamos começar uma nova etapa. Que era mais do que natural que com o tempo não visse fogo-de-artifício de cada vez que fazíamos amor, que o importante era a relação que tínhamos construído, os mesmos gostos, os mesmos amigos. Perfeito. Só que quando decidimos a data, comecei a ter pesadelos. Quando dormíamos juntos, virava-me para o lado e fingia estar ferrada. Finalmente, quando quinze dias antes fui com a minha mãe à última prova do vestido, senti o coração a acelerar a mil à hora, um nó no estômago e dificuldade em respirar. Levaram-me à Urgência do hospital, e depois de exames disseram-me que estava a ter um "ataque de pânico". O médico perguntou-me se havia alguma coisa que me estivesse a preocupar. Abri a boca para dizer um "Está tudo ótimo", mas em vez disso saiu "Sim, o meu casamento".

Reagiu com calma, explicando-me como o corpo é inteligente, como nos faz parar para pensar. Disse-me que devia ouvir o que procurava ouvir e agir em conformidade, porque fugir não era solução. Não sei o nome dele, mas fiquei-lhe eternamente grata. No dia seguinte disse ao Nuno que não me sentia preparada para casar. Cancelámos tudo, e os meus pais foram os primeiros a dizer que se hesitava o melhor era nem pensar nisso. O alívio foi tão grande que tive a certeza que fiz bem. Ainda hoje, passados dois anos, tenho imensa pena de ter magoado uma pessoa tão fantástica, mas teria sido muito pior se tivesse percebido que não o amava depois de ter jurado ficar com ele até que a morte nos separasse. Hoje, ainda estou à procura da pessoa certa, mas ele já casou e não me fez impressão nenhuma ir ao casamento, o que é mais do que sinal de que tomei a decisão certa.

"Desconfiei que ele estava apaixonado pela minha melhor amiga. Negou, mas cancelei tudo e depois..."

CARLA, NA ALTURA COM 30 ANOS

Não quero falar muito do assunto. Marcou-me. Mas todos os dias agradeço a Deus ter percebido a tempo. A história explica-se depressa.E talvez parte da culpa seja minha. Estava loucamente apaixonada pelo meu namorado, mas a certa altura senti que o amor dele por mim tinha arrefecido. Fiquei nervosa, com medo de que se tivesse desinteressado, que quisesse acabar. A partir daí comecei a falar de casamento a toda a hora e, quando ele disse que sim, aparentemente ficou tão contente como eu. Começámos os preparativos e a minha melhor amiga ia connosco tratar de tudo. O que aconteceu a seguir é tão literatura de cordel que até me custa contar. Dei por mim a sentir que era para ela que ele olhava, que era a falta dela que sentia, que sempre que eu falava em irmos jantar fora ou ao cinema só os dois, ele sugeria que ela também fosse. Perguntei-lhe de caras se estava a apaixonar-se por ela, e disse sempre que não, fez troça de mim, chamou-me ciumenta, paranoica, zangamo-nos mesmo a sério uma data de vezes.

Sou muito católica e para mim o casamento é para sempre. Quando fizemos um curso de preparação para o matrimónio, reparei que ele parecia hesitar em muitas das perguntas que lhe eram feitas, que quando nos pediam para imaginarmos o futuro juntos, para falarmos de quantos filhos queríamos ter, ele, habitualmente conversador e seguro, ficava calado e com os olhos postos no chão.

Mas dizia sempre que queria casar. E que queria casar comigo. A três dias do casamento, vi-o a olhar para a minha amiga, e a minha amiga para ele, com aquele olhar que não sei descrever. E soube.

Perguntei-lhes logo ali, de caras, se tinham alguma coisa para me dizer, mas a minha amiga acusou-me de estar completamente doida, e ele ofendeu-se, disse que se não confiava nele, o melhor mesmo era acabarmos tudo. Foi o que fiz. Passei por louca e caprichosa, os meus pais quiseram que fizesse uma psicoterapia, convencidos de que os meus ciúmes eram doentios e me iriam estragar a vida. Ainda bem que fiz a psicoterapia, ajudou-me muito, sobretudo quando tive de enfrentar a notícia de que ela, a minha melhor amiga, e ele, o meu ex-noivo, iam casar.

(Lembre-se que a ideia não é formar uma empresa de organização de eventos)

> NÃO INFLACIONE A FESTA DO CASAMENTO. É um dia importante, mas é só um dia. Em que pode acordar com uma dor de cabeça gigante ou o seu noivo a vomitar.

> PENSE NO QUE PODIA FAZER COM TODO O DINHEIRO QUE VAI GASTAR NESTA FESTA, em férias e programas para os dois. Invista mais em si e nele do que nas aparências.

> NÃO SE DEIXE MANIPULAR POR MÃES E SOGRAS. Se querem brincar aos casamentos, que casem elas outra vez! As tricas entre famílias podem tornar-se violentas, sobretudo se o casamento vai ser pago a meias. A certa altura está a discutir com o seu noivo sobre assuntos que não têm nada a ver convosco.

> POR FAVOR, NÃO REDUZA A CONVERSA COM O SEU NOIVO a um ano de discussões sobre toalhas de mesa, a cor das velas ou das flores. Continuem a namorar, a fazer programas a dois e com amigos.

> NÃO SE ESQUEÇA DE QUE NÃO ESTÁ A FORMAR UMA EMPRESA de organização de eventos, mas a casar com alguém que ama.

> DURMA MUITO E BEM. A falta de sono leva-nos a ver tudo mais negro, a chorar por dá cá aquela palha, a dramatizar as coisas.

"Depois do divórcio da minha irmã, tive medo que me viesse a acontecer o mesmo"

SUSANA, NA ALTURA COM 21 ANOS

A minha irmã mais velha divorciou-se exatamente quando eu estava a planear o meu casamento, com data já marcada. O marido disse-lhe que tinha encontrado outra pessoa, e que queria separar-se, e ficámos todos em estado de choque. Os meus dois sobrinhos, que tinham oito e seis anos na altura, ficaram lá em casa durante umas semanas para a minha irmã tratar da mudança de casa e adormeciam todas as noites agarrados a mim e muitas vezes a chorar.

O António, o meu noivo, foi sempre impecável, levava os miúdos a passear e dizia-me que não me preocupasse, porque nunca nos ia acontecer o mesmo. Mas eu estava em pânico. Porque é que não nos havia de acontecer o mesmo? O meu cunhado era uma pessoa impecável, gostava imenso dele, não percebia como se transformara neste homem capaz de trocar a minha irmã por outra e abandonar os filhos. Era muito miúda na altura e via tudo a preto e branco, a traição era uma coisa que não entendia, que achava que nunca acontecia entre gente séria, hoje sei que há circunstâncias de vida complicadas em que pode acontecer, mas isso agora não vem à história.

A semente da dúvida estava instalada. Tinha insistido em casar, os meus pais diziam que era muito nova e devia esperar mais uns anos, e agora, de repente, parecia-me que tinham razão. Preferia ficar solteira a passar por aquilo que a minha irmã estava a passar. Era melhor não casar.

O pior é que não pensava sempre a mesma coisa. Durante a noite era pessimista e trágica, mas quando estava com o António, voltava a sentir-me animada. E perguntava-me: o que é que a história da minha irmã tinha a ver com a minha? Para logo depois começar a analisar o António ao detalhe. Era demasiado infantil, atirava para os meus ombros todas as responsabilidades, usava o humor para se esquivar ao confronto, era esperto, mas não tinha ambição. Os defeitos pareciam agora intoleráveis. Sentia-me a perder a paciência com ele por tudo e por nada e a desculpar-me com o cansaço que todos os preparativos me causavam. Ele encolhia os ombros e aguentava tudo, o que também me irritava.

A minha mãe percebia as minhas hesitações e, suavemente, dizia-me que por muito complicado que fosse desmarcar tudo, não queria que me casasse sem ter a certeza. Que podia adiar.

Na véspera do casamento, senti uma dor de estômago brutal, rebolava-me no chão agarrada à barriga, julgaram que tinha apendicite. Levaram-me de urgência para o hospital, e enquanto me faziam análises e me punham a soro, percebi perfeitamente porque é que estava ali, naquele corredor, a olhar aquelas paredes brancas como as de uma prisão. A analogia não era por acaso. Casar tornara-se para mim o equivalente a entrar voluntariamente para uma cela. Com um fato às risquinhas e um número nas costas.

Não fui tão frontal como desejaria. Falei com a minha mãe e a minha mãe alegou a minha súbita doença como pretexto para adiar o casamento, para data a agendar. O António ficou terrivelmente magoado, mas disse que esperava. Que ainda me havia de convencer a casar com ele. Casámos três anos depois. E somos muito felizes.

Para mais ideias sobre casamentos, veja aqui.

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